Nascida mulher e negra no Brasil, a atriz, diretora e roteirista Ana Flávia Cavalcanti, 38 anos, sublinha que a condição a coloca, dia a dia, no front de batalha por direitos igualitários. O conceito da invencibilidade sistemática, atribuído a mulheres, vem com uma ressalva: “Isso pode levar a uma exaustão física e psíquica, além do que ninguém é forte o tempo todo”. Com a carreira repleta de conquistas para 2020, a ativista Ana Flávia é cautelosa na celebração. “O mais importante, agora, é cuidarmos de saúde”, observa, em entrevista ao Correio.
A tranquilidade da paz no retorno às gravações da novela Amor de mãe transparece, quando Ana Flávia percebe a cautela no ambiente de trabalho. “A Globo está tomando todas as medidas para termos segurança. Quero voltar a trabalhar e sinto que agora estamos mais amparados e entendendo melhor os protocolos. Integrada à novela, “muito linda” como ela descreve, Ana Flávia aposta na fidelidade de público. “As pessoas estão muito ansiosas para essa volta. Eu espero que a Miriam (a inspetora que interpreta) ajude a Dona Lurdes (Regina Casé) a encontrar Domênico (um filho desaparecido), e, se não fosse a pandemia, podia rolar um amor pra Miriam”, palpita.
O ano de 2020 segue impondo surpresas para a carreira de Ana Flávia que, mesmo impedida de prestigiar festivais internacionais que selecionaram o longa Casa de antiguidades, numa lista que inclui Cannes e Toronto, deixa claro o entusiasmo em cena com o emblemático Antônio Pitanga. “Amei trabalhar com ele: além da honra, veio o aprendizado! Ele tem 80 anos, e isso é divino, é inspirador. Pitanga é ativo, forte, dinâmico, divertido, cheio de histórias. Foi muito especial”, comenta a artista, que tem o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro por “inesquecível”. Codiretora do curta Rã (ao lado de Julia Zakia), saiu premiada da capital, em 2019, pelo melhor curta-metragem.
Alinhamento social
De tudo que vê à volta, o cuidado social (e a falta dele) chama a atenção de Ana Flávia que pretende, por performances (como A babá quer passear), estimular discussão sobre os direitos e condições de trabalhos domésticos. “Meu desejo é tensionar, nas performances, a relação entre patrão e empregado no Brasil, já tão estabelecida e fortemente sustentada por uma herança escravocrata, que troca a senzala pelo quarto de empregada, um espaço insalubre e sem iluminação natural”, avalia. Outra conquista de 2020 foi filmar, em meio à pandemia, o filme Bocaina, assinado em criação conjunta por colegas como Malu Galli e Fellipe Barbosa.
Vista atualmente na tela com Malhação: Viva a diferença, a atriz paulista defende a personagem Dóris, que aposta todas as fichas no estabelecimento de uma educação pública de qualidade. “Abordamos temas necessários na discussão de uma sociedade mais equânime e que deseja olhar para os jovens de um ponto de vista horizontal. Falamos de transfobia, de gravidez na adolescência, do uso de drogas, da alienação parental, da violência contra negros e pobres e do assédio sexual”, conclui.
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