Longevidade

Pesquisadores buscam nas células de centenários a resposta para a longevidade

Pesquisadores buscam, em células de pessoas com mais de 100 anos, pistas sobre a longevidade extrema. Uma das descobertas é o perfil imunológico único, que permite a elas lutar com sucesso contra infecções

Há cerca de 722 mil idosos com mais de 100 anos no mundo, de acordo com a ONU  -  (crédito: Wikimedia Commons/Divulgação )
Há cerca de 722 mil idosos com mais de 100 anos no mundo, de acordo com a ONU - (crédito: Wikimedia Commons/Divulgação )

Em todo o mundo, vivem, hoje, 722 mil centenários, segundo as projeções da Organização das Nações Unidas (ONU) para 2024. Essas pessoas oferecem uma oportunidade única para estudos sobre a longevidade. Agora, pesquisadores da Universidade de Boston, nos Estados Unidos, criaram uma biblioteca de células-tronco pluripotentes induzidas (iPSCs) de indivíduos com mais de 100 anos e seus descendentes. Eles esperam que o material ajude na pesquisa sobre doenças associadas ao envelhecimento, como câncer, Alzheimer e condições cardiovasculares. 

As iPSCs podem se diferenciar em qualquer tipo de célula, com a vantagem de serem cultivadas indefinidamente. "Ao criar células-tronco centenárias, esperamos decifrar como esses indivíduos retardam ou evitam doenças relacionadas à idade, além de desenvolver e/ou validar terapêuticas nessa mesma capacidade", explicou Todd Dowrey, primeiro autor de um artigo sobre o catálogo, publicado na revista Aging Cell. "Essa pesquisa fornece um recurso exclusivo que pode ser usado para entender melhor os mecanismos por trás da resiliência centenária e ajudar outros a maximizar seus anos saudáveis de vida."

Os cientistas obtiveram e caracterizaram mais de 100 amostras de sangue periférico de centenários e descendentes. A equipe analisou como a expressão gênica é regulada em relógios de envelhecimento molecular para comparar e contrastar diferenças entre a idade biológica e cronológica nessas pessoas. 

Diferença

Ao estudar as amostras, os pesquisadores descobriram que centenários e seus descendentes eram biologicamente muito mais jovens. Alguns apresentaram até duas décadas de diferença na idade biológica versus a cronológica.

Segundo os cientistas, a pesquisa destaca a conexão crescente entre a medicina regenerativa e a biologia do envelhecimento. "Ao aproveitar nossa capacidade de estudar a resiliência centenária em laboratório, esperamos desbloquear um roteiro detalhado para uma vida saudável, resistência a doenças e longevidade", explicou, em nota, o autor correspondente George J. Murphy, professor associado de medicina na Universidade de Boston. 

Histórico

Também na Universidade de Boston, um estudo descobriu que os centenários abrigam uma composição e atividade de tipos distintos de células imunológicas. Os sistemas de defesa dos superidosos são altamente funcionais e se adaptaram com sucesso a um histórico de doenças, conferindo a eles uma longevidade excepcional. 

Essas células imunológicas podem ajudar a identificar mecanismos importantes para tratamento de doenças e promover a longevidade. "Nossos dados apoiam a hipótese de que centenários têm fatores de proteção que permitem a recuperação de doenças e a velhice extrema", disse a autora principal do estudo, Tanya Karagiannis. Segundo a pesquisadora, esse é o maior conjunto de dados de células únicas de centenários. 

Para identificar padrões imunoespecíficos de envelhecimento e longevidade humana extrema, os pesquisadores apostaram em uma técnica de sequenciamento genético. Depois, usaram inteligência artificial para avaliar como a composição celular e a atividade mudam em função da idade. 

A análise confirma observações feitas em estudos anteriores sobre envelhecimento e identifica novas mudanças exclusivas dos centenários, que refletem a resposta imunológica. "Os perfis imunológicos que observamos nos centenários confirmam um longo histórico de exposição e dão suporte à hipótese de que os centenários são enriquecidos por fatores de proteção que aumentam sua capacidade de recuperação de infecções", disse a autora sênior Paola Sebastiani, Ph.D, diretora do Centro de Métodos Quantitativos e Ciência de Dados.

Os pesquisadores acreditam que as descobertas podem ajudar no estudo dos mecanismos de resiliência imunológica que provavelmente contribuem para a longevidade extrema, como um alvo para terapêuticas de envelhecimento saudável. "Os centenários e sua longevidade excepcional fornecem um 'modelo' de como podemos viver de forma mais produtiva e saudável. Esperamos continuar a aprender tudo o que pudermos sobre resiliência contra doenças e a extensão do período de saúde de uma pessoa", disse Sebastiani.

PALAVRA DE ESPECIALISTA

Foco na prevenção

"O banco de células da Universidade de Boston é um primeiro passo para traçar o perfil genético de centenários, com resultados promissores. A pesquisa sobre os centenários nos mostra que é possível envelhecer com qualidade, mas é fundamental procurar um médico para fazer checkups, avaliar as taxas hormonais e outros indicadores, para que, quando necessário, se façam as reposições e tratamentos adequados. A chave para um envelhecimento saudável começa muito antes da chegada à terceira idade. Os cuidados preventivos, como a avaliação de níveis hormonais e a adoção de hábitos saudáveis, fazem toda a diferença no decorrer do processo de envelhecimento. Identificar precocemente possíveis deficiências é um passo crucial para garantir uma longevidade com qualidade de vida."

Cynthia Abdalla, médica especialista em prevenção e envelhecimento saudável

Estudo preliminar aponta potencial em composto dietético

Pesquisadores da Universidade de Sevilha, na Espanha, e da Universidade de Kent, no Reino Unido, descobriram que o carotenoide fitoeno, grupo de compostos presentes em plantas e animais, aumenta a vida útil e pode retardar o início da paralisia associada à formação de placas amiloides em um modelo de doença de Alzheimer. O estudo está na fase laboratorial e foi realizado no nematoide Caenorhabditis elegans. 

Especificamente, foram observados aumentos na longevidade entre 10 e 18,6% e diminuições no efeito tóxico das placas entre 30 e 40%. Na pesquisa, a fonte do carotenoide foram microalgas. “Esses são resultados preliminares muito animadores, por isso estamos buscando financiamento para continuar a pesquisa e descobrir por quais mecanismos esses efeitos são produzidos”, comentou Paula Mapelli Brahm, pesquisadora da Universidade de Sevilha. 

Modelo

A cientista explica que o Caenorhabditis elegans é um modelo animal amplamente utilizado em biomedicina. O nematoide foi fundamental em descobertas importantes reconhecidas com o Prêmio Nobel, como morte celular programada, interferência de RNA e aplicações da proteína GFP.

A equipe do professor Antonio Jesús Meléndez Martínez passou 15 anos estudando o fitoeno, que é encontrado em alimentos como tomate, cenoura, damasco, pimentão vermelho, laranja, tangerina e maracujá, entre outros. É um composto absorvido eficientemente e encontrado em muitos tecidos, incluindo a pele, onde estudos indicam que pode proteger contra a radiação ultravioleta.

A equipe trabalha na produção sustentável de alimentos saudáveis para reduzir o risco de doenças, com ênfase nas aplicações de carotenoides em agroalimentação, nutrição e cosméticos. Nessa área, eles coordenaram redes internacionais nas quais participaram pesquisadores de mais de 50 países.

postado em 05/11/2024 05:00
x