Escalado para liderar uma oficina realizada pelo Festival Taguatinga de Cinema, em agosto, o produtor cultural Abder Paz guarda ensinamentos que valem ouro para aqueles interessados na criação de lives caseiras e ainda das profissionais. Tudo sem muito mistério já que ele garante ser possível capacitar pessoas que têm apenas um celular e, claro, aquelas dispostas a adquirir equipamentos profissionais. “A produção de live teve um crescimento exponencial devido à pandemia. A produção de live se diferencia da produção televisiva, em geral, porque é fundada em um pilar importante: a interação com o publico. Num momento como o atual, de isolamento social, existe uma necessidade de interação. É um aspecto fundamental na transmissão ao vivo, as várias possibilidades de interação ou via chat, via inbox ou até mesmo, como nos referimos no teatro, ao rompimento da quarta parede”, comenta Abder.
Na aventura pelo mundo das lives, o requisito mínimo é ter um aparelho de telefone ou computador e conexão à internet. “A composição de uma boa transmissão ao vivo joga com conceitos de sensibilidade e conhecimentos técnico de produção audiovisual como luz, enquadramento e captação de áudio”, observa Abder. Mesmo os celulares simples trazem possibilidade de cumprir a meta de obter uma live de qualidade. Pesa a forma na qual um conteúdo será apresentado, e claro, o como realizar a comunicação.
Abder chama a atenção para o conteúdo diversificado em que canais englobam temas desde um passo a passo (ou tutorial) a análise empírica de produtos, sem contar, claro, shows: tudo passível de ser disposto em live. “Eu mesmo gosto de aprender algo novo ou ver se determinado produto funciona, a partir da avaliação e atestado de outras pessoas. O importante é pensar e organizar o pensamento de maneira a realizar a produção com resultados bacanas”, comenta Abder, dotado da facilidade de ser ator (por formação) em frente às câmeras.
Afora a espontaneidade, ele explica que a escolha do ambiente e plataforma para realizar o streamer são fatores determinantes. “Cada plataforma tem especificidades com tipos de enquadramentos ou complementos gráficos que podem ser utilizados, filtros e outros; daí a escolha do formato ser fundamental”, explica.
Rede democrática
Com barateamento da comunicação via lives, a coordenadora e diretora da produtora independente Trupe do Filme, Ana P. Araújo, percebeu dividendos, em meio à pandemia, para adaptar a experiência anterior de lives dedicadas a promoções institucionais. “A cultura se movimentou por apoios coletivos. Sem estrutura, os artistas ficaram meio parados. Pelas lives, ampliamos aprendizados e investimos em cenários e na mescla de personalidades como Márcia Tiburi e Japão, trazendo apoio para artistas locais como Nega Lu, que apresentou um sarau cultural, em live, de bastante sucesso”, explica Ana.
Entre um cardápio de possibilidades que vão de lives de festas (com presença de DJ), a lives de exibições de galerias, passando por lives de adesão massiva, como as de Gustavo Lima e Marília Mendonça, a opção da Trupe do Filme alavancou público de 5000 pessoas interessadas nos produtos em que a “criatividade salva”. “É um formato diferenciado, com o qual o público tem adquirido familiaridade. Com a linguagem da novela, por exemplo, nós estamos acostumados desde criança. Live é novo: atinge e cria novos públicos. Depende de com quem queira falar, e há ainda a possibilidade de retransmissões em espaços virtuais complementares”, observa a diretora.
Além de qualidade do bom papo transmitido pela live e mesmo de contribuições artísticas, Ana aumenta o elencar de fatores desejáveis numa live: boa sincronia de áudio (sem chiados), capricho na iluminação e no cenário, e, aprimorando patamares, ao menos duas câmeras em uso. Na equipe da Trupe do Filme, há nove pessoas em cargos que vão da direção de produção, diretor de fotografia, direção (de programa), roteiristas e, editores para a transmissão, além de uma câmera e do responsável pela iluminação.
