Literatura

'Redes sociais não podem ser usadas para definir o que somos', diz escritora Emma Unsworth

A romancista e roteirista britânica Emma Jane Unsworth escancara a relação da sociedade com as redes sociais no livro 'Adultos', o primeiro dela publicado no Brasil

Com um filtro cômico e divertido, o mais novo livro da romancista e roteirista britânica Emma Jane Unsworth escancara a relação da sociedade com as redes sociais. Adultos, o primeiro da escritora publicado no Brasil pela editora Intrínseca, aborda a ansiedade digital de uma jovem de 30 anos, Jenny McLaine, e provoca nos leitores uma reflexão sobre a própria dependência do universo digital.

Diante da casa dos 30 anos e das ansiedades da maternidade e da própria mídia social, Emma decidiu traduzir esse universo criando Jenny. "Queria escrever um livro que mostrasse o colapso de uma mulher acontecendo na página da publicação e por meio do seu telefone. Também é uma comédia digital de boas maneiras, se quiser definir assim", afirmou a autora, em entrevista ao Correio.

Toda a narrativa é construída em primeira pessoa por meio de mensagens, e-mails, diálogos de scripts, interações em redes sociais e relatos íntimos que, muitas vezes, colocam o leitor no lugar de Jenny. Bombardeada por um turbilhão de fotos e vídeos de vidas perfeitas que passeiam pela timeline das redes, Jenny busca por uma maturidade em meio às constantes pressões sociais e digitais a que as mulheres são submetidas. Entre preocupações com likes, hashtags, legendas e postagens, a personagem mostra o abismo que muitas vezes existe entre o que está exposto nas redes e a vida real.

Além de ser quase que um protagonista da narrativa, a vida virtual também conduz Jenny por reflexões sobre profissão, relacionamento, vida familiar e autoconhecimento. A personagem traz ao leitor problemas reais e comuns, mas amplificados pela lente do celular e pela constante comparação com o universo das redes sociais. 

Mesmo com uma carreira bem-sucedida, casa própria e um namorado famoso, Jenny não é feliz. Quando os fracassos na internet se acumulam, seu relacionamento aparentemente perfeito chega ao fim e suas amizades são colocadas à prova, ela é obrigada a rever os conceitos. Nesse verdadeiro caos existencial, sua mãe, Carmen, decide intervir. A jovem, então, precisa reaprender a morar com ela, além de sobreviver a uma luta com a constante necessidade de aprovação em um mundo dominado pelo personal branding.

Confira a entrevista coma escritora Emma Jane Unsworth:

Como é publicar um livro pela primeira vez no Brasil?

É muito emocionante! Nunca estive no Brasil, mas adoraria ir um dia. Já recebi muitas mensagens adoráveis de leitores brasileiros nas redes sociais, o que tem sido muito legal. Estou tão feliz que as pessoas no Brasil estão gostando do livro.

Como você descreveria Jenny?

Um idiota total. Posso dizer isso? Ela é a que menos gosto de todos os personagens que já criei. Mas também sinto pena dela. Ela tem seus encantos, embora sejam poucos e raros. Ela é uma mulher traumatizada, embora não admita. Ela é obsessiva, perdida, apavorada e orgulhosa.

Quanto você e todos nós temos de Jenny?

Eu acho que muito em certos momentos de nossas vidas. Momentos em que estamos vulneráveis, após uma separação ou quando a vida nos choca. Ela se sente traída por seu corpo. Ela perdeu seu ponto de conexão mais importante com o mundo real. Acho que todos nos sentimos assim às vezes.

Você acredita que ela desenvolveu uma relação abusiva com o celular?

Sim, com certeza, mas acho que todos somos suscetíveis a isso hoje em dia se não tivermos cuidado. É a forma menos analisada de vício real. É um problema real. Seus problemas essenciais não são novidade: eles dizem respeito a ser amada e a sentir que sua vida tem um propósito, problemas antigos que ultrapassam os limites do telefone celular. É a condição humana! Mas, para Jenny, esses problemas são amplificados pelo prisma da 'autotransmissão' constante e da rolagem compulsiva de 24 horas, convidando à comparação entre ela e os outros. Pelo menos antes da internet você tinha que esperar até sair para a rua para que alguém gritasse com você. Agora, eles fazem isso quando você está em sua própria casa. Tudo o que você precisa fazer é entrar na Internet e ter uma opinião sobre algo.

Para quem você escreveu Adultos?

Para quem se sente perdido na casa dos trinta, ou on-line, ou ambos.

“Se você posta algo nas redes sociais e ninguém gosta, você existe?”. O que você acha dessa forma de pensar?

Eu acho que, às vezes, parece assustadoramente verdadeiro. Escrevi como uma piada, mas também estou falando muito sério. Acho que as redes sociais podem se tornar um lugar muito tóxico às vezes, especialmente para as mulheres.

Como é sua relação com as redes sociais?

Hahaha! Não é saudável. Eu fico obsessiva. Eu tenho que manter um controle sobre isso. Eu não me permito ir pra lá depois do vinho. A rede social é melhor quando usada da mesma forma que as pessoas no século 18 usavam os leques. Como pequenos floreios - pequenos gestos sociais casuais. Não como uma forma de definir tudo o que somos e tudo que um dia seremos - em palavras mínimas.

Que tipo de mensagem você deseja transmitir com o livro?

Espero que faça as pessoas rirem e se sentirem menos solitárias. Espero que, se elas alguma vez surtaram nas redes sociais, saibam que não estão sozinhas.

Editora Intrínseca/Divulgação - Capa do livro 'Adultos'

Serviço:

Adultos. De Emma Jane Unsworth com tradução de Ana Rodrigues. Editora Intrínseca. 400 páginas. R$ 59,9 (impresso) e R$ 39,9 (e-book)