Empatia, medo da covid-19, apoio às medidas de segurança e confiança no governo foram os principais motivos que levaram os cidadãos ao redor do mundo a utilizarem os métodos de proteção durante a pandemia. A afirmação se baseia em um estudo realizado por pesquisadores de 34 países, incluindo o Brasil — que apresentou índices de empatia acima da média das outras nações. Os resultados da pesquisa foram publicados na última sexta-feira (15/12) no periódico científico Communications Psychology.
Os cientistas analisaram um conjunto de dados coletados em 2021 por meio de formulários aplicados a 12.758 pessoas, em 34 países. Os entrevistados deveriam dizer por quais motivos estavam (ou não) adotando as medidas de segurança contra a covid-19. Quatro fatores psicológicos foram analisados separadamente em cada país, e foram-lhe atribuídos valores para baixa, média e alta influência na população.
Brasil: caso singular
Os pesquisadores esperavam que, em nações com baixa confiança no governo, as pessoas sentiriam maior incerteza e, portanto, sua cooperação teria como base sentimentos individualistas, como o medo da doença. Em países com alta confiança no governo, os cidadãos se sentiriam mais seguros em nível individual. Logo, a escolha por adotar as medidas de segurança remeteria ao cuidado coletivo ao despertar sentimentos como a empatia.
No geral, as hipóteses foram confirmadas, mas não sem exceções, como o Brasil. No país, uma parte das pessoas responderam como esperado, ao agir por medo (aspecto individual), uma vez que existia baixa taxa de confiança no governo. No entanto, a empatia (aspecto coletivo) foi fator-chave para a manutenção das medidas de proteção, como aconteceu em países com alta confiança no governo, embora não