Por Rodrigo Dias* e Leonardo Morais de Araújo Pinheiro* — A preservação de espaços públicos, como a orla do Lago Paranoá, transcende meras questões de urbanismo, situando-se no coração da democracia e do direito de todos à cidade. A possibilidade de usufruir livremente de tais áreas reflete o direito fundamental de acesso aos bens naturais, além de promover a inclusão social e a igualdade. A atual discussão sobre a Lei Distrital 7.323, de 18 de outubro de 2023, e sua tentativa de restringir este acesso, destaca a importância vital de manter nossos espaços públicos verdadeiramente públicos e acessíveis a todos.
De iniciativa do governador Ibaneis Rocha e agora sob escrutínio judicial por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) proposta pelo PSB-DF, esta lei busca permitir a ocupação privativa da orla do Lago Paranoá por proprietários de imóveis adjacentes à orla e aos becos dos lagos Sul e Norte, por meio da concessão de direito real de uso (espécie de contrato com a administração pública que permite o uso privativo de bens públicos por particulares). Tal medida não apenas cerceia o acesso público ao lago, mas também levanta sérias questões sobre a legalidade e a constitucionalidade do processo legislativo assim como do próprio conteúdo da lei.
O processo de criação da Lei 7.323/2023 já é, em si, motivo de preocupação, pois viola diretamente a Lei Orgânica do Distrito Federal (LODF) ao dispensar a exigência de uma lei complementar para assuntos de uso e ocupação do solo e ao negligenciar a obrigatoriedade de participação popular em sua formulação. Essas falhas processuais não apenas subvertem os procedimentos democráticos, mas também enfraquecem a legitimidade da própria lei.
Além disso, o texto da lei padece de outros graves vícios de inconstitucionalidade, como a violação ao princípio da impessoalidade, dado que se mostra como um instrumento violador do interesse público ao permitir com que se retorne ao estado de coisas em que os donos das "pontas de picolés" tinham a beira do lago (bem público) como se fossem propriedades suas.
Acaba por servir como forma dissimulada de privatização de um bem de uso comum do povo, que, portanto, não deve ser objeto de fruição exclusiva por particulares, conforme estabelece o Código Civil e a própria LODF.
O posicionamento do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), a favor da ADI proposta pelo PSB-DF, reforça a necessidade de revogação dessa legislação, em defesa do meio ambiente, da legalidade e, acima de tudo, do direito ao espaço público.
A questão em pauta transcende o Lago Paranoá, abordando a essência do que significa viver em uma sociedade que valoriza a democracia, a igualdade e a sustentabilidade. A defesa da Orla Livre é uma luta por um espaço democrático, onde todos têm o direito de desfrutar das belezas e dos recursos que nossa cidade tem a oferecer, livre de barreiras artificiais que beneficiam poucos em detrimento de muitos. À medida que o julgamento segue, é essencial que a voz do povo seja ouvida, reiterando a demanda por uma orla livre, democrática e acessível a todos.
*Por Rodrigo Dias — Presidente do PSB/DF
*Leonardo Morais de Araújo Pinheiro — Secretário jurídico do PSB/DF
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