O ano de 2020 começou trazendo um gênero novo para o radar dos brasileiros. Popular no Nordeste, o piseiro ou pisadinha, vertente do forró caracterizada pela união do teclado eletrônico com a voz, rompeu as barreiras e apareceu no verão passado para todo o país, ganhando mais força ao longo do ano, quando artistas de outros ritmos incorporaram a batida. Foi o que fez o sertanejo Felipe Araújo que, na reta final de 2020, lançou Você não vale nada, com Japinha Conde, cantora revelação da pisadinha com Romance desapegado, que teve 30 milhões de visualizações no YouTube em um mês e, depois, foi regravada por Márcia Fellipe & Ellen Nery.
“Gosto de vários estilos musicais, de poder surfar essas ondas. Não é nada de aproveitamento. É questão de poder fazer essa mistura cultural. Acho que enriquece, só traz coisas boas para a música brasileira”,diz Felipe. Para ele, a pisadinha tornou-se uma febre nacional por ser um ritmo eletrizante. “É um estilo muito bacana. A música que eu mais ouvi em 2020 foi uma pisadinha: Recairei, dos Barões da Pisadinha”, comenta.
Essa presença da pisadinha nas parcerias com artistas de outros ritmos musicais fez com que o estilo permanecesse em alta, mesmo em meio à pandemia da covid-19, quando poderia ter esfriado, principalmente, porque os shows e as festas, onde o gênero tem mais força, foram cancelados. Mas os grandes responsáveis por impulsionar o estilo foram Rodrigo e Felipe, integrantes do duo Os Barões da Pisadinha. Eles fizeram a cabeça do público com o hit Recairei, música que mistura superação e sofrência num refrão chiclete “eu já te superei, certeza eu superei/ mas não manda mensagem outra vez/ senão recairei”. O sucesso da faixa fez com que o grupo figurasse em todas as listas de artistas mais ouvidos de 2020 divulgadas pelas plataformas digitais Spotify (6ª posição), YouTube e Deezer (em ambos, no 3º lugar).
Sertanejo no topo
Como de costume, o sertanejo arranjou um jeito de continuar protagonista em 2020. Mais uma vez, graças ao poder de inovação. Foram os artistas da música caipira/urbana que encabeçaram o movimento de lives de grande porte no Brasil. Tudo começou com Gusttavo Lima, passou por Jorge & Mateus e Marília Mendonça até se alastrar entre artistas de outras vertentes, chegando a MPB, com as lives de Caetano Veloso e Gal Costa.
A rainha da sofrência, Marília Mendonça, viveu um dos melhores anos da carreira. Ela apareceu no primeiro lugar de artista mais ouvida das três principais plataformas digitais do Brasil, além disso, é dela o recorde de live mais assistida do mundo, com 3,2 milhões de espectadores ao vivo. “No início da quarentena, todos foram pegos de surpresa e as lives surgiram como a única alternativa de levar um pouco de respiro e ajudar quem mais precisava. Vi a live do Gusttavo (Lima) e aderi na hora a esse momento. Foi lindo ver o que a música fez pelo próximo. Nos meus projetos de carreira, fomos nos adaptando, mas sempre ouvindo muito o meu público e criando algo para ele. Foi assim com o clipe de Vira homem, por exemplo, todo gravado em casa com o celular”, afirma a cantora destacando que foi uma das primeiras também a filmar clipes de forma remota.
Reaparecimento
As apresentações em live na internet ajudaram um ritmo que aparece ciclicamente no topo dos mais ouvidos do Brasil: o pagode. No início do período de isolamento social, os shows virtuais dos artistas desse estilo musical superaram o funk e o pop, gêneros normalmente mais ouvidos nas plataformas digitais. Alguns pontos estão a favor dos pagodeiros, como a nostalgia e a oportunidade de mostrar novos trabalhos.
O segundo ponto foi o que aconteceu com a banda brasiliense Di Propósito, que, como o grupo candango Menos É Mais, viu a carreira deslanchar Brasil afora em 2020, muito em função do trabalho no âmbito digital. Nas lives dos dois grupos, muitas visualizações e participações de grandes nomes. "Tem sido um período de bastante aprendizado. A pandemia assustou todo mundo. Mas nós tivemos um resultado bastante positivo, por conta do trabalho digital, pelo fato de as pessoas estarem em casa e consumindo internet", avalia Kaique, vocalista do Di Propósito. Além disso, os pagodeiros do Menos é Mais aparecem em segundo lugar no ranking das músicas mais tocadas do YouTube Brasil, com o pot-pourri Melhor eu ir/Ligando os fatos/Sonho de amor/Deixa eu te querer, atrás de Liberdade provisória, de Henrique e Juliano.