Ao menos quatro profissionais garantem a live profissional. “O que importa é as pessoas se apropriarem e irem fazendo, mesmo os que não têm a estrutura. O que interessa é fazer chegar reflexão para quem está em casa, assistindo. Ah! Uma internet boa, de pelo menos 30 megas de upload, é indispensável”, conclui.
Ouvidos no futuro
De consumidora do podcast Talvez seja isso, que dá apoio à leitura do livro Mulheres que correm com os lobos, a empreendedora e produtora cultural Heloísa Rocha (reconhecida pelo projeto Ossobuco, dedicado a palestras curtas) passou a se interessar pelo desvendar do formato. Entusiasmada com a possibilidade de contar histórias e ver (ouvir, melhor dizendo) o aprofundamento de assuntos, em programas com característica informativa, Heloísa partiu para a análise dos podcasts. “Noto que, quando se tem uma boa história, quem investe em podcast tem o básico. Há o quesito da qualidade técnica: as pessoas não acompanharão algo, caso não escutem direito. Seja na contação de história ou em programas jornalísticos, não adianta simplesmente colocar o áudio de um vídeo. É preciso ter conteúdo específico”, elenca.
A possibilidade de se fazer outras coisas ao mesmo tempo (dirigir, praticar exercícios), enquanto se acompanha um podcast é dos diferenciais de público. “O consumo serve como uma companhia mesmo. Estando em um meio em crescimento, o legal é que as pessoas estão se descobrindo, com muito espaço para criação e experimentação”, analisa Heloísa Rocha. Ela avalia que a nova linguagem cresceu, dado o desgaste dos vídeos. “Houve disseminação muito grande, com aplicativos e ferramentas, nas facilidades para vídeo. Sem demanda, num primeiro momento, esta estrutura para áudio surge agora. Editar material ainda é bem mais difícil para áudio; mas surgem agora plataformas mais acessíveis”, comenta.
Heloísa foca atualmente no coletivo A Nossa Casa de Podcast, montando a partir de financiamento pelas redes, produzindo com a intenção de se afirmar como uma plataforma de divulgação dos podcasts criados em Brasília. “Antes, havia restrições, com muito visibilidade apenas às criações de São Paulo. Com variedade temática, pretendemos criar uma espécie de prateleira de títulos locais, garantindo visibilidade da produção”, explica Heloísa Rocha.
Com modéstia no investimento, a especialista diz haver espaço para podcasts com qualquer tempo de duração, desde que haja aprofundamento nos temas; ela relata podcasts de até de duas horas e meia. “Tratamento de som e equipamentos melhorados são bem-vindos, agora que houve uma maior capilaridade para difusão do podcast”, comenta. A aceleração da perspectiva mais profissional decorre dos acessos facilitados, via Spotfy e Deezer, além da entrada de grandes corporações de comunicação na jogada.
Dicas para boas lives
- Escolha sempre um lugar iluminado (perto de janela, por exemplo). Você quer ser visto, não?
- Entender das particularidades do conteúdo pretendido (se será um debate, um registro de teatro, de música) e perceber que, por exemplo, num debate em que, à distância, participem convidados, a captação de som será responsabilidade de cada um; ao passo em que, numa performance, há necessidade de foco em microfones precisos e potentes.
- Interação é a base de uma live: mas, há exceções. Administrando conteúdo político, e por diversas outras razões, é aconselhável desligar o canal, para evitar embates públicos (de discordantes exaltados). Haters e ataques públicos nunca são bons convidados.
- Numa oficina ou palestra, há expectativa dos participantes de interagirem e, claro, de prontas respostas.
- Plataformas como Zoom e Jipsi permitem gravações que facilitam, em grupos restritos, aprendizado (no caso dos cursos).
- Plataformas são um diferencial de lives. Há quem transmita direto das redes sociais (com limitações de recursos). Com mais possibilidades, o site on-line streamingyard (aproveitável no YouTube e no Facebook) ofertam possibilidades de fundos diferenciados e inclusões de animações. Bem mais completo, o OBS (software livre) precisa ser baixado, mas rende muito controle e adereços extras bem atrativos para usuários.