Visão do Direito

Jornada reduzida com salário integral: o equilíbrio entre custos e produtividade

O controle rigoroso e a fiscalização acentuada reforçam a importância do compliance trabalhista, prevenindo riscos de passivos trabalhistas

Por Luis Gustavo Nicoli* — A proposta de reduzir a jornada de trabalho sem diminuir os salários tem provocado discussões intensas sobre seus impactos nas finanças, na produtividade e no ambiente jurídico das empresas. Diminuir as horas trabalhadas enquanto se mantêm os mesmos salários implica, inicialmente, um aumento dos custos operacionais, uma vez que, para sustentar o nível de produção, pode ser necessário contratar mais funcionários ou pagar horas extras.

Esse impacto é sentido de forma mais intensa nos setores de comércio e indústria, que dependem de horários rigorosos e alta intensidade para atender à demanda. No entanto, setores baseados em metas podem se adaptar mais facilmente, desde que as atividades sejam cuidadosamente planejadas e monitoradas.

A nova legislação também propõe uma organização mais clara para o trabalho em domingos e feriados, especialmente em setores essenciais, como saúde e segurança, que operam continuamente. Cumprir essa regulamentação pode exigir das empresas a contratação de mais colaboradores ou a oferta de folgas compensatórias, o que não só assegura os direitos trabalhistas, mas também contribui para a qualidade de vida dos profissionais.

Já em setores não essenciais, a negociação entre empresas e sindicatos será fundamental para definir compensações justas para o trabalho nesses dias, com o sindicato exercendo um papel decisivo na proteção das condições de trabalho.

Para garantir a conformidade com essas novas normas, as empresas terão que revisar suas políticas internas, contratos e escalas de trabalho, além de investir em ferramentas que monitorem as horas efetivamente trabalhadas. Esse controle rigoroso e a fiscalização acentuada reforçam a importância do compliance trabalhista, prevenindo riscos de passivos trabalhistas e multas.

A redução da jornada também traz um potencial benefício: o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, o que tende a aumentar a satisfação e o engajamento dos profissionais. No entanto, em setores que exigem presença constante, essa mudança pode elevar os custos operacionais, uma vez que será necessário contratar mais pessoal para atender à demanda. O desafio reside em adaptar funções específicas sem comprometer a qualidade dos serviços prestados.

Para minimizar o aumento de custos, as empresas podem apostar na capacitação e na otimização de processos, visando manter a eficiência com menos horas de trabalho. A adoção de tecnologias, como softwares de produtividade e sistemas de automação, pode ajudar a distribuir melhor as atividades ao longo da semana. Além disso, uma negociação de metas e bonificações com sindicatos pode se revelar uma alternativa para manter a produtividade sem onerar o orçamento.

Outro aspecto crucial é o impacto que a redução da jornada pode ter na competitividade do mercado brasileiro. Empresas com menor capital ou capacidade de adaptação enfrentam mais dificuldades para se ajustar às novas exigências. Em contrapartida, setores menos intensivos e voltados para o atendimento ao cliente podem se beneficiar, pois equipes mais motivadas e engajadas costumam ser mais produtivas. A relação entre empregadores e sindicatos, por sua vez, tende a se intensificar, já que as negociações serão essenciais para adaptar as novas jornadas às especificidades de cada setor.

A necessidade de manter a produtividade com menos horas trabalhadas também deve estimular o uso de novas tecnologias. Setores industriais e logísticos, por exemplo, podem recorrer à automação para reduzir a dependência de mão de obra, enquanto áreas já voltadas para metas podem tirar proveito de ferramentas de gestão de produtividade. A tendência é que empresas invistam em soluções tecnológicas que permitam monitorar e medir resultados, garantindo uma operação eficiente, mesmo com a jornada reduzida.

Atividades de serviços e profissões criativas ou intelectuais estão entre as mais favorecidas pelo novo modelo de jornada, pois conseguem ajustar a carga horária sem comprometer a produção. Para garantir uma transição justa, o governo pode apoiar essas mudanças com incentivos fiscais e linhas de crédito, principalmente para pequenas e médias empresas. Esse suporte ajudaria as empresas a investir em automação e na requalificação de suas equipes, permitindo uma adaptação gradual e equitativa.

Assim, a redução da jornada de trabalho sem diminuição de salários é uma proposta que, apesar dos desafios, traz oportunidades promissoras. Com uma implementação cuidadosa e o apoio governamental adequado, pode-se abrir caminho para um mercado de trabalho mais equilibrado e eficiente, no qual produtividade e qualidade de vida coexistem em harmonia.

*Sócio-fundador do escritório Nicoli Sociedade de Advogados. Advogado especializado em Direito e Processo do Trabalho

 

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