Eles estão em toda parte: brinquedos, cosméticos, roupas, móveis e, até no solo, e na água de beber. Invisíveis, compostos sintéticos de origem industrial estão associados a diversos riscos à saúde. Agora, um estudo realizado em seis países europeus sugere que a exposição pré-natal a uma combinação desses produtos está relacionada à pior saúde metabólica de crianças, que, na idade adulta, podem desenvolver uma síndrome que inclui obesidade abdominal, hipertensão e resistência à insulina.
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Os autores, do Instituto de Saúde Global de Barcelona (ISGlobal), concentraram-se em 45 substâncias conhecidas por serem disruptores ou desreguladores endócrinos — compostos que podem interferir no funcionamento do sistema hormonal, no crescimento, no equilíbrio energético e no metabolismo. Por serem praticamente onipresentes, é quase impossível não ter contato com eles.
Pesquisas anteriores já demonstraram uma ligação entre a exposição individual a alguns desses compostos durante a fase pré-natal e o risco elevado de obesidade e hipertensão arterial. Agora, os cientistas decidiram avaliar o impacto combinado das substâncias no conjunto que caracteriza a síndrome metabólica. Para isso, avaliaram dados de 1.134 mães e seus filhos, moradores de Espanha, França, Grécia, Lituânia, Noruega e Reino Unido, todos voluntários de um grande estudo epidemiológico.
Gerações futuras
Em termos práticos, essas conclusões sublinham a importância de reduzir a exposição a desreguladores endócrinos durante a gravidez e a necessidade de fornecer informações padronizadas para a sua mitigação. Atualmente, embora as mulheres grávidas sejam frequentemente aconselhadas a evitar alimentos, como queijo não pasteurizado ou crus para minimizar o risco de contaminação microbiológica, existe uma falta de consciência sobre a exposição a desreguladores endócrinos, como o BPA em alimentos enlatados, ou os parabenos, utilizados como conservantes em produtos de cuidados pessoais e higiene. Contudo, a responsabilidade não deve ser atribuída apenas à população; é essencial que sejam implementadas políticas e regulamentações de saúde pública mais rigorosas para salvaguardar a saúde metabólica das gerações futuras.
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Eternos
A exposição pré-natal a 45 disruptores endócrinos foi analisada por meio da avaliação do sangue e da urina coletados das mães durante a gravidez ou do cordão umbilical, após o nascimento. Depois, quando as crianças tinham entre 6 e 11 anos, foi realizado um acompanhamento, incluindo exame clínico, entrevista e coleta de amostras biológicas. Assim, os pesquisadores reuniram dados sobre circunferência da cintura, pressão arterial, colesterol, triglicerídeos e níveis de insulina, agregados para obter um índice de risco para síndrome metabólica.
A análise estatística mostrou que misturas de metais, substâncias perfluoroalquiladas e polifluoroalquiladas (Pfas), pesticidas organoclorados e retardadores de chama estavam associados a um maior risco de síndrome metabólica. No caso dos primeiros, a relação observada deveu-se principalmente ao efeito do mercúrio, cuja principal fonte é a ingestão de peixes.
Os Pfas são uma das famílias de compostos químicos mais utilizadas, aplicados em pesticidas, tintas, panelas antiaderentes ou embalagens de lanchonetes, entre muitos outros. Devido à sua persistência, são conhecidos como "produtos químicos eternos". Os pesticidas organoclorados — banidos dos Estados Unidos e da Europa, mas ainda em uso no Brasil — também ficam no ambiente por tempo indeterminado.
"Observamos também que as associações eram mais fortes nas meninas para misturas de Pfas e bifenilos policlorados (PCB), enquanto os rapazes eram mais suscetíveis à exposição aos parabenos", especifica Nuria Güil Oumrait, pesquisadora do ISGlobal e primeira autora do estudo. Segundo a cientista, como os disruptores endócrinos interferem com os hormônios sexuais esteroides, as diferenças estão dentro do que seria esperado.
Em nota, Martine Vrijheid, codiretora do programa Meio Ambiente e Saúde do ISGlobal e autora sênior do estudo, diz que a principal mensagem da pesquisa é que a exposição a misturas generalizadas de disruptores endócrinos na gravidez pode aumentar o risco de síndrome metabólica tanto em meninos quanto em meninas, quando adultos.
Outras doenças
"Um conjunto bem estabelecido de pesquisas científicas indica que os produtos químicos desreguladores ou disruptores endócrinos que fazem parte da nossa vida diária estão nos tornando mais suscetíveis a distúrbios reprodutivos, câncer, diabetes, obesidade, doenças cardíacas e outras condições graves de saúde", destaca Andrea C. Gore, pesquisadora da Universidade do Texas em Austin, que não participou do estudo. "Esses produtos químicos representam riscos particularmente graves para mulheres grávidas e crianças", diz Gore, integrante do conselho da Sociedade de Endocrinologia dos Estados Unidos.
O médico especialista em reprodução humana Rodrigo Rosa, diretor clínico da Clínica Mater Prime, em São Paulo, lembra que um estudo anterior já demonstrou risco de compostos de fenol para a saúde reprodutiva. "Os produtos químicos presentes em itens de consumo podem afetar os hormônios da tireoide, o que pode ter consequências para a saúde reprodutiva e dificultar a concepção de um bebê."
Rosa alerta que, como esses produtos estão presentes também em conservantes de alimentos, o ideal é investir em uma dieta o mais natural possível. Ainda assim, alguns cuidados são importantes. "Mesmo com o consumo de alimentos in natura, devemos lembrar aquela recomendação de lavar frutas e legumes por causa dos produtos químicos que podem ter sido pulverizados sobre eles. Os disruptores endócrinos também estão presentes no material usado para revestir o interior das latas de alimentos, bem como nas embalagens plásticas de alimentos."