longevidade

Dieta pode desacelerar envelhecimento, afirmam pesquisadores

Consumo de alimentos antioxidantes e anti-inflamatórios e redução da ingestão de açúcar rejuvenesceram células, comprovam cientistas em dois estudos independentes

O acréscimo de açúcar é comum em produtos industrializados, como biscoitos, bolos, sobremesas e refrigerantes, e está associado a alterações na expressão dos genes -  (crédito: Reprodução/Freepik)
O acréscimo de açúcar é comum em produtos industrializados, como biscoitos, bolos, sobremesas e refrigerantes, e está associado a alterações na expressão dos genes - (crédito: Reprodução/Freepik)

O segredo da longevidade pode estar dentro do prato, sugerem dois estudos independentes publicados ontem. As pesquisas avaliaram o impacto da alimentação em biomarcadores associados ao rejuvenescimento celular e observaram mudanças no chamado "relógio epigenético" — sequências específicas do DNA cujas alterações por fatores externos, como a dieta, estão diretamente associadas à idade biológica. 

Na revista Jama, da Associação Médica Norte-Americana, pesquisadores da Universidade da Califórnia, em San Francisco, constataram que uma dieta rica em vitaminas e minerais promove uma idade biológica celular mais jovem do que a cronológica. O efeito foi particularmente forte no caso de a alimentação incluir pouco açúcar adicionado — o acréscimo desse ingrediente é comum em produtos industrializados, como biscoitos, bolos, sobremesas, refrigerantes, sucos e pratos prontos, entre outros. 

Com um exame bioquímico, os cientistas descobriram que quanto mais saudável a alimentação, mais jovens as células se tornam. Por outro lado, para cada grama de açúcar adicionado consumido, há um aumento na idade epigenética. Segundo os autores, esse é um dos primeiros estudos a mostrar uma associação entre o acréscimo do ingrediente ao envelhecimento dos genes, e o primeiro a estudar essa relação em um grupo heterogêneo de mulheres, incluindo 342 negras e brancas, com idade média de 39 anos. 

Registro

As participantes relataram consumir cerca de 61,5g de açúcar adicionado diariamente, mas a variação foi grande: enquanto algumas ingeriam 2,7g, outras chegavam a 316g. Para se ter uma ideia, uma barra de chocolate ao leite tem, em média, 25g do ingrediente, e uma lata de Coca-Cola tem 39g. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que o consumo não ultrapasse 10% da energia total consumida; ou seja, em uma dieta de 2 mil calorias, o máximo deve ser 50g (de cinco a 10 colheres de chá). 

Todos os dias, as participantes faziam um registro do que comiam. Com esses dados, os pesquisadores compararam a dieta das mulheres com seu relógio epigenético, informação obtida com amostras da saliva. O padrão alimentar foi pontuado conforme a proximidade com o estilo mediterrâneo, que se caracteriza por ingestão de alimentos anti-inflamatórios e antioxidantes, reduzindo o risco de doenças crônicas. 

Por fim, com as informações da alimentação e marcadores celulares, os cientistas calcularam o que chamaram de índice de nutrientes epigenéticos: aqueles associados a processos antioxidantes, anti-inflamatórios e de reparo do DNA. Entre eles, as vitaminas A, C, B12 e E, folato, selênio, magnésio, fibras e isoflavonas. 

Mediterrânea

Quanto mais aproximada do estilo mediterrâneo das participantes, menor a idade epigenética medida nas amostras de saliva. Porém, mesmo com uma alimentação saudável, quanto maior o consumo de açúcar, mais acelerado o envelhecimento biológico, observaram. 

Segundo a coautora sênior Elissa Epel, professora da Universidade da Califórnia, em San Francisco, o estudo ajuda a compreender o grau de prejuízo à saúde do açúcar adicionado aos alimentos."Sabíamos que altos níveis de açúcares adicionados estão ligados à piora da saúde metabólica e doenças precoces, possivelmente mais do que qualquer outro fator alimentar", diz Epel. "Agora, sabemos que o envelhecimento epigenético acelerado está subjacente a essa relação, e essa é provavelmente uma das maneiras pelas quais a ingestão excessiva de açúcar limita a longevidade saudável."

