Ao tomar posse como ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski ressaltou, em seu discurso, que sentia orgulho de ter sido convidado para integrar o governo Lula e participar de "um projeto de país". Essa foi uma declaração pública explícita da identidade que o magistrado sempre demonstrou com o presidente que o nomeou ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2006.
Com tantos problemas na área de segurança pública no país, com milícias, tráfico de drogas e domínio de organizações criminosas na Amazônia e em várias cidades, como o Rio de Janeiro, onde Lewandowski nasceu, e São Paulo, onde fez carreira na magistratura, assumir uma pasta desse porte era um desafio e tanto para o ministro que se aposentou em maio, aos 75 anos. Mas Lewandowski disse, a interlocutores, que, se fosse convidado, não diria "não" ao presidente da República. E assim foi.
A primeira crise na pasta foi justamente envolvendo organizações criminosas: a fuga de detentos na penitenciária federal de segurança máxima de Mossoró (RN). Para analistas políticos, Lewandowski terá muitas crises pela frente, mas é um ministro que não se demite. Tem prestígio e respeito do presidente para permanecer no cargo com liberdade de atuação.
O ministro Ricardo Lewandowski sempre julgou com um viés à esquerda. Um dos episódios mais marcantes dos 17 anos da trajetória do ministro do STF foi o julgamento do mensalão. O magistrado foi voz vencida como oponente do relator, Joaquim Barbosa, e dos demais ministros que, por maioria, condenaram 24 dos 38 réus por crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
Nesses julgamentos — em que estava em discussão a relação do primeiro governo Lula com a classe política —, Lewandowski, o revisor da ação penal 470, condenou Delúbio Soares, mas absolveu dois dos petistas mais ilustres, José Genoino e José Dirceu, da acusação de corrupção. Denunciado como o mentor do esquema de corrupção e compra de votos no Congresso, Dirceu teve em Lewandowski um defensor.
O ministro sustentou que a Procuradoria-geral da República não reuniu elementos contra Dirceu, apenas "suposições" e sequer descreveu "ainda que minimamente" as condutas delituosas que teriam sido praticadas pelo ex-ministro-chefe da Casa Civil. "Restringiu-se a fazer meras suposições. São imputações muito mais políticas do que só estritamente jurídicas", disse Lewandowski, à época.
Também partiu de Lewandowski uma medida que manteve a elegibilidade de Dilma Rousseff durante o processo de impeachment em 2016. Presidente do STF à época, ele coordenou o julgamento no Senado e permitiu que senadores votassem de forma separada as penas da petista. Os parlamentares puderam decretar a perda do cargo e manter a habilitação de Dilma para o exercício de funções públicas por oito anos. Assim, Dilma perdeu a presidência, mas ficou liberada para concorrer novamente às eleições.
Lewandowski também foi um duro opositor da Operação Lava-Jato. Votou contra a prisão após condenação em segunda instância, mas, mais uma vez, foi vencido à época. Se essa posição tivesse prevalecido, Lula jamais teria sido preso. No auge das denúncias, as decisões foram impopulares, mas mais à frente o STF mudou o entendimento sobre prisões sem condenação definitiva, o que permitiu a liberação de Lula, da prisão. O ministro também votou contra a manutenção do processo de Lula em Curitiba e pela suspeição do juiz Sergio Moro. Hoje, muitas das posições de Lewandowski são aplaudidas pelos colegas.
Lewandowski construiu a carreira jurídica em São Paulo. Foi desembargador do Tribunal de Justiça do estado, depois de iniciar a trajetória como advogado em São Bernardo do Campo, berço político de Lula. Também em São Paulo, ele estudou, fez mestrado e dourado e tornou-se professor de direito da USP, considerada a melhor do país. Nos Estados Unidos, obteve o título de Master of Arts, na área de Relações Internacionais, pela Fletcher School of Law and Diplomacy, da Tufts University, administrada em cooperação com a Harvard University.
Como presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Lewandowski foi o idealizador das audiências de custódia para que todos os presos sejam levados à frente de um juiz em até 24 horas para avaliação das condições dessa custódia. A medida foi considerada uma forma de reduzir o encarceramento no país. Um dos processos sob a sua relatoria também envolveu uma questão relacionada ao sistema prisional: o que concedeu habeas corpus coletivo para a liberação de todas as presas grávidas e mães de crianças de até 12 anos que não tenham cometido crimes violentos.
Entre os inúmeros processos que relatou, alguns são de grande destaque, como o de cotas raciais no ensino público em que o STF decidiu pela constitucionalidade do sistema de reserva de vagas nas universidades públicas com base em critério étnico-racial e para estudantes egressos do ensino público.
Lewandowski também relatou a proibição do nepotismo, no qual o Supremo decidiu que a contratação de parentes de autoridades para o exercício de cargos públicos viola a Constituição. Por proposta do ministro, foi editada a Súmula Vinculante nº 13, que veda a contratação de familiares em qualquer órgão público da União, estados, municípios e Distrito Federal.
Outro voto importante em defesa da moralidade pública envolveu a Lei da Ficha Limpa. O ministro era presidente do Tribunal Superior Eleitoral quando votou a favor da inelegibilidade pelo período de oito anos para políticos condenados.
Ao se aposentar, Lewandowski disse a interlocutores que gostaria de lecionar e advogar. Mas esses planos serão adiados. O ministro preferiu entrar no olho do furacão para participar do projeto de governo do presidente Lula.
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