Cientistas do Albert Einstein College of Medicine, nos Estados Unidos, revelaram em uma pesquisa, os impactos de longo prazo da covid-19 nos níveis de colesterol e triglicérides. O trabalho, que analisou dados de mais de 200 mil adultos, mostrou que a pandemia levou a um aumento de 29% no risco de dislipidemia, uma condição caracterizada por níveis anormais de lipídios no sangue. Esse problema aumenta o risco para doenças cardiovasculares graves, como infartos e acidentes vasculares cerebrais. Os resultados foram publicados, ontem, no Journal of Clinical Investigation.
Gaetano Santulli, autor principal do estudo e professor associado na Einstein, destacou que essas descobertas têm grandes implicações. Ele recomendou que as pessoas monitorem regularmente os níveis de lipídios. Segundo Santulli esse conselho se aplica amplamente, já que uma grande parcela da população foi infectada pela covid-19, mesmo quem não teve um diagnóstico formal.
Pesquisas anteriores da equipe de Santulli também indicaram que a doença infecciosa aumentou a probabilidade de desenvolvimento de hipertensão e diabetes tipo 2, com riscos que persistiram até três anos após o início da pandemia. No novo trabalho, os pesquisadores compararam as taxas de dislipidemia entre participantes em Nápoles, Itália, durante os três anos anteriores e posteriores à pandemia, excluindo cuidadosamente aqueles com diagnósticos prévios ou em uso de medicamentos específicos.
Os resultados mostraram um aumento médio de 29% no risco de dislipidemia em todo o grupo estudado, sendo a elevação ainda mais acentuada entre indivíduos com mais de 65 anos e aqueles com condições crônicas, como diabetes e obesidade. Diferente de ensaios anteriores que utilizaram grupos de controle variados, a nova pesquisa acompanhou a mesma população ao longo do tempo, o que, segundo os cientistas, fortalece os resultados.
Conforme os autores, os mecanismos ligados ao aumento do risco de dislipidemia ainda não estão claros, embora uma hipótese sugira que o vírus SARS-CoV-2 possa prejudicar a função das células endoteliais, essenciais para a regulação lipídica. Além disso, um estudo recente associou a covid-19 a riscos elevados de eventos cardiovasculares por até três anos após a infecção, reforçando ainda mais a necessidade de um manejo eficaz da dislipidemia para mitigar esses riscos. Agora, a equipe de estudo investiga as conexões entre a doença infecciosa e a síndrome cardiovascular-rim-metabólica — condição que envolve doenças cardíacas, problemas renais, diabetes e obesidade, todos ligados à disfunção endotelial.
João Lindolfo Borges, endocrinologista e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, detalha que a covid-19 desencadeia uma resposta inflamatória intensa no organismo, chamada de "tempestade de citocinas". Segundo o especialista, "citocinas pró-inflamatórias são liberadas em grandes quantidades durante a infecção, promovendo inflamação sistêmica. Essa inflamação contínua pode impactar o metabolismo lipídico, prejudicando o transporte, a síntese e a degradação de lipídios, o que, a longo prazo, contribui para a formação de placas ateroscleróticas e aumento dos níveis de colesterol total e LDL."
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Mudanças de hábito
A covid-19 aumentou o risco de uma série de distúrbios metabólicos, especialmente doenças cardiovasculares. Podemos atribuir parte desse efeito à pandemia, que levou a mudanças nos hábitos. Grande parte da população precisou ficar reclusa em casa, o que resultou em uma redução da atividade física. A alimentação também mudou; muitas pessoas apresentaram um ganho de peso significativo, aumentando as taxas de obesidade e de excesso de peso de modo geral. Observamos um aumento expressivo de doenças como hipertensão arterial, diabetes e dislipidemia, todas associadas ao ganho de peso, à alimentação inadequada e ao sedentarismo. O estresse também pode ter contribuído para o surgimento de doenças mentais, como transtornos de ansiedade e depressão.
Fernando Valente, endocrinologista da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo