Visão do Direito

O direito à vida e à liberdade religiosa: um diálogo necessário

"Um paciente adulto, lúcido e plenamente capaz tem o direito de recusar tratamentos médicos, inclusive transfusões de sangue, ainda que isso represente risco à sua saúde ou vida"

Gabrielle Chalita e Diwlay Ferreira Rosa -  (crédito: Arquivo pessoal)
Gabrielle Chalita e Diwlay Ferreira Rosa - (crédito: Arquivo pessoal)

Por Gabrielle Chalita e Diwlay Ferreira Rosa* — O embate entre o direito à vida e à liberdade religiosa assume novas perspectivas com os recentes entendimentos do Supremo Tribunal Federal (STF), especialmente nos Recursos Extraordinários 979.742 e 1.212.272. Esses casos reafirmam a relevância da ponderação de direitos fundamentais, evidenciando a complexidade das decisões médicas em situações de urgência.

No contexto de pacientes fiéis da igreja Testemunhas de Jeová que recusam transfusões de sangue por convicções religiosas, o STF avançou ao reconhecer a necessidade de soluções que respeitem a dignidade humana, os direitos individuais e a liberdade religiosa.

Isso não implica o abandono do tratamento, mas sim a continuidade dos cuidados por meio de procedimentos alternativos, mesmo que sejam realizados fora do domicílio do paciente, quando necessário.

Um paciente adulto, lúcido e plenamente capaz tem o direito de recusar tratamentos médicos, inclusive transfusões de sangue, ainda que isso represente risco à sua saúde ou vida, desde que a recusa seja feita de forma livre, informada e com plena capacidade de discernimento.

Os médicos devem respeitar essa decisão, documentando a recusa e assegurando-se de que o paciente compreenda todos os riscos e consequências. O atual entendimento do STF oferece proteção legal a médicos e hospitais que respeitem a vontade do paciente, protegendo-os contra questionamentos judiciais. No entanto, é fundamental que a recusa seja devidamente registrada e que todas as alternativas terapêuticas sejam exauridas.

Nos casos de pacientes inconscientes ou incapazes de manifestar sua vontade, a decisão do STF não se aplica diretamente. Nessas circunstâncias, cabe à equipe médica adotar medidas para preservar a vida do paciente, respeitando eventuais diretivas antecipadas de vontade ou manifestações de familiares sobre a posição religiosa. Em emergências, sem diretivas antecipadas, os médicos devem priorizar a proteção à vida.

A autonomia do paciente é um princípio basilar, embora não absoluto. A proteção à vida continua sendo a prioridade em situações extremas, como reconhecido pela Suprema Corte.

Essa temática ressalta a necessidade de capacitar profissionais de saúde e gestores hospitalares para lidar com cenários tão sensíveis, equilibrando direitos e responsabilidades. Além disso, evidencia a urgência de diretrizes mais claras para garantir segurança jurídica e ética nas decisões médicas.

O desafio é harmonizar o direito à vida e a liberdade religiosa, especialmente diante das mudanças jurisprudenciais. Cada caso deve ser analisado com sensibilidade e rigor técnico, assegurando o respeito à Constituição e aos direitos humanos.

*Advogadas no escritório Rubens Naves, Santos Junior Advogados

  • Gabrielle Chalita, advogada no escritório Rubens Naves, Santos Junior Advogados. Membro da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo (OAB/SP)
    Gabrielle Chalita, advogada no escritório Rubens Naves, Santos Junior Advogados. Membro da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo (OAB/SP) Foto: Divulgação
  • Diwlay Ferreira Rosa, advogada no escritório Rubens Naves, Santos Junior Advogados. Membro da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo (OAB/SP)
    Diwlay Ferreira Rosa, advogada no escritório Rubens Naves, Santos Junior Advogados. Membro da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo (OAB/SP) Foto: Divulgação

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postado em 09/01/2025 03:00
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