A faixa-título do primeiro disco autoral de Camilla Inês, diva brasileira do jazz, redefine a expressão “uma gota no oceano”, relacionada à insignificância humana diante do todo. Ao invés disso, se apresenta como Gotas de oceano, posicionando cada pessoa como parte de algo maior ou mais profundo. Ao lado do produtor Swami Jr., a artista oferece uma proposta multicultural e de linguagem ecumênica, por meio das sete canções luso-brasileiras que compõem o novo álbum. Gotas de oceano está disponível nas plataformas digitais.
Com diversas reflexões musicadas, o EP também mergulha na profundidade de cada um na relação com o mundo. Segundo a cantora, o objetivo é relembrar o valor da resiliência, do respeito às diferenças, e da liberdade de ser. “O que sou não me define, o que eu penso nem consigo explicar, quem são eles para me ferir, quem são eles para me julgar?”, cita. Os versos fazem parte de Contra-o-ponto, canção de abertura do disco, que traz descontração na melodia, mas carrega um cunho de protesto na letra, assim como em Tudo é fugaz.
Tão brasileiro quanto português, o projeto de estreia na música autoral nasceu com dupla nacionalidade. “Desde sempre a intenção foi chegar a um trabalho inédito. Mas, em 2019, decidi morar em Portugal para trabalhar e estudar música. Eu havia sido intérprete, letrista e quando comecei a fazer aulas no conservatório Orfeão de Leiria, me senti mais madura para realizar o processo de composição. Foi quando fiz as faixas Leiria — que homenageia a cidade portuguesa homônima e fecha o trabalho — Morena, Contra-o-ponto e outras que acabaram não entrando neste disco”, explica.
Em janeiro de 2020, retornou ao Brasil para visitar a família e, pouco tempo depois, veio a pandemia. “Não pude voltar, mesmo sendo residente de Portugal. O mundo mudou de repente, todos precisaram se reformular. Resolvi dar continuidade ao processo das composições, parte em solo português e parte em solo brasileiro”, explica Camilla, que também conta que o outro passo, dado em setembro do mesmo ano, foi fazer o convite a Swami Jr. para produzir e arranjar as composições. Ela chegou ao produtor, que ganhou um Grammy Latino em 2009, por intermédio de um amigo em comum.
“O trabalho ocorreu no formato remoto. Enquanto ele desenvolvia os arranjos, eu compunha novas canções. E fui totalmente influenciada pelo momento que estávamos vivendo. Em Vã filosofia, eu tinha um feito um desabafo on-line: ‘Que vã filosofia, que ironia, te querer e não te ter’. É que eu estava a sete quilômetros de distância da minha mãe, moro na 706 Norte e ela na 107 Sul, e eu não podia vê-la. Soube que essa necessidade, de estar perto do outro, não era só minha... E então decidi pegar o violão para compor em cima dos versos que tinha escrito”, explica a compositora pernambucana, radicada em Brasília. Por incentivo de Swami, ela diz ter incorporado outras linhas à canção, o que culminou em um dueto com o próprio arranjador.
Ritmo
As outras parcerias do projeto aparecem nas canções Sereia e Morena. A primeira, resgata elementos das origens pernambucanas de Camilla Inês, por meio do ritmo do coco, apresentado pelo grupo Samba de Coco Raízes de Arcoverde (PE). Já a última, é um autorretrato da artista, como mulher e como brasileira, embalado pela sanfona do músico sergipano Mestrinho do Acordeon.
“Assim, o disco comunga com tudo que existe do ser humano e do planeta. Traz arquétipos e fala dos amores que são comuns a todos nós, desse país continental. Do yin ao yang. Nós nos preocupamos em fazer um disco que pudesse ser ouvido em qualquer lugar do mundo, sem barreiras”, finaliza a cantora, conhecida por trabalhos como Jazzmine (2011), The rhythm of samba (2015) e Vamos dançar um bolero (2017).
Gotas de oceano — EP de Camilla Inês. Já disponível nas plataformas digitais e no canal oficial do YouTube. Sete faixas autorais. Distribuição Tratore. Arranjos e produção de Swami Jr. Livre.
*Estagiária sob a supervisão de José Carlos Vieira
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