Este ano, o Salão Anapolino teve recorde de inscrições. Foram 1.200, sendo que 1.185 acabaram homologadas. O número é maior que nas últimas três edições, quando as inscrições ficaram numa média de 800. “Não tivemos inscrições somente do estado de Roraima. Acredito que o contexto da pandemia e do desmonte geral da cultura em âmbito nacional, tenha sido um dos principais fatores para um número tão expressivo”, explica o curador do evento, Paulo Henrique Silva.
Essa é a 25ª edição do salão, um dos mais tradicionais do Centro-Oeste, realizado pela Prefeitura de Anápolis e pela secretaria municipal de Cultura. Na categoria Mostra Nacional, o prêmio é de R$ 10 mil para os três melhores trabalhos. Este ano, foi criada a categoria Fomento à Produção Anapolina, destinado a artistas de Anápolis e com prêmio de R$ 2,5 mil para os quatro melhores trabalhos. Entre os inscritos, 24 nomes devem integrar a mostra que, por conta da pandemia, teve data e formato alterados.
A montagem física terá início em 10 de agosto na galeria de Artes Antônio Sibasolly, em Anápolis. Será feito então um registro audiovisual da exposição para ser hospedado no site de inscrições do Salão. “A ideia é, assim que for liberado por decreto, ainda com data indefinida, abrir a mostra ao público com todas as regras de segurança (uso de máscara, álcool gel e número reduzido de visitantes)”, avisa Paulo Henrique. “Posteriormente, acreditando que os tempos já estarão melhor, temos a previsão de abertura da mostra no Centro Cultural da UFG em Goiânia.” A mostra em Goiânia deve começar em 21 de novembro, quando serão anunciados os premiados, e a previsão é que fique em cartaz até 29 de janeiro de 2021. Em 21 de novembro, também haverá uma mesa redonda com Wagner Barja, Adelaide Pontes e Clarissa Diniz, membros da comissão de seleção, e Claudinei Roberto da Silva, Samantha Moreira e Vania Leal, responsáveis pela premiação.
Para Wagner Barja, ex-diretor do Museu Nacional da República e membro do júri do Salão Anapolino, foi difícil chegar a uma seleção. “Eu acho que o afastamento social, face à pandemia, não afastou os artistas de sua produção. O salão teve mais de mil inscrições. Eu já participei, como jurado, de muitos prêmios, mas dessa vez foi difícil”, conta. “É bom dizer que o Distrito Federal ficou bem na fita no gargalo da seleção. Foram três selecionados, numa condição de igualdade com grandes centros hegemônicos. A produção realizada por aqui, assim como em todo Centro-Oeste, dialoga com o país do Oiapoque ao Chuí”, garante o jurado.
De Brasília, entraram para a seleção Rodrigo d'Alcântara, Pamella Anderson e João Trevisan. Rodrigo teve duas obras selecionadas: Capikarã, videoarte que traz uma interpretação mitológica contemporânea do cerrado brasiliense, e Híbrida, uma experimentação pictórica audiovisual sobre o mito da Medusa. Ambas foram criadas em parceria com os também artistas Karol Lira, Maurício Chades, AVAF e Ana Matheus Abbade e compõem um conjunto de trabalhos audiovisuais chamados de Série Sincrética.
Já João Trevisan trabalha como um coletor: ao redor do próprio ateliê, ele coleta os materiais brutos criar as peças. Nesse garimpo entram de restos de trilho e madeiras a pedras e plantas. “Quando penso sobre o trabalho, logo algumas ideias surgem. Talvez questões que a própria matéria indica, são elas: equilíbrio, peso, densidade, organização, repetição, articulação, mas não são só sobre essas questões que o trabalho aborda. Penso sobre a história política que a própria matéria carrega”, avisa o artista.
A internet e seu impacto no cotidiano é tema das pinturas de Pamella Anderson que, desde 2016, explora o tema com viés do comportamento dos brasileiros na web. “Minha produção foi sendo construída a partir da apropriação de memes de situações absurdas que viralizaram no Brasil”, conta. Selecionada para o salão, a série/políptico faz uma reflexão sobre a reprodução exagerada de informações falsas e absurdas. “Me aproprio de correntes de fake news e de suas paródias que circularam nas mídias no último período eleitoral brasileiro”, avisa Pamela, que, por meio da serigrafia, reproduz uma série de fake news e elementos visuais do Whatsapp, o aplicativo de mensagens mais utilizado para disseminação desse tipo de conteúdo. A ideia da artista é criar sobreposições para distorcer e supersaturar ainda mais o conteúdo. “Diante de um cenário mundial alarmante, em que a internet tem sido utilizada para manipular e replicar informações absurdas e falsas, com o intuito de direcionar, polarizar e amplificar interesses políticos, penso que trazer o debate do mundo on-line para o contexto artístico é urgente e fundamental para entender como e por que as pessoas pensam e se comunicam da forma atual”, acredita Pamella.