O recurso da internet, antes utilizado eventualmente para tirar dúvidas, passou a ser o modelo principal das aulas de música com a pandemia da covid-19. Com o isolamento social e o fechamento de espaços físicos, professores e alunos migraram para plataformas on-line em busca de sequência dos estudos de instrumentos musicais. Entre pontos positivos e negativos, o segmento se reinventa em novos métodos de ensino.
Seja por Zoom, Skype, Google Meet, Whatsapp ou Moodle, software de apoio à aprendizagem, os profissionais da área da música transferiram as aulas para o modelo on-line com auxílio destas plataformas. Zé Castello, saxofonista formado pela Universidade de Brasília (UnB) e professor, comenta sobre o receio inicial, por ser o primeiro contato com os aplicativos utilizados. Entretanto, logo se adaptou à relação da tela e alunos com o saxofone. “Dou aula só pelo iPad, compartilho a tela, escrevo e toco”, conta.
Outro profissional que teve a primeira vivência virtual foi Fabrício Paçoca, professor de guitarra, violão e ukulele. Ele trabalha na unidade de Águas Claras da academia de música Musiflex, e também está com aulas particulares, ministradas diretamente do quarto, em casa. “Aproveito e mostro os quadros das bandas que tenho, os instrumentos, tento deixar o clima mais tranquilo e solto”, compartilha Paçoca, ressaltando que há alunos com quem nunca encontrou pessoalmente.
A mudança ocorreu também para os estudantes, acostumados às aulas presenciais. Thomas Santarém, 24 anos, aluno de canto popular básico na Escola de Música de Brasília (EMB), comenta que algumas disciplinas incluíram práticas de, por exemplo, posturas e performances em vídeo. “O trabalho da internet continua, mesmo depois que a pandemia acabar”, destaca Santarém sobre a importância de olhar para o futuro digital.
Desafios
Mesmo com o avanço tecnológico cada vez mais acentuado no mundo, o meio encontra limitações para algumas áreas. “A música é uma arte que tem muitos elementos abstratos. A questão artística é muito mais complexa que isso, porque envolve partes de performances e emoções”, explica Ana Cláudia Ferreira, professora de piano clássico da EMB e familiarizada com o instrumento desde os 5 anos.
Rafaela Alves, 25 anos, começou a estudar contrabaixo no início do ano, após se apaixonar pelo som dele na canção Carry on wayward son, de 1976, da banda Kansas. “É o instrumento mais bonito, ele é o que dá peso a música”, pontua. Nas dificuldades enfrentadas, chama atenção para detalhes como, por exemplo, postura e posicionamento da mão. Para ela, esses fatores têm mais facilidade de serem trabalhados no modelo presencial e a parte teórica aparenta se adaptar melhor ao digital.
Outro ponto levantado por Rafaela é a necessidade de pegar o instrumento emprestado, já que ainda não teve condições de adquirir o equipamento necessário. “Alguns alunos precisavam, não só do equipamento da escola, mas também do espaço oferecido para prática”, complementa Zé Castello. A depender do instrumento, estudantes tiveram que deixar as aulas, por não ter os requisitos mínimos em casa.
Futuro
Embora o presencial faça falta no modelo on-line, principalmente, a parte de tocarem juntos, alunos e professores, existe um cenário positivo para a continuação das aulas virtuais integrais ou em um modelo que mescle o físico com o digital. Fabrício Paçoca, nesta perspectiva, fala sobre a economia gerada por não ter que se locomover ou ter refeições cotidianas fora de casa. “Todos os modelos de comércio perceberam o quanto é econômico”, acrescenta.
As possibilidades de recursos tecnológicos disponíveis para a inovação da área conseguiram segurar um impacto negativo nas aulas de música. “Quando eu comecei a tocar, não existia essa quantidade de recursos que tem hoje. Se a pandemia fosse em outra época, as escolas de músicas todas seriam fechadas”, afirma Zé Castello. Nesta perspectiva, Ana Claudia Ferreira salienta o trabalho das escolas diante da situação inusitada e o debate sobre acesso aos meios de comunicação. “A internet de qualidade ainda não é garantido para todos e isso está fora do nosso controle”, completa a professora acerca da necessidade de uma boa conexão para um ensino de música à distância.
*Estagiária sob supervisão de Igor Silveira