
Por Antonio Gonçalves*
Março é o mês da mulher, e a comemoração, antes mais concentrada no dia 8, agora acontece ao longo de todo o mês — merecidamente. Com isso, é comum o lançamento de campanhas sobre violência contra a mulher e a divulgação dos instrumentos de controle e canais de denúncia, como o 190 e o Disque 100, a fim de reduzir a persistente subnotificação.
Concomitantemente, em 9 de março de 2015, foi promulgada a Lei 13.104, a lei do feminicídio. Dez anos depois, a primeira e mais óbvia pergunta é: temos o que comemorar? Desde sua promulgação, foram registradas 11.859 vítimas — mais de mil mulheres mortas por ano no Brasil. Em 2024, o país bateu o recorde de feminicídios, com 1.459 vítimas, o que representa quase quatro mortes diárias.
A norma não foi a única criada no período e integra um conjunto protetivo para as mulheres, que teve como objetivo endurecer a legislação penal. Mas funcionou? Somente em 2024, houve um aumento de 9% na violência contra a mulher, em comparação com o ano anterior. E o dado mais alarmante: a violência sofrida por nove entre dez mulheres foi testemunhada por terceiros.
O aumento dos casos pode estar relacionado ao incremento das denúncias, mesmo com a estimativa de que elas representam apenas 10% do total de casos. A situação é alarmante. Afinal, quase metade das mulheres agredidas opta por não procurar ajuda. Não é fácil romper o ciclo de violência quando 40% dos agressores são cônjuges, namorados ou parceiros atuais, e 27% são ex-companheiros. Dessa forma, a violência cresce, mesmo com o endurecimento penal, o que demonstra que a misoginia no Brasil continua preponderante.
O principal entrave é a falta de garantia do Estado Democrático de Direito em assegurar que os denunciados pelas mulheres sejam responsabilizados e afastados do convívio familiar. Como, na prática, uma parcela significativa dos agressores retorna ao convívio, a violência, além de não cessar, se agrava. É evidente a falta de apoio do Estado às vítimas.
A cada ano em que são apresentadas as estatísticas sobre violência contra a mulher, fica claro que o endurecimento penal tem sido ineficaz para conter a epidemia da violência. Então, a pergunta que persiste é: o que fazer?
A resposta não é imediata nem simples. Em caso de violência, disque 190 ou Disque 100 para denunciar a agressão. Vamos reduzir a subnotificação.
O segundo passo é buscar acolhimento. Se o Estado falha sistematicamente em proteger suas mulheres, há centros de referência providos pela sociedade civil, como o Mapa do Acolhimento, que conecta vítimas a advogadas e psicólogas em todo o Brasil.
Para as etapas seguintes à denúncia, a ONG Justiceiras oferece orientação jurídica às mulheres em situação de violência para a realização do boletim de ocorrência, pedido de medidas protetivas e, também, fornece apoio nacional junto ao sistema de justiça. Já o Instituto Maria da Penha atua na capacitação, realização de workshops e palestras para prevenir e enfrentar a violência doméstica. A Associação Fala Mulher oferece acolhimento — tão negligenciado pelo Estado — às vítimas de violência.
É a sociedade civil fazendo o que o Estado Democrático de Direito brasileiro deveria oferecer às mulheres, mas não oferece. Ninguém, absolutamente ninguém, é obrigado a permanecer em um ambiente violento, seja por qual motivo for. Por isso, denuncie e procure proteção; não espere a violência verbal se transformar em violência física e, muito menos, resultar em feminicídio.
Mudar a misoginia e a cultura machista leva tempo, e somente com a responsabilização dos agressores o ciclo de violência será rompido. Portanto, proteja-se, denuncie, busque acolhimento e, acima de tudo, valorize sua vida — sua segurança também depende de você.
Advogado criminalista*