Um novo relatório da Organização Meteorológica Mundial alerta que há uma probabilidade de 80% de a temperatura média global dos próximos quatro anos ultrapassar 1,5ºC em relação aos níveis pré-industriais. Esse é o limite máximo que deveria ser atingido em 2100, segundo o Acordo de Paris. Contudo, embora o dado seja preocupante, o organismo da ONU afirma que o aumento é temporário e não configura uma violação permanente da meta firmada na capital francesa em 2015.
A divulgação coincide com um discurso do Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, sobre o Dia Internacional do Meio Ambiente. O líder pediu a proibição da publicidade do petróleo, gás e carvão — principais causas do aquecimento global. "Exorto todos os países a proibirem a publicidade de empresas de combustíveis fósseis, assim como a de outros produtos que prejudicam a saúde, como o tabaco", declarou António Guterres. "Na questão do clima, não somos os dinossauros. Somos o meteorito. Não estamos apenas em perigo. Somos o perigo."
Às vésperas da reunião do G-7 na Itália, entre 13 e 15 de junho, o dirigente da ONU aproveitou para cobrar dos governos ações climáticas mais ambiciosas. "Estamos jogando roleta russa com o nosso planeta. A batalha para limitar o aumento da temperatura a 1,5ºC será vencida ou perdida na década de 2020 — sob a vigilância dos líderes de hoje." Prevista para iniciar dia 13, também está próxima a Conferência Climática de Bonn, na Alemanha, um preparatório para a COP29, que será realizada no fim do ano no Azerbaijão.
O relatório da OMM prevê que a temperatura média global na superfície entre 2024 e 2028 seja entre 1,1°C e 1,9°C superior à linha de base de 1850-1900. O documento também afirma que é provável (86%) que pelo menos um deses anos estabeleça um novo recorde de temperatura, superando 2023, que é atualmente o mais quente da história.
Estatísticas
Segundo o serviço meteorológico Copernicus, da União Europeia, maio bateu mais um recorde de calor, completando 12 meses consecutivos de aumento da temperatura. Entre junho de 2023 e o mês passado, a média global ficou em 1,63ºC acima do registrado entre 1850-1900.
"Por trás dessas estatísticas, está a triste realidade de que estamos muito longe de cumprir as metas estabelecidas no Acordo de Paris", disse o secretário-geral adjunto da OMM, Ko Barrett, em um comunicado à imprensa.
"Temos urgentemente de fazer mais para reduzir as emissões de gases de efeito de estufa, ou pagaremos um preço cada vez mais elevado em termos de biliões de dólares em custos econômicos, milhões de vidas afetadas por condições meteorológicas mais extremas e danos extensos ao ambiente e à biodiversidade", acrescentou Barrett no mesmo documento.
No Acordo de Paris, os signatários se comprometeram a manter a temperatura média global da superfície a longo prazo abaixo dos 2°C — acima dos níveis pré-industriais e em prosseguir esforços para limitá-la a 1,5°C até ao fim do século. A comunidade científica tem alertado repetidamente que um aquecimento superior a 1,5°C poderá desencadear impactos muito mais graves das alterações climáticas.
A temperatura global do ano passado foi impulsionada por um forte El Niño. Uma nova atualização da OMM prevê a chegada da La Niña e um regresso a condições mais frias no Pacífico tropical no curto prazo. Porém, o organismo alerta que os recordes de calor esperados para os próximos cinco anos refletem o aquecimento contínuo causado pelos gases com efeito de estufa.
"Vivemos em tempos sem precedentes, mas também temos competências sem precedentes na monitorização do clima e isso pode ajudar a direcionar nossas ações", acredita Carlo Buontempo, diretor do serviço Coperincus para Mudanças Climáticas. "Uma série de meses mais quentes será lembrada como comparativamente fria, mas se conseguirmos estabilizar as concentrações de gases com efeito de estufa na atmosfera num futuro muito próximo, poderemos regressar a essas temperaturas 'frias' até o fim do século."
Ineficiência
Um grupo internacional de cientistas afirma, em um artigo publicado na revista Environmental Research Letters, que a compreensão limitada dos processos básicos oceânicos impede o progresso de remoção de CO2 marinho, com abordagens “prematuras e equivocadas” sendo anunciadas com frequência. No artigo, os pesquisadores analisam a eficácia climática de quatro técnicas baseadas na natureza que utilizam processos biológicos marinhos.
As técnicas incluem o cultivo de moluscos e de algas marinhas, o carbono azul costeiro (utilizando a restauração de ervas marinhas, pântanos salgados e florestas de mangais), e o aumento das populações de baleias.
Porém, o grupo de cientistas, da Universidade de East Anglia (UEA), da Universidade da Tasmânia e do Instituto para o Desenvolvimento Sustentável e Relações Internacional, concluem que, embora as atividades sejam “altamente valiosas pelos seus benefícios não climáticos”, não fornecem uma contribuição significativa para a remoção de dióxido de carbono, e “correm o risco de serem becos sem saída” em termos de mitigação climática significativa.
Lacunas
“Os proponentes desses métodos têm uma compreensão incompleta ou incorreta não apenas de como funciona o ciclo do carbono nos oceanos, mas também da enorme expansão necessária para fornecer benefícios climáticos significativos”, disse, em nota, o coautor Phil Williamson, professor associado honorário UEA, no Reino Unido. “Mal-entendidos e lacunas de conhecimento afetam a credibilidade dos esquemas de compensação de carbono.”
Para o autor principal, Philip Boyd, do Instituto de Estudos Marinhos e Antárticos da Universidade da Tasmânia, os benefícios dessas ações são modestos. “Aqueles que defendem essas abordagens deram atenção insuficiente ao funcionamento dos ecossistemas e o ciclo do carbono dos oceanos, ignorando, por exemplo, os muitos processos que devolvem CO2 à atmosfera, bem como os desafios da implementação a uma escala climaticamente significativa.” Para ele, “há necessidade de uma melhor comunicação dos critérios básicos para a viabilidade da remoção de dióxido de carbono utilizando processos marinhos”.
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