Sete anos separam a primeira versão de Luz intrusa do monólogo que estreia nesta sexta-feira (18/9) em transmissão on-line. Contudo, a coincidência com o contexto atual de distanciamento e isolamento social faz com que o espetáculo solo de Abaetê Queiroz com texto e direção de Alexandre Ribondi ampliasse as possibilidades de empatia e diálogo com o espectador.
Luz intrusa - As viagens no universo de uma casa conta a história de um homem confinado em um apartamento desarrumado. Circundado entre paredes e portas fechadas, ele recusa a companhia da internet, do celular e das cartas que se acumulam. Acompanhando o pensamento do personagem em voz alta, o público fica sabendo que esse solitário perdeu o emprego e a mulher amada. Ele se debate entre desejos díspares, que vão da alegria ao profundo desencantamento com a vida e com as pessoas. Como se estivesse em um purgatório, o homem revive as alegrias, enfrenta os fetiches, mergulha na memória do pai, acusa o mundo de querer fazê-lo sofrer e, ao fim, se rende diante da necessidade primária e urgente de viver, sejam quais forem os riscos.
"É um cara que não quer mais se emocionar, não quer nunca mais passar por este tipo de sofrimento. Mas é um cara normal, que passou por todas as situações que passamos só que com emoções à flor da pele", descreve Abaetê. Em cena, o público acompanha o personagem no 45º dia de confinamento. De maneira poética, Ribondi traz no texto os estados da alma humana em extremos. Tem ação, suspense, intrigas e segredos de família.
Montada e apresentada pela primeira vez em 2013, Luz intrusa é adaptada sete anos depois com a mesma metáfora textual. Contudo, como avalia Abaetê, a percepção do público é diferente. "O espetáculo ganha uma compreensão muito superior hoje. Quando fiz a peça em 2013, pessoas sensíveis, que curtem teatro e cultura se identificaram. Agora, outros públicos também estão sensibilizados. Esse âmbito da empatia vai fazer com que as pessoas compreendam e se sintam tocadas pela peça". Para o ator, o reconhecimento surge quando tentamos nos defender, de maneiras diferentes, da possibilidade do sofrimento.
On-line
A produção será transmitida pela internet durante quatro sextas-feiras, sempre às 21h, pelo canal do ator no YouTube. Os ensaios foram virtuais e Abaetê conta que as soluções encontradas para reproduzir a cenografia, com diferentes iluminações, foram caseiras. "Minha casa virou um estúdio. Tem um celular em cada cômodo. Faço uma reunião comigo mesmo nesses aplicativos de videoconferência", detalha.
Com 25 anos de carreira completados em agosto, o ator escolheu o monólogo para celebrar a trajetória. Mesmo diante do contexto atual, Abaetê optou por arriscar, por testar, por reinventar e se adaptar. "Tudo depende de como você encara. Tem que ter olhos para ver. Não censuro ninguém, claro. É um momento tão ímpar. Contudo, a minha opção, durante a quarentena, foi ocupar a minha cabeça minimamente. Tenho também momentos de reflexão, para tentar entender o que está acontecendo", comenta. Ao experimentar ser sonoplasta, iluminador, cenógrafo, Abaetê detalha que o olhar foi desenvolvendo e a transformação se deu de maneira prazerosa. "A polivalência é um retrato da cultura teatral brasileira, principalmente quando sai do eixo Rio/São Paulo. Essas mudanças viriam ao longo de alguns anos, só que a gente foi obrigado a fazê-las em dois, três meses. Foi um processo de aceleração".
Serviço:
Luz intrusa - As viagens no universo de uma casa
Com Abaetê Queiroz e texto e direção de Alexandre Ribondi. De 18 de setembro a 9 de outubro, sempre às sextas-feiras, às 21h. No canal do ator no YouTube. Não recomendado para menores de 12 anos.
As transmissões são gratuitas. Os realizadores contam com a contribuição espontânea por parte da plateia, que poderá pagar pelo ingresso de forma voluntária ao final de cada apresentação.