Visão do direito

STJ equilibra proteção do bem de família com cumprimento de obrigações contratuais

O colegiado esclareceu que as regras de impenhorabilidade não são absolutas

Por Anna Carolina Dias Esteves* — A Terceira Turma do Superior Tribunalde Justiça (STJ) decidiu que a exceção à impenhorabilidade do bem de família,conforme o artigo 3º, inciso II, da Lei 8.009/1990, é aplicável em casos de dívida contraída para a reforma do próprio imóvel.

O colegiado esclareceu que as regras de impenhorabilidade não são absolutas. No caso em questão, foi ajuizada uma ação de cobrança por serviços de reforma e decoração em um imóvel, que foi penhorado durante a fase de cumprimento de sentença.

O juízo de primeira instância rejeitou a impugnação à penhora apresentada pela proprietária, alegando a falta de provas de que o imóvel seria um bem de família. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) confirmou a decisão, considerando que a situação se enquadrava nas exceções previstas na Lei 8.009/1990.

No recurso especial apresentado ao STJ, a proprietária argumentou que o imóvel penhorado, onde reside há mais de18 anos, é um bem de família. Ela defendeu que as exceções legais devem ser interpretadas de forma restritiva, a fim de proteger a dignidade humana e o direito à moradia.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, afirmou que a dívida relacionada a serviços de reforma residencial, visando melhorias no imóvel, enquadra-se como exceção à impenhorabilidade dobem de família. A ministra ressaltou que uma das intenções do legislador ao estabelecer essas exceções foi evitar que o devedor utilizasse a proteção da residência familiar para fugir das obrigações assumidas na aquisição, construção ou reforma do próprio imóvel.

Nancy Andrighi reconheceu que, por restringirem à ampla proteção dada ao imóvel familiar, as exceções devem ser interpretadas de forma restritiva. No entanto, segundo ela, "isso não significa que o julgador, no exercício de interpretação do texto, fique restrito à letra da lei".

A relatora explicou que as turmas que compõem a seção de direito privado do STJ entendem que a exceção à impenhorabilidade também se aplica a contratos de empreitada para viabilizar a edificação do imóvel residencial. "Não seria razoável admitir que o devedor celebrasse contrato para reforma do imóvel, com o fim de implementar melhorias em seu bem de família, sem a devida contrapartida ao responsável pela sua implementação", declarou.

A decisão da Terceira Turma do STJ reafirma a importância de equilibrar a proteção ao bem de família com a necessidade de cumprimento das obrigações contratuais, especialmente em casos de reformas que visam melhorar o imóvel. A interpretação do Tribunal ressalta que, embora a impenhorabilidade seja uma garantia fundamental para a dignidade e moradia, ela não deve ser utilizada para evitar o pagamento de dívidas legítimas contraídas para o próprio benefício da residência familiar.

Dessa forma, a jurisprudência busca proteger tanto o direito à moradia quanto os interesses dos credores, garantindo que as obrigações assumidas sejam devidamente honradas.

*Advogada das áreas cível e resolução de conflitos da Innocenti Advogados

 

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