A essência roqueira de Herbert Vianna

Cantor e compositor grava disco solo com faixas que fizeram parte da formação musical dele

Líder e principal compositor do Paralamas do Sucesso e nome exponencial do pop rock brasileiro, Herbert Vianna, desde a década passada, tem investido paralelamente em trabalhos solo. O primeiro foi Ê batumaré, de 1992. Depois vieram Santorini blues (1997); O som do sim (2000), com a participação de cantoras que antes haviam gravado canções dele; e Victória (2012). Agora, o músico paraibano que deu os primeiros passos na música em Brasília chega com o hv sesions vol 1, já disponível nas plataformas digitais.

Embora esse projeto esteja sendo lançado agora, foi gravado há nove anos, em sessões no Estúdio 304, nas quais Herbert esteve ao lado do produtor Chico Neves, que tem parcerias com Arnaldo Antunes, Lenine, O Rappa e Los Hermanos, entre outros. Sobre o quinto disco solo, o cantor diz ter se deixado guiar unicamente pelo prazer de revisitar canções que gostaria de ter feito, responsáveis por despertar nele o desejo de tocar, compor e “existir a partir da música”.

Na escolha das canções ele recorreu à memória de fitas cassete gravadas por seu pai, das primeiras incursões ao violão e do impacto inaugural do rock no período da infância e da adolescência, quando descobriu o poder do casamento entre letra e música. O setlist, com 10 faixas, traz clássicos criados por ícones do gênero que remetem ao período entre as décadas de 1960 e 1980.

Logo na abertura ouve-se Pinball wizzard, do The Who, da ópera Tommy, lançada tendo Elton John como vocalista. Nesta faixa há a participação de Daniel Jobim, neto de Tom Jobim, tocando minimoog. A ela se juntam outras canções consagradas, entre as quais While my guitar gently weeps (George Harrison), Purple haze (Jimi Hendrix), Wichita lineman (Ray Charles), Europa (Carlos Santana), A kind of hush (Carpenters), Sunshine of your love (Cream) e And I love her (Lennon/ McCartney). A capa do álbum tem a assinatura do artista plástico Barão.

Cinco perguntas / Herbert Vianna

Você vem bastante a Brasília com o Paralamas do Sucesso desde o início da carreira. Que lembranças guarda da cidade?
Tenho Brasília como a minha cidade referência. Foi aí que tive as primeiras aulas de violão e onde ganhei a primeira guitarra elétrica.


Em Som do sim, o seu segundo álbum solo, houve a participação de Nana Caymmi, Ivete Sangalo e outras cantoras. Como o principal compositor de uma banda de pop-rock vê suas músicas interpretadas por cantoras da MPB?
Foi um caminho natural. Quando me dei conta, praticamente, só cantoras gravavam músicas minhas.


Como se sente ao lado de Gilberto Gil, Milton Nascimento e Erasmo Carlos no panteão de grandes compositores brasileiros ao receber o Prêmio UBC?
Não preciso nem dizer a honra e orgulho das companhias destes gênios de nossa música. Nunca imaginaria estar neste grupo.


De que forma os nomes que tiveram músicas gravadas no hv sessions vol 1 exerceram influência em sua carreira musical?
São compositores, músicos e bandas fundamentais na minha formação. Por isso estão no disco.


Que avaliação faz da participação de Daniel Jobim no projeto?
A descoberta pelo Chico Neves de uma gravação, feita anteriormente pelo Daniel Jobim e que se encaixava perfeitamente em nossa gravação, foi uma surpresa e uma honra. Um belo sobrenome para estar por perto.

 

 

Crítica / hv sessions vol 1

O baú na fogueira

O recolhimento exigido pela presença do vírus pode provocar apaixonadas discussões leigas ou até entre os tais especialistas — em que, mesmo? — que defendem posições antagônicas. Mas é fato que o ócio obrigatório fez com que criadores dedicassem muito mais tempo a suas invenções e até mesmo revisões, caso de Herbert Vianna, que usou o tempo para brincar de revirar o próprio baú sentimental.

O resultado é hv sessions vol. 1, em que ele reúne 10 canções que misturam várias épocas do rock, a partir dos anos 1960 (e vai dos Beatles aos Herman Hermits) até os 1980, com Tempted, extraída do repertório dos Squeeze; e Opportunity, de Elvis Costello & The Attractions.

Herbert Vianna pode não ser o melhor cantor do mundo, mas oferece uma visão particular das canções que não são — a maioria, pelo menos — grandes sucessos, mas que mexem com a cabeça de muitos jovens de antanho. Pinball wizzard (The Who), Purple haze (Hendrix) e Sunshine for your love (Cream), por exemplo, são canções que Vianna deve ter ouvido fora da época dos lançamentos, assim como muitos roqueiros; mas de alguma forma fazem a base do músico que ele é.

O disco é produzido por Chico Neves, velho de guerra, com experiência de sobra em estúdios, e que parece não tentar interferir demais nas escolhas iniciais de Herbert Vianna, oferecendo apenas um certo conforto e poucas ações diretas que não alteram o espírito cru das gravações, talvez inspirado por Rick Rubin, produtor norte-americano que fez algo parecido nos últimos álbuns de Johnny Cash e posteriormente com Neil Diamond.

Metade das canções são de heróis da guitarra, de Eric Clapton a Santana, o que faz todo sentido no caso de Vianna; e há pelo menos um estranho neste ninho — o country Wichita lineman, original de Glen Campbell, que até Sergio Mendes já gravou — mas que se integra bem ao espírito do disco, que poderia ser gravado em volta de uma fogueira. Que ninguém se iluda: o relaxamento que as gravações provocam não são resultado de um trabalho relaxado.

hv sessions vol 1


Álbum solo de Herbert Vianna, com 10 faixas. Lançamento do selo Estúdio 304 nas plataformas digitais.