Pesquisadores exploraram a vulnerabilidade das células do câncer de mama, desenvolvendo um tratamento inovador que combina um anticorpo específico para tumores com um medicamento citotóxico, visando destruir carcinomas difíceis de tratar. A descoberta foi publicada, ontem, na revista Clinical Cancer Research por uma equipe do King's College London. O novo método é particularmente promissor para o câncer de mama triplo negativo, uma forma agressiva e resistente à quimioterapia que afeta principalmente mulheres abaixo dos 40 anos e constitui 15% dos diagnósticos.
O tratamento tradicional para o câncer de mama triplo negativo geralmente envolve cirurgia, quimioterapia e radioterapia, mas muitos tumores conseguem escapar dos medicamentos e voltar a se espalhar. Os cientistas do King's College London realizaram análises detalhadas de mais de 6 mil amostras desse tipo de carcinoma para investigar as características das células tumorais associadas a esses cânceres agressivos e resistentes.
Para a equipe, a maior dificuldade na criação da abordagem foi superar a semelhança estrutural entre diferentes proteínas do ciclo celular, o que torna a identificação de inibidores específicos muito complicada. "Esses inibidores do ciclo celular, quando administrados sozinhos, mostraram toxicidade para tecidos normais em testes clínicos, limitando seu potencial terapêutico. Uma abordagem de direcionamento das células tumorais para esses inibidores é uma oportunidade de direcionar medicamentos tóxicos mais para as células cancerosas", frisaram os autores.
A equipe analisou a expressão de proteínas tanto na superfície quanto no interior das células tumorais para entender como elas escapam dos tratamentos. Descobriram a presença do marcador de superfície celular EGFR e moléculas CDK, que promovem a divisão e proliferação celular. Com isso, a equipe relacionou o cetuximab, um anticorpo que se liga à proteína EGFR, a um bloqueador de CDK para criar um tratamento personalizado.
Como o conjugado anticorpo-fármaco tem como alvo específico as células tumorais, é possível administrar uma dose de inibidor mais baixa do que o habitual, o que significa uma menor toxicidade para o paciente.
Ana Carolina Salles, oncologista clínica especialista em tumores femininos da Rede D'or, detalha que as drogas conjugadas no cenário metastático do câncer de mama têm resultados excepcionais. "O anticorpo consegue se ligar à célula cancerígena e entregar uma quantidade de quimioterapia maior dentro dessa célula, aumentando a eficácia e diminuindo o efeito adverso. Falando de um tratamento que consideramos crônico, é essencial ter uma preocupação com qualidade de vida."
João Nunes, oncologista da Oncoclínicas Brasília e especialista em tumores femininos, considera a invenção um avanço. "Sempre foi um desafio, em outros tumores de mama conhecemos proteínas na superfície e dentro da célula que ela mesma usa para se multiplicar. Se bloqueamos essa proteína com um anticorpo, a célula perde essa capacidade. Se ligamos uma medicação nesse anticorpo, podemos, além de bloquear a multiplicação, destruir a célula tumoral, como um míssil direcionado."
O grupo trabalha agora para investigar a terapia em diferentes modelos e tipos de câncer. "Também avaliaremos inibidores de próxima geração que são mais específicos e potentes contra as células cancerosas. Nosso objetivo é desenvolver novos conjugados anticorpo-fármaco que sejam mais estáveis na circulação sanguínea e com maior captação tumoral."
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