CINEMA

Estreia ‘Bela vingança’, vencedor do Oscar de melhor roteiro

Longa dirigido por Emerald Fennell tem roteiro elaborado e Carey Mulligan em papel de uma mulher impetuosa e impactante

» Ricardo Daehn
postado em 13/05/2021 06:00
Carey Mulligan interpreta Cassie em 'Bela vigança' -  (crédito: Divulgação)
Carey Mulligan interpreta Cassie em 'Bela vigança' - (crédito: Divulgação)

A diretora inglesa Emerald Fennell se projetou em Hollywood com o talento e a capacidade criativa revelada em Bela vingança. Sagaz e com uma discrição admirável, Emerald é quem assina um roteiro (considerado pelos votantes da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas o melhor do ano) repleto de viradas, nada forçadas, e de guinadas que surpreendem os espectadores.

Tudo é sólido em Bela vingança e não aponta sensacionalismo ou mesmo estandarte panfletário. O enredo trata de Cassandra, ou simplesmente Cassie (papel da fabulosa Carey Mulligan), que, num mundo colorido por cores amenas (há dominantes azul-bebê, cor-de-rosa e tons claros, amarelados), vive o inferno interior e, por revolta, age numa rede de vinganças. Sem amizades, Cassie beira os 30 anos, e nutre a disfuncional perpetuação da aparência de que seja uma mocinha, morando com os pais e frequentando clubes noturnos.

Culpa atribuída por cafajestes, a noção bizarra de que mulheres “se fazem vulneráveis” e o impacto da opressão são elementos latentes em Bela vingança. Também britânica, Carey Mulligan assume o posto de mulher estagnada por um crime. Vale lembrar que, por pouco, Carey não levou o Oscar de melhor atriz (uma vez que, progressivamente, abafou a candidatura de Viola Davis, mas foi superada por Frances McDormand).

Criteriosa, a atriz é lembrada por Mudbound — Lágrimas sobre o Mississipi, uma denúncia de racismo; Educação, um tratado sobre a sociedade machista; Shame, com trama que versa sobre um homem com descontrole sexual, e As sufragistas, em torno da emancipação feminina.

Noitada sem fim

Não é raro que Cassie protagonize, ao raiar do dia, com as roupas desalinhadas e uma postura desconjuntada, o que um grupo de peões de obra (em cena) chamem de a “caminhada da vergonha”. Bebidas batizadas, inquisição sobre a dignidade das mulheres presentes em boates e canalhices de caras que, vendo mulheres desacordadas (por efeito de bebida), comungam, no ambiente noturno, que elas não fazem mais do que “estar pedindo (…)” são as circunstâncias do dia a dia de Cassie.

Ao lado de Nina, uma amiga do peito, o passado de promissora jovem estudante de medicina é silenciado por Cassie, agora uma atendente de cafeteria que não se furta de cuspir no café de clientes. Pouco a pouco, cabe a Cassie se assumir “um pedaço de mau caminho”, no sentido mais amplo, revidando safadezas grotescas que a atingem. Como o desnorteado personagem central de Brown bunny (polêmico longa com Vincent Gallo), Cassie tem na memória a lida com um abuso coletivo, e contra agressões.

Com uma decisiva sinfonia de celulares, no roteiro de final faiscante em Bela vingança, um achado de Emerald Fennell é a irônica escolha de uma composição melosa do musical O rei e eu (1956) chamada Something wonderful (interpretada, no passado, por divas como Carly Simon). Criada por Richard Rodgers e Oscar Hammerstein, a música fala de mulheres impacientes e chateadas com comportamentos estritamente masculinos.

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