Execução penal

CNJ aponta que menos de 5% dos presos não retornam após saidinha

Os dados colhidos pelo CNJ entre 2021 e 2023 e divulgados nesta semana foram levantados pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF)

Estudo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) concluiu que o fim das saídas temporárias instituído pela Lei 14.843/2024 sob o argumento de que grande parte dos presos não retorna ao sistema e comete novos crimes não está de acordo com a realidade. O trabalho foi realizado pela Corregedoria Nacional de Justiça.

Os dados colhidos pelo CNJ entre 2021 e 2023 e divulgados nesta semana foram levantados pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF). Em suma, indicam que menos de menos de 5% das pessoas não retornam às unidades prisionais. Também apontam que as ocorrências criminais, durante o período em que os presos estavam fora, não sofrem alteração significativa.

Em 2023, dos 86.858 beneficiados em saídas temporárias, 3.635 não retornaram ao sistema, o que representa 4,2%. O mesmo percentual foi registrado em 2022. Foram 97.280 liberações, com 4.086 pessoas que deixaram de voltar. Em 2021, dos 99.702 apenados que tiveram autorização para ir para casa em saidinhas 3.888 fugiram. Corresponde a 3,9%. A tabela foi construída a partir do Sistema do Departamento Penitenciário e dos dados fornecidos pela Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo, projetadas para todo o país.

Para os técnicos e magistrados responsáveis pelo levantamento, os números são irrisórios diante dos benefícios que as saídas temporárias podem provocar na ressocialização de condenados. "Conclui-se, portanto, a contrario sensu, que entre 96,1% e 95,8% do total de pessoas retorna às unidades prisionais após uma saída temporária", afirmam os responsáveis pelo relatório.

Em relação ao aumento da criminalidade, o CNJ apontou divergências em relação aos argumentos dos defensores da Lei 14.843/2024, que restringiu as saidinhas. O relatório do CNJ ressalta que a análise "não encontrou relação estatisticamente significativa entre as saídas temporárias e o total de flagrantes registrados nas delegacias de polícia durante o período".

Nessa análise, foi considerado o período de 1º de janeiro de 2023 e 20 de junho de 2024, em que houve sete saídas temporárias — sem contar a do Natal — em 76 semanas. O levantamento indicou que a média de flagrantes nas semanas sem saidinha foi de 1.323,2, enquanto nos períodos em que os apenados estavam nas ruas foi de 1300,2.

Os números de boletins de ocorrência em São Paulo também não demonstraram aumento dos crimes. A partir da consulta às informações disponibilizadas no site da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo foi realizada uma comparação. Sem saída temporária, a média foi de 23.306 e, nas semanas com saída, a média foi de 23.321. Esse levantamento considerou o período de 1º de janeiro de 2022 e 30 de abril de 2024, em que houve nove liberações em 120 semanas.

O estudo conclui: Juridicamente, a redução das oportunidades de reconstrução e fortalecimento das relações familiares e comunitárias de pessoas em cumprimento de pena vai de encontro ao objetivo de "proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado" (artigo 1º da Lei de Execuções Penais) e acaba por fazer aumentar a pressão dentro dos estabelecimentos prisionais, incrementando a deterioração de um sistema que opera em modo de violação estrutural de direitos fundamentais, como reconhecido pelo STF de forma contundente no julgamento da ADPF 347".

A ação de descumprimento de preceito fundamental 347, com julgamento concluído pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em setembro, reconheceu, a violação massiva de direitos fundamentais no sistema prisional brasileiro. Os ministros deram prazo de seis meses para que o governo federal elabore um plano de intervenção para resolver a situação, com diretrizes para reduzir a superlotação dos presídios, o número de presos provisórios e a permanência em regime mais severo ou por tempo superior ao da pena.

O Congresso, majoritariamente, tem posição diferente do CNJ. A Lei 13.964/2019 proibiu as saídas temporárias das pessoas em cumprimento depena por crime hediondo que tenha levado à morte, o que está previsto no artigo 122. No primeiro semestre, os congressistas aprovaram a Lei 14.843/2024 que alterou as hipóteses de liberação de presos. O presidente Lula vetou parcialmente e teve sua posição derrubada pelo Congresso.

A Lei passou a prever uma única hipótese de saída temporária (a "frequência a curso supletivo profissionalizante, bem como de instrução do 2º grau ou superior, na ccmarca do Juízo dacExecução"), excluindo as possibilidades de visitas à família e a frequência a outras atividades que possibilitem o retorno ao convívio social.

O Supremo vai decidir a questão. Em ação ajuizada, a OAB sustenta que é inconstitucional o trecho da norma que extingue o direito da saída temporária aos presos do regime semiaberto, que não tenham cometido crimes graves ou hediondos, para visitas à família. Há uma outra ação sobre o tema, proposta pela Associação Nacional da Advocacia Criminal (Anacrim).

Ao julgar habeas corpus impetrado por um preso que teve o direito suspenso, o ministro André Mendonça considerou que quem já cumpre pena não pode ser atingido pela nova lei, uma vez que uma medida mais gravosa não pode ser usada para prejudicar o acusado.

 


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