Por Karina Camilo Lopes* e Barbara Pommê Gama* — O primeiro semestre de 2024 trouxe um aumento significativo nos pedidos de recuperação judicial de grandes empresas no Brasil, como Polishop, Subway e Casa do Pão de Queijo. Isso levantou questionamentos sobre as causas e desafios envolvidos nesse cenário complexo. Um dos principais estimulantes desse aumento é o prolongado impacto econômico da pandemia de covid-19. As altas taxas de juros também resultam em um aumento nos custos de empréstimos das empresas, principalmente nas já endividadas, o que prejudica a continuidade sustentável dos negócios.
As mudanças na política econômica e o surgimento de regulamentações mais rigorosas afetam negativamente o ambiente de negócios. Por outro lado, as recentes alterações legislativas, que trazem alguns benefícios aos recuperandos, estimulam as empresas que já se encontram em estado crítico, a buscarem ajuda judicial.
Um dos principais desafios que as empresas enfrentam durante o processo de recuperação judicial é a falta de liquidez, que impossibilita a aprovação de financiamentos bancários, dificulta a continuidade das operações, e o cumprimento das obrigações durante o processo. A pressão dos credores também interfere no processo de recuperação judicial, já que nesse momento eles ficam mais atentos ao cumprimento dos acordos e, consequentemente, pressionam por pagamentos e mudanças nos planos de reestruturação, visando à quitação da dívida.
A regularização fiscal é outro aspecto crucial do processo. Antigamente, em razão de jurisprudência solidificada do STJ, as empresas prosseguiam com o processo de recuperação judicial desconsiderando os débitos tributários. Atualmente, após a publicação de lei federal e muitas leis estaduais prevendo formas de regularização de débito tributário por meio de transação, o Judiciário tem, paulatinamente, exigido que as recuperandas apresentem certidão de regularidade fiscal ou, ao menos, indiquem como pretendem regularizar os seus passivos.
A transação tributária é medida de negociação direta com o Fisco para estabelecer plano de pagamento individual que se adeque à realidade financeira e fiscal de cada contribuinte. O objetivo é que sejam quitados os débitos pendentes, garantindo a regularidade perante a Fazenda, sem prejudicar o bom andamento do processo de recuperação ou os credores privados e preservando o Erário público.
Essas negociações, tanto com órgãos públicos quanto com os credores privados são complexas e demoradas, exigindo cuidado meticuloso ao longo de todo o processo de recuperação. Grandes empresas, como Casa do Pão de Queijo, Subway e Polishop enfrentando processos de recuperação judicial, geralmente, apresentam algumas particularidades e especificidades em seus casos. O mais relevante é, sem dúvidas, o impacto na imagem da marca. Elas são conhecidas em todo o país, e a notícia de que estão "quebradas" é verdadeira surpresa para o público em geral, o que pode impactar diretamente em suas vendas. Isso porque, o processo de recuperação judicial pode afetar a percepção dos consumidores e dos parceiros comerciais, por essa razão uma gestão de crise é fundamental.
No Brasil, mudanças significativas na legislação de recuperação judicial nos últimos anos também influenciaram diretamente o aumento nos pedidos de recuperação judicial. A Lei 14.112/2020 (Nova Lei de Falências) introduziu o financiamento ao devedor em recuperação judicial, permitindo que empresas em dificuldades obtenham crédito de forma mais acessível e segura durante o processo de recuperação.
Essas alterações legislativas têm como objetivo principal criar um ambiente mais favorável e atraente para a recuperação de empresas em dificuldades financeiras, incentivando a manutenção das atividades econômicas e a preservação de empregos, além da continuidade do negócio.
É esperado que os pedidos de recuperação judicial no segundo semestre de 2024 continuem, inclusive, por parte de empresas renomadas. Esse cenário é impulsionado pela persistente instabilidade econômica no país, fortalecida pelos novos benefícios legislativos voltados para empresas em processo de recuperação.
*Karina é formada pelas Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), pós-graduada em advocacia tributária e gestão tributária
*Bárbara é sócia do Dalazen, Pessoa & Bresciani, formada pela Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas, especialista em direito tributário