Pode não ter sido a onda de lives que colocou o rap no holofote do cenário musical brasileiro, mas, sem dúvidas, foi a internet. Em 2020, o estilo musical, com suas inovações, teve grande destaque entre o público. O jovem cearense Matuê tornou-se o artista brasileiro com mais audições nas plataformas digitais em um mês, chegando a 150 milhões com o lançamento do primeiro álbum da carreira, Máquina do tempo. No mesmo caminho, está o cantor Xamã, que apareceu entre os 10 rappers mais ouvidos do Brasil. Em dezembro, ele lançou o álbum Zodíaco, repleto de participações especiais, como Marília Mendonça, Luísa Sonza e Gloria Groove. Ele diz não saber explicar o sucesso em 2020, mas arrisca um motivo: “Acho que as pessoas estavam mais em casa e passaram a prestar mais atenção nas minhas letras e músicas. Agradeço muito por isso. Mas não dá para comemorar num ano de tantos problemas”.
Djonga também fez história ao levar o rap nacional em direção ao reconhecimento no exterior. O mineiro se consagrou como o primeiro brasileiro indicado ao prêmio BET Hip Hop Awards, uma das maiores premiações do gênero musical. A conquista veio após o sucesso do disco Histórias da minha área, lançado em março deste ano.
Pop consolidado
Ano após ano, o pop brasileiro segue consolidado e tem um lugar cativo nas playlists dos brasileiros. Anitta, Ludmilla, Pabllo Vittar e Gloria Groove reverberam a potência do gênero há algum tempo, mas 2020 abriu espaço para outros nomes. O gênero foi o quinto estilo mais ouvido no Spotify, o feito vai ao encontro de outro marco: Luísa Sonza é a segunda cantora nacional mais ouvida da plataforma — atrás apenas de Anitta.
Três lançamentos que se tornaram, rapidamente, os maiores sucessos da carreira da cantora: BRABA, Toma e Flores. Este mês, as veteranas Vittar e Anitta se uniram a Sonza em Modo turbo. A faixa é o maior lançamento das plataformas de streaming do país. “Mesmo com as adversidades por conta da pandemia, foi possível lançar muitos trabalhos que me levaram ao topo das plataformas de streaming. Eu me adaptei e não parei um segundo de trabalhar, mesmo que de casa. Foram muitos marcos incríveis e grandes sucessos lançados, me sinto muito feliz e grata por todo apoio recebido”, comemora Luísa Sonza.
Efeito TikTok
O brega-funk se popularizou em 2019 e continuou entre as tendências deste ano. É o caso do hit do carnaval Tudo ok, de Thiaguinho MT, JS O Mão de Ouro e Mila, que ocupou ranking Viral 50, do Spotify, o qual mostra as 50 músicas que estão em alta. O TikTok virou febre na quarentena e revelou outros sucessos, como Tudo no sigilo, de MC Bianca e Vytinho NG. Impossibilitados de fazer sucesso nas festas, o single tocou na casa de muita gente — já são quase 80 milhões de visualizações no vídeo da música.
“2020, sem dúvida, foi um divisor de águas na minha carreira”, revela MC Bianca. “Quando a gente lança uma música, sempre espera que vá dar certo, mas nunca imaginei que pudesse chegar a esse ponto de tocar no Brasil todo, de ter famosos cantando, dançando. Não imaginava mesmo, porque é difícil isso acontecer”, completa.
O funkeiro Niack também se destacou com a canção Na raba toma tapão, uma das mais tocadas no primeiro semestre. Em seguida, o cantor emplacou Oh Juliana, que o transformou no primeiro brasileiro nas listas da Billboard. Ele alcançou o 132º lugar na Global 200 e é o artista que ficou mais tempo no topo do streaming no Brasil em 2020 — 95 dias. As faixas do jovem de 18 anos superam Henrique e Juliano (79 dias) e as estrelas do momento no forró Os Barões da Pisadinha (65 dias).
*Estagiária sob a supervisão de José Carlos Vieira
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