A eleição para a direção das Cortes Superiores quase sempre respeita uma tradição, a regra da antiguidade e o rodízio entre os seus integrantes. Ocorre dessa forma no Superior Tribunal Militar (STM). Mas não foi tão simples assim para a ministra Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha, 64 anos, chegar à presidência.
A magistrada, única mulher na Corte em 216 anos de história, foi eleita presidente, na semana passada, em votação apertadíssima e secreta: oito votos a sete. A ministra teve um oponente que se apresentou para a disputa, o ministro Péricles de Queiroz. Por pouco ela perderia a chance de assumir pela primeira vez como presidente eleita o comando do órgão máximo da Justiça Militar. Na mesma sessão de votação, foi eleito como vice-presidente o atual presidente, ministro tenente-brigadeiro do ar Francisco Joseli Parente Camelo. Os dois vão comandar a Corte no biênio 2025-2026, com a posse prevista para março.
A eleição com disputa chamou a atenção do mundo político. Durante a sabatina do general Guido Amin Naves, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, o assunto veio à baila ontem. O militar, que foi indicado pelo presidente Lula para um dos assentos no STM, foi questionado pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES). O parlamentar petista queria saber a avaliação do futuro magistrado sobre o que chamou de "violação de uma tradição bicentenária da instituição".
Contarato afirmou: "A cada dois anos há uma rotatividade na presidência pelas Forças Armadas, daí quando chegou a vez da única mulher do STM presidir, houve o lançamento de uma candidatura masculina e a decisão foi para o voto. Isso é uma demonstração de que há na instituição um comportamento sexista, o que é muito significativo". O general Naves, que nem mesmo participou da discussão no STM, limitou-se a parabenizar a ministra pela presidência.
A ministra Maria Elizabeth está acostumada com o estranhamento por sua presença feminina na Corte. E segue fazendo história no STM. Foi a primeira mulher a se tornar ministra, a assumir a vice-presidência, a chegar à presidência por alguns meses e agora a ser eleita para o comando da Corte. Em 2014, Maria Elizabeth assumiu a presidência por meses, em mandato-tampão, ao substituir, como vice-presidente, o general Raymundo Nonato de Cerqueira Filho que estava no cargo e se aposentou.
Nascida em Belo Horizonte, Maria Elizabeth foi nomeada para o STM em 2007, pelo presidente Lula. Entrou na vaga de civil, respaldada pelo currículo, quando ocupou uma das três cadeiras previstas para a advocacia pelo quinto constitucional no tribunal. Doutora em direito constitucional pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) — classificada com nota "10 com louvor" — ela exerceu o cargo de procuradora federal, sendo aprovada em concurso em 1985, em primeiro lugar.
A ministra Elizabeth não estava distante do mundo militar. Ela é casada com o general de divisão Romeu Costa Ribeiro Bastos. Mas fez carreira por mérito próprio. Ao tomar posse pela primeira vez na presidência, a magistrada afirmou: "A ampliação da participação das mulheres nos espaços públicos e privados é condição para o aperfeiçoamento da cidadania. Afinal, uma democracia sem mulheres é uma democracia incompleta".