Visão do Direito

Empréstimos internacionais - equalização de propostas - limites

"Em outras palavras, não cabe a equalização de valores da proposta do estrangeiro, nesse caso"

Murilo Queiroz Melo Jacoby Fernandes e Jorge Ulysses Jacoby Fernandes  -  (crédito: Divulgação)
Murilo Queiroz Melo Jacoby Fernandes e Jorge Ulysses Jacoby Fernandes - (crédito: Divulgação)

Jorge Ulisses Jacoby Fernandes* e Murilo Queiroz Melo Jacoby Fernandes** — O pressuposto do comércio Internacional, que muitas vezes é âncora para a paz, está precisamente na ordem jurídica que as partes por convenção decidem estabelecer.

1. Dos regulamentos de organismos internacionais multilaterais

Como importante país no cenário econômico mundial, o Brasil integra vários organismos internacionais multilaterais vocacionados para o desenvolvimento mundial e até setorial.

2. Das leis brasileiras

Quando emprestam valores, em condições extremamente vantajosas, esses organismos ordenam a aplicação de regras próprias, o que normalmente não traz maiores consequências jurídicas.

No atual sistema jurídico, há duas leis que regem o processo licitatório. A Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021 e a Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016. A primeira para a Administração Pública Direta, Autarquias e Fundações; a segunda para as empresas estatais.

A Lei nº 14.133/2021 é expressa ao vedar as barreiras de acesso ao licitante estrangeiro.

Embora seja vedado estabelecer barreiras, é admitido que o edital preveja margem de preferência para bens produzidos no País e serviços nacionais que atendam às normas técnicas brasileiras, na forma definida no art. 26 desta Lei.

Por outro lado, quando a administração pública assume a forma estatal, seja por empresa pública ou sociedade de economia mista, não pode ter privilégios em relação à iniciativa privada. Nesse cenário, não há a imunidade tributária, ressalvada expressamente pelo ordenamento jurídico situação anômala, quando exerce atividade típica da administração direta, por exemplo, a empresa brasileira de Correios e Telégrafos - ECT e a Casa da Moeda do Brasil, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal.

3. Da aplicação dos regulamentos dos organismos multilaterais

Nesse ponto é que existe uma polêmica que a Lei nº 14.133/2021, repetindo a evolução da Lei nº 8.666/1993, tenta superar, fixando requisitos objetivos para a aplicação da norma do organismo internacional que podem ser assim hierarquizados:

1º - não conflitem com os princípios constitucionais em vigor;

2º - sejam expressamente exigidos para a obtenção do empréstimo ou doação;

3º - as condições decorrentes de acordos internacionais sejam previamente aprovados pelo Congresso Nacional e ratificados pelo Presidente da República;

4º - as condições sejam expressamente indicadas no respectivo contrato de empréstimo ou doação;

5º - o órgão jurídico do contratante do financiamento tenham emitido parecer favorável à celebração do referido contrato.

Esse é o conjunto de exigências que estão inseridos no art. 1º, limitando o alcance da própria lei.

4. Da evolução da jurisprudência

O tema aqui versado teve longa evolução e, por isso, há segurança jurídica na atualidade.

O tema voltou ao Plenário do TCU que, respondendo consulta e, portanto, em caráter normativo para fixação da tese, decidiu que o art. 42, § 5º, da Lei 8.666/1993:

a) possibilita a realização de licitação que obedeça às condições previstas em acordos, protocolos, convenções ou tratados internacionais aprovados pelo Congresso Nacional, bem como as normas e procedimentos daquelas entidades;

b) também possibilita o uso de critério de seleção da proposta mais vantajosa para a Administração, a exemplo dos procedimentos descritos no subitem 2.21 das Diretrizes de Aquisições do Banco Mundial, consoante redação constante da versão de janeiro de 2011;

c) se forem atendidos todos os pressupostos previstos no art. 42, § 5º, da Lei 8.666/1993, a vigência do § 4º do art. 42 da mesma lei poderá ter sua aplicação afastada, caso seja incompatível com as regras estabelecidas por essas entidades.

Na prática, portanto, quando se admite as regras dos organismos internacionais o licitante estrangeiro apresenta a proposta com os encargos de transporte, entrega no Brasil inclusive com desembaraço aduaneiro; não poder-se-á acrescer na proposta o conjunto de impostos, taxas e contribuições que incidem na proposta do licitante nacional. Em outras palavras, não cabe a equalização de valores da proposta do estrangeiro, nesse caso.

5. Da conclusão

Nas licitações e contratações que envolvam recursos provenientes de empréstimo ou doação oriundos de agência oficial de cooperação estrangeira ou de organismo financeiro de que o Brasil seja parte, podem ser admitidas as normas desses organismos.

A vantagem operacional para essa conciliação está no conjunto de atos e requisitos que o § 1º inseriu no art. 1º e permitem definir com precisão e clareza, muito antes do procedimento licitatório, todos os procedimentos harmonizáveis com segurança.

*Advogado, mestre em direito público, professor de direito administrativo, escritor, consultor, conferencista e palestrante

**Advogado, diretor jurídico da Jacoby Fernandes & Reolon Advogados Associados

  • Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, advogado, mestre em direito público, professor de direito administrativo, escritor, consultor, conferencista e palestrante
    Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, advogado, mestre em direito público, professor de direito administrativo, escritor, consultor, conferencista e palestrante Foto: Divulgação
  • Murilo Queiroz Melo Jacoby Fernandes, advogado, diretor jurídico da Jacoby Fernandes & Reolon Advogados Associados
    Murilo Queiroz Melo Jacoby Fernandes, advogado, diretor jurídico da Jacoby Fernandes & Reolon Advogados Associados Foto: Divulgação
Opinião
postado em 05/12/2024 03:30
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