Entrevista

Georges Seigneur terá gestão focada nos direitos humanos e combate ao crime organizado

Em entrevista ao Direito&Justiça, o procurador-geral de Justiça do DF elenca as prioridades do novo mandato no MPDFT

Georges Seigneur, procurador-geral de Justiça do Distrito Federal e Territórios, em seu gabinete     -  (crédito:  Ed Ferreira)
Georges Seigneur, procurador-geral de Justiça do Distrito Federal e Territórios, em seu gabinete - (crédito: Ed Ferreira)

A convite do procurador-geral da República, Paulo Gonet, será realizada em 10 de dezembro uma cerimônia de dupla posse no auditório do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). O promotor de Justiça Georges Carlos Fredderico Moreira Seigneur assume o segundo mandato no cargo de procurador-geral de Justiça do Distrito Federal, para o qual foi reconduzido pelo presidente Lula, e a presidência do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG). Para essa função, Seigneur foi eleito por aclamação pelos colegas, chefes dos MPs nos estados.

Georges Seigneur, 46 anos, é promotor de Justiça há 22 anos. Mas seu vínculo com o MP começou antes, como servidor, entre 1997 e 2002, do Ministério Público Federal. No MPDFT, antes de chegar à Procuradoria-Geral de Justiça, em 2022, foi chefe de gabinete da Procuradoria-Geral de Justiça e assessor de políticas institucionais e assessor parlamentar da Procuradoria-Geral de Justiça, cargos que exerceu nos mandatos da antecessora, Fabiana Costa.

À frente do CNPG, com mandato de um ano, Georges Seigneur pretende priorizar questões relativas a condições climáticas e o combate à criminalidade, especialmente a organizada e a cibernética. Uma das metas principais é a integração das unidades do MP para que trabalhem juntas nessas questões em que não têm fronteiras.

Nomeado em 2020 pelo então presidente Jair Bolsonaro, Seigneur figurou como primeiro colocado na eleição interna, com 276 votos de 376 eleitores, entre promotores e procuradores de Justiça. Foi a maior votação na história do MPDFT, em disputa com apenas um adversário, o promotor de Justiça Antônio Suxberger. E agora Seigneur passou também pelo crivo do presidente Lula.

No segundo mandato do MPDFT, Seigneur afirma que pretende focar nos direitos humanos e o combate à criminalidade organizada. "No DF, há ainda outros desafios que estão no nosso radar, como a saúde, a segurança pública, a educação e a eficiência dos serviços prestados à população", disse Seigneur, nesta entrevista ao Direito&Justiça.

Quais são os desafios ao assumir a presidência do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG)?

O CNPG foi criado em 1981 com a função de defender as prerrogativas institucionais do Ministério Público e trabalhar pela sua integração em todos os estados brasileiros. É um Conselho diferenciado, onde existe um forte sentimento de colaboração e comprometimento de todos os seus integrantes, que trabalham arduamente pelo aprimoramento da atuação do Ministério Público brasileiro. Tive uma participação ativa nos últimos dois anos, quando presidi os grupos de Acompanhamento Processual (GNP) e de Tecnologia da Informação (GNTI). É uma honra poder presidir o CNPG e penso que o maior desafio será fortalecer ainda mais a unidade do Ministério Público brasileiro.

Qual é a pauta principal do Conselho em 2025?

Além do fortalecimento da unidade do Ministério Público, eu posso mencionar as questões relativas a condições climáticas e o combate à criminalidade, especialmente a organizada e a cibernética. Veja que essas duas últimas demandam conhecimento altamente especializado, investimento contínuo em atualização tecnológica, além da colaboração interinstitucional. Esses são fatores essenciais para o êxito nas investigações e no combate à criminalidade. Nesse sentido, a cooperação entre os diversos ramos do MP é essencial para potencializar os recursos que possuímos e ampliar os resultados que buscamos.

Como você avaliou o processo de escolha do próximo mandato para chefe do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). Pela primeira vez, houve apenas dois concorrentes…

O que eu percebo é que em outros Ministérios Públicos, a pacificação interna, por vezes, tem levado à apresentação de candidaturas únicas ou de apenas dois concorrentes, como vimos agora pela primeira vez na história do MPDFT. É claro que a participação de mais candidatos seria muito bem-vinda, pois isso enriquece o processo eleitoral, especialmente considerando o quadro altamente qualificado que temos no MPDFT, mas eu também vejo isso como uma forma de aprovação da gestão que empreendemos. Tivemos um debate interessante no qual foram apresentadas propostas e, ao final, concluímos que elas versam sobre projetos que já estão em desenvolvimento nesta administração, o que reforça nossa convicção de que estamos no caminho certo.

Avalia que a sua votação em primeiro lugar na lista eleita pela classe e a sua nomeação para recondução pelo presidente Lula são uma avaliação de aprovação de sua gestão nos últimos dois anos?

Eu acredito na minha equipe, sei que fizemos um bom trabalho e isso foi reconhecido. Se você contabilizar os votos que recebi (276 de 376 votantes), temos uma aprovação de 74% dos membros. Tive a maior votação na história do MPDFT, no cômputo geral e nos votos únicos (160 votos). Eu também tenho alegria em dizer que recebi um apoio externo muito grande e relevante para minha nomeação. Cada voto e cada apoio recebido é um endosso ao trabalho que realizamos. O presidente da República é criterioso em suas nomeações, principalmente naquelas que refletem diretamente no bem-estar e na proteção dos cidadãos. Então, eu acredito sim, que minha nomeação não teria acontecido se não tivéssemos exercido uma boa gestão.

Quais serão as suas prioridades nos próximos dois anos?

Vamos dar seguimento aos projetos de fortalecimento institucional, o que significa primar pela aproximação com a sociedade e ampliar o conhecimento acerca das necessidades mais urgentes na proteção dos seus direitos. Temos projetos de modernização da atuação do MPDFT por meio da utilização de recursos de inteligência artificial, além de diversas frentes de atuação que precisam ser ampliadas, como os direitos humanos e o combate à criminalidade organizada. No DF, há ainda outros desafios que estão no nosso radar, como a saúde, a segurança pública, a educação e a eficiência dos serviços prestados à população.

Qual a sua avaliação sobre o recente episódio do homem que carregava bombas e acabou explodindo na Praça dos Três Poderes? O extremismo continua vivo no país?

Atos extremistas não têm espaço em um ambiente democrático, mas eu não analisaria esse ato de forma isolada. Os últimos acontecimentos são demasiadamente assustadores. A democracia é uma conquista que nos foi muito cara e que deve ser cultivada num exercício contínuo de conscientização da população, de respeito às instituições e ao resultado eleitoral. Vivemos um momento em que você tem dificuldade para acreditar no noticiário, tamanha a gravidade dos fatos. Não tenho dúvidas de que isso amplia a responsabilidade do Ministério Público e do Sistema de Justiça, mas é preciso que a sociedade se posicione. Um atentado contra o Estado Democrático de Direito deve ser punido e combatido em todas as suas vertentes, porque o êxito de um crime dessa natureza representaria o fim da liberdade de atuação, que nos é conferida pela Constituição de 88.

Como o Ministério Público pode atuar para impedir esses casos?

É missão constitucional do Ministério Público a defesa do regime democrático, devendo promover as medidas previstas no ordenamento jurídico necessárias para a sua garantia, inclusive, a ação penal, conforme as circunstâncias que o caso concreto exija. Além disso, respeitada a independência institucional, podemos atuar em conjunto com os demais poderes públicos e com as forças de segurança, a exemplo do que foi feito após o 8 de janeiro. Essa é a melhor forma de otimizar recursos, prevenir e fortalecer o combate a crimes de diversas espécies e potencializar os resultados, respeitada a independência e competências constitucionais.

A Polícia Civil do DF está criando uma unidade de combate ao terrorismo. Acredita que essa medida pode ajudar?

Sempre ajuda. Neste momento, é uma iniciativa que deve ser apoiada porque decorre de um acontecimento real. No episódio da explosão, vimos que a experiência e a tecnologia, como a utilização de robôs, salvou a vida de profissionais envolvidos na investigação. Nesse sentido, o aprimoramento das forças policiais é uma resposta necessária para garantir a segurança da capital federal, das autoridades públicas que abrigamos e dos seus moradores. O Ministério Público apoia todas as medidas que visem reprimir atos como esses, que são absolutamente inaceitáveis.

Que medidas você vai adotar para combate à corrupção?

Daremos curso a projetos inovadores e vamos fortalecer parcerias para o compartilhamento de dados e a colaboração entre instituições. Essas últimas têm sido fundamentais para o êxito em diversas investigações. Somos referência no Brasil no uso da tecnologia e na investigação de crimes cibernéticos, que envolvam criptomoedas, por exemplo. Internamente, temos a melhoria dos sistemas de informação e de inteligência, além da colaboração entre as promotorias, a fim de otimizar recursos e assegurar a melhor defesa do patrimônio público e dos interesses da sociedade.

A equipe do Gaeco continua?

Sim, se essa for a vontade da equipe. A atual composição do Gaeco apresentou excelentes resultados nos últimos anos. Para se ter uma ideia, desde que assumiram, em 2019, foram realizadas 45 operações, decorrentes de investigações exclusivas do MPDFT; 26 ações de apoio a outras instituições e sete operações conjuntas. Foram 814 mandados de busca e apreensão e prisão expedidos nesse período. Foi solicitado o bloqueio de mais de R$ 3,5 bilhões em bens. Há outros números que não divulgamos por razões estratégicas, mas eu posso dizer que eles são consistentes e resultam de um trabalho altamente comprometido.

E para combater os casos de feminicídio?

A Justiça do Distrito Federal é ágil no julgamento dos crimes de feminicídio e temos um dos maiores percentuais de condenação no país, chegando a quase 100%. O Ministério Público ofereceu 39 denúncias contra autores de feminicídios ocorridos nos anos de 2022 e 2023. Quatorze casos foram julgados, 13 autores condenados e um foi considerado inimputável, tendo medida de segurança imposta. A pena média está acima de 20 anos de reclusão, mesmo utilizando a lei antiga, que previa pena mínima de 12 e máxima de 30 anos. Recentemente, o Ministério Público do DF apresentou a primeira denúncia de feminicídio sob a vigência da nova lei, que agora prevê penas entre 20 e 40 anos de reclusão. Neste ano de 2024, registramos até outubro, 15 casos de feminicídios confirmados, com 12 autores aguardando processo presos, e um foragido. Um caso já foi julgado com a condenação dos autores e pena imposta de 28 anos de prisão. Então, é possível dizer que na esfera penal, estamos trabalhando muito bem. Porém, esse tipo de crime exige uma atuação extrajudicial voltada à prevenção, porque eles simplesmente não podem acontecer. Por mais que o sistema punitivo seja eficiente, nada pode compensar a perda de uma vida.

E como o MPDFT tem contribuído para evitar que esses casos ocorram?

Com esse foco, o MPDFT tem atuado em diversas frentes. Criamos a Comissão de Prevenção e Combate ao Feminicídio do MPDFT, que reúne integrantes de diversas áreas da Instituição; contamos atualmente com uma estrutura de 51 promotorias que têm atuação direta ou indiretamente no combate à violência contra a mulher, além do Núcleo de Direitos Humanos, que foi reforçado na minha gestão. Por mais que atuemos, não há descanso em relação a essa temática porque esse tipo de crime ocorre dentro de casa, muitas vezes, em razão do relaxamento de medidas protetivas a pedido da própria vítima. É uma cultura que precisamos mudar, com mais esclarecimento, informação e amparo do Poder Público.

Quais são os seus planos para o futuro?

Meus planos envolvem muito trabalho, com foco no atendimento às necessidades da população do Distrito Federal quanto à proteção dos seus direitos e ao exercício pleno da cidadania. Vejo uma grande oportunidade, à frente do CNPG, de contribuir para o aprimoramento do Ministério Público como um todo e trazer para o Distrito Federal a experiência exitosa de outros estados. O MPDFT já é uma grande referência no Brasil. Estamos entre os mais premiados no Conselho Nacional do Ministério Público, estamos em primeiro lugar no ranking de transparência do MP, somos precursores do MP Digital, entre outras conquistas. Diante disso, eu só posso dizer que o meu plano é trabalhar para que alcancemos resultados ainda melhores nos próximos dois anos.

 


  • Reunião do Conselho Nacional de Procuradores-gerais (CNPG), na Procuradoria-geral da República em que Georges Seigneur foi eleito presidente
    Reunião do Conselho Nacional de Procuradores-gerais (CNPG), na Procuradoria-geral da República em que Georges Seigneur foi eleito presidente Foto: Ed Ferreira/CB/D.A Press
  • Reunião do Conselho Nacional de Procuradores-gerais (CNPG), na Procuradoria-geral da República em que Georges Seigneur foi eleito presidente
    Reunião do Conselho Nacional de Procuradores-gerais (CNPG), na Procuradoria-geral da República em que Georges Seigneur foi eleito presidente Foto: ED FERREIRA
  • Georges Seigneur ao lado do procurador-geral da República, Paulo Gonet
    Georges Seigneur ao lado do procurador-geral da República, Paulo Gonet Foto: ED FERREIRA
postado em 28/11/2024 04:01
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