“Antes de ser cantora, eu sou compositora. Eu canto as músicas que eu componho.” Assim se expande Letícia Fialho, 30 anos, do lugar em que, geralmente, colocam as mulheres na música. O espaço dado é para a voz feminina, mas, dificilmente, para os instrumentos ou composição. Além de compor, para romper ainda mais barreiras, a musicista não se contenta em ser instrumentista no singular. No seu próximo EP, intitulado Carta de fogo, todos os sons são feitos por ela.
Letícia veio de família musical e começou a trajetória musical no piano. “Mas queria algo que não precisasse de tomada”, conta a compositora, ao explicar como escolheu o violão acústico. Apesar de ser seu instrumento principal, com o qual sente conforto, se aventurar por outros caminhos foi um processo de exposição e descobertas.
Certa vez, um colega disse à Letícia: “Todas as ideias vêm de você”. Decidiu, por isso, criar todas as faixas das músicas, envolvendo piano, guitarra, violão, percussão, bateria e vozes. Uma ajuda daqui, outra de lá, chegou à gravação do EP no estúdio Entrequadras Músical, seguindo as orientações sanitárias, com auxílio de Gabriel Tomé, responsável pela captação e edição. Thaís Mallon, fotógrafa, juntou-se para registrar todos os momentos e processos.
“Percebi que posso fazer sozinha, mas, no coletivo, vou mais feliz”, revela a compositora, que enxerga o afeto como grande base de construção deste trabalho. “Tudo aconteceu graças a parcerias afetuosas e generosas de gente querida e incrível em suas áreas, e que, para a minha sorte, botam fé no meu trabalho”, acrescenta.
Fogo
A canção Carta de fogo existia nas escrituras de Letícia, feita em parceria com o cantor Alexandre da Silva, que, no entanto, foi trazida para o presente pelo símbolo que o fogo carrega, de acordo com ela, “ainda mais no atual momento. Simbolizando desde aceitações até recomeços, a atenção com a palavra é ponto central para a compositora, com formação acadêmica em letras. Suas músicas também trarão versos de outros poetas do DF, de olho na produção local.
Carta de fogo está previso para ser lançado no fim deste mês, dos signos de fogo, com capa feita pela ilustradora Diana Salu. “Acho que esse EP é uma mensagem para nós, mulheres, fazermos nossas coisas sem ter que ficar esperando o aval de um homem para começar algo”, pontua a artista.
Diversidade
Maravilha marginal (2018) é o álbum de estreia de Letícia Fialho, feito com a Orquestra da Rua. Das 10 canções, algumas foram feitas em parcerias, em uma mistura de afroblues com MPB. Acompanhadas por violão acústico, pandeiro, trompete, contrabaixo e guitarra, apresentam símbolos brasileiros como em Candeeiro e Mandacaru. Purpurina anzol (2019) é um EP construído por três elementos: Letícia na voz e no violão, enquanto Rodrigo Zolet assumiu a sanfona. São quatro faixas autorais, regadas de partilhas, levezas e afeto.
No meio de muitas diversidades, apenas um gênero musical é pouco para enquadrar todo o trabalha da compositora. “Quando a gente fala de música brasileira, vai do blues ao samba, ao xote”, destaca a compositora, que tem influências do samba, Cássia Eller, Gilberto Gil e Djavan.
Letícia Fialho se apresentou no Festival CoMA, Consciência, Música & Arte, no ano passado, com a Orquestra da Rua e Pedro Luís. Além disso, faz parte do bloco carnavalesco Essa boquinha eu já beijei. Assim segue a artista. Compositora, instrumentista e cantora. A ordem importa, não vale invertê-la.
*Estagiária sob supervisão de Igor Silveira