
Por Thaís Riedel*
O Supremo Tribunal Federal (STF) vai decidir quem deve arcar com os salários de mulheres vítimas de violência doméstica que precisam se afastar do trabalho em razão de medida protetiva com base na Lei Maria da Penha.
O que o STF está discutindo é quem deve pagar os salários das mulheres que devem ter o vínculo de emprego mantido por até seis meses em caso de afastamento necessário em razão da violência contra a mulher, conforme previsto na Lei Maria da Penha.
Para isso, é necessário, primeiro, discutir a natureza desse benefício, que é atípico.
Se ele for trabalhista, será devido pelo empregador da mulher. Se for assistencial ou previdenciário, quem paga é o Estado.
Para a busca da inclusão no mercado de trabalho, é muito ruim que seja considerado trabalhista, porque, nesse caso, o responsável pelo pagamento seria o empregador, o que certamente impacta na decisão de contratação de mulheres. O salário-maternidade nasceu como um benefício trabalhista, e o que se observou foi uma menor contratação de mulheres em razão do impacto financeiro sobre o negócio. Por isso, decidiu-se que o benefício seria previdenciário. O empregador paga, mas recebe o valor em abatimento de tributos previdenciários.
A outra discussão, suscitada pelo INSS, é se o benefício tem natureza assistencial ou previdenciária. Como não há previsão de qualquer condição para a sua concessão, isso, aliado à redação do caput do artigo — que afirma que a assistência à mulher vítima de violência será prestada pelo Sistema Único de Saúde e pelo Sistema Único de Segurança Pública, de forma articulada com a Lei Orgânica da Assistência Social —, leva à interpretação de que se trata de um benefício assistencial.
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Por outro lado, o inciso do artigo que trata do afastamento da mulher fala na manutenção do vínculo, o que dá a entender que pode ter natureza previdenciária. O juiz da decisão que está sendo discutida no STF aplicou, de forma análoga, as regras do auxílio por incapacidade. Nesse caso, o benefício seria previdenciário e, portanto, haveria regras a serem cumpridas, como a qualidade de segurada, a carência (número mínimo de contribuições para ter acesso ao benefício) e a avaliação pericial.
O que o Supremo tem feito em outras decisões é ponderar o benefício previsto em lei, mas carente de regulamentação, com os custos envolvidos na sua concessão. Foi assim com o piso da enfermagem e outros direitos previstos em normas que podem ser consideradas inconstitucionais.
No caso em questão, há também uma discussão processual sobre a competência do julgador. O INSS alega que o juiz que proferiu a sentença determinando o pagamento do benefício não é competente para julgar a causa. Portanto, ainda há a possibilidade de o STF não decidir o mérito da questão e se concentrar apenas na parte processual.
Na minha opinião, o pior dos cenários é entendermos que se trata de um benefício trabalhista, pelas razões já expostas.
Doutora em direito constitucional, mestre em direito previdenciário, professora do IDP e do UniCeub e presidente da Associação Brasiliense de Direito Previdenciário*