Literatura

Primeiro romance de Cyro Leão enaltece palavra como alívio para a tragédia

"Rafaela em queda" é descrita pelo autor como um "thriller existencialista", no qual a literatura é uma bóia em meio ao naufrágio

Rafaela em queda, primeiro romance do escritor paulista Cyro Leão, foi lançado em novembro de 2019. O autor teve a chance de, antes do advento da pandemia, encontrar o público em uma noite de autógrafos e vender boa parte dos 250 exemplares impressos pela editora Patuá, que trabalha com um esquema sob demanda. A primeira remessa esgotou pouco antes do início da quarentena, e uma nova tiragem já está disponível para ser adquirida pelo site da editora ou pela Amazon, por R$ 40, mais o frete.

A trama é centrada em três personagens: Rafaela, Teles e Rôme. “São pessoas que não se encontraram, pouco encaixados na vida. Tanto em um sentido pessoal, das histórias de vida deles, quanto de uma maneira mais metafísica”, descreve o autor. Rafaela, que protagoniza e empresta o nome ao título da obra, é mais perdida do que os outros dois personagens, com os quais acaba se encontrando por circunstâncias do acaso.

Delirante e mais desencontrada do que os outros dois personagens, Rafaela sofre com os questionamentos sobre o mistério e o sentido da vida, e vê na literatura algum bálsamo, mas caminha inevitavelmente para um destino trágico, que vem justo quando a vida parecia que ia dar uma virada. “Rafaela em queda é a trajetória da tragédia da Rafaela. De certa forma, o título já dá um spoiller: se tá em queda, não deve ter coisa boa no fim”.

Narrativa do livro Rafaela em queda

Narrado de forma não linear, o livro é dividido em três atos. O primeiro introduz e desenvolve os personagens. O segundo chama-se O livro de Rafaela, e baseia-se nos escritos da personagem-título que são descobertos e publicados após a tragédia. O terceiro é um apêndice que amarra alguns contos, mas deixa a conclusão em aberto, “pra deixar claro que a vida não vai ter um desfecho”.

Mesmo não querendo se limitar a rótulos, Cyro gosta de definir o livro como um “thriller existencial”: “Tem uma pegada de thriler, mais de angústia do que de suspense, mas também uma questão existencial que abrange, paira por todo o livro: essa grande busca nossa pelo mistério. Eu gosto muito de livros de mistério, e um grande mistério que a gente tem é o da vida”, conceitua.

Modestamente, Cyro prefere não citar os autores que admira como influências, como Graciliano Ramos, Dostoievsky ou Rainer Maria Rilke. “Para mim, são tão inatingíveis, que seria estranho falar”. Mas admite que pode se identificar algo de kafkiano em alguns momentos e uma tentativa de homenagear e fazer referências a Machado de Assis. Para ele, um dos maiores.

A influência maior, na opinião do autor, é a do amor pela palavra justa, pela textura como elemento fundamental do texto, tanto quanto o conteúdo. Não por acaso a personagem principal é uma escritora. “O coração do livro é o livro dela. a busca por uma resposta e ter na literatura, no escrever, no ler, uma válvula de escape que, se não dá resposta, pelo menos dá algum alívio.”

Outra influência marcante, para o autor, é a do rock pesado, sobretudo a banda Nine Inch Nails e o líder Trent Reznor, que é citado no livro, além da música Hurt, clássico da banda. Vale destacar ainda o quê de tragédia grega e uma visão trágica que permeia a obra. “A vida é uma grande tragédia. Mas o tema existencial acho que é o que mais me conduz a buscar uma literatura que faça sentido em ser mais trabalhada, para mim. “

O autor Cyro Leão

Cyro Leão trabalha na área de comunicação de eventos, tendo sido responsável por atrações como a exposição Jardim dos Insetos Gigantes. O primeiro livro que publicou foi Confusão uma coletânea de poemas produzidos desde a adolescência. Passou mais de oito anos trabalhando no que viria a ser Rafaela em queda, o primeiro romance, e já trabalha em mais três volumes: um de contos, outro de poemas e um novo romance.

*Estagiário sob a supervisão de Adriana Izel