Em nota, Barbara Laraia, professora do câmpus de Berkeley da Universidade da Califórnia e coautora do artigo, destaca que, como os padrões epigenéticos são reversíveis, eliminar 10g de açúcar adicionado por dia pode regredir o relógio biológico de dois a quatro meses, ganho que se sustentaria ao longo do tempo. "Focar em alimentos ricos em nutrientes essenciais e pobres em açúcares adicionados pode ser uma nova maneira de ajudar a motivar as pessoas a comer bem para a longevidade."

Priscila Abiko, geriatra do Hospital Edmundo Vasconcelos, em São Paulo, diz que, embora pareçam clichês, alguns hábitos são, de fato, essenciais para uma vida longa, incluindo a alimentação. "Evite industrializados, alimentos gordurosos e com muito açúcar, e não se esqueça que pão, macarrão, bolacha, entre outros carboidratos, se transformam em açúcar dentro do organismo por mais que sejam salgados", lembra. 

 

Cardápio vegano associado à reparação do DNA

Na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, um estudo com 21 pares de gêmeos idênticos indicou que a alimentação sem ingredientes de origem animal reduz a idade biológica. Para isso, os cientistas avaliaram os níveis de metilação do DNA — modificações que, embora não alterem o código genético, interferem na expressão dos genes, ligando ou desligando as proteínas. 

Anteriormente, estudos relataram que níveis elevados de metilação do DNA estão associados ao envelhecimento. Essas modificações, chamadas de epigenéticas, são influenciadas por fatores externos, como alimentação, tabagismo, álcool, poluição e exposição à radiação, entre outros. 

Na pesquisa atual, publicada na revista BMC Medicine, os pesquisadores Varun Dwaraka e Christopher Gardner avaliaram os efeitos moleculares da dieta vegana e da onívora em curto prazo. Durante oito semanas, cada gêmeo do par foi submetido a um tipo de alimentação: puramente à base de vegetais ou composta por carne (170g a 225g), um ovo e uma porção e meia de laticínios por dia. Setenta e sete por cento dos participantes eram mulheres, com idade média de 40 anos e índice de massa corporal de 26. 

Metilação 

Nas primeiras quatro semanas, os participantes comeram refeições preparadas para eles e, nas demais, os gêmeos foram responsáveis por cozinhar, após receber aulas de nutrição. Os autores coletaram amostras de sangue no início, na metade e no fim do estudo para medir os níveis de metilação do DNA e calcular as idades biológicas dos voluntários. 

Entre os que seguiram a dieta vegana, foi observada a redução nos "relógios epigenéticos", indicando um rejuvenescimento celular. Esse efeito foi medido no coração, hormônio, fígado e sistemas inflamatório e metabólico. Já os seguidores da alimentação onívora não tiveram os mesmos benefícios. 

Cautela

"O mais impressionante é que o ritmo do envelhecimento, que calcula a rapidez com que a idade biológica de uma pessoa avança em relação à sua idade cronológica, diminuiu em cerca de 0,03 unidade", comenta Varun Dwaraka. "Isso sugere que, para cada ano que esses indivíduos envelhecem, seus corpos envelhecem um pouco menos do que eles normalmente esperariam."

Porém, os cientistas ressaltam que ainda não está claro o quanto das diferenças observadas entre os participantes pode ser atribuído às dietas. Como os gêmeos do grupo vegano perderam, em média, 2kg nas quatro primeiras semanas do estudo, é possível que os ganhos biológicos estejam associados ao emagrecimento.

Marcella Garcez, nutróloga e membro da diretoria da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), também lembra que nem toda alimentação vegana é saudável, pois muitos produtos industrializados à base de plantas, especialmente as "carnes" vegetais, são ultraprocessados. Ou seja, contêm corantes, aromatizantes, conservantes e aditivos. "Isso faz com que não sejam tão saudáveis quanto os alimentos in natura, podendo, dependendo da composição, aumentar o risco de alguns problemas de saúde, como obesidade, colesterol e doenças cardiovasculares", alerta. (Paloma Oliveto)

 

 

 

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postado em 30/07/2024 06:00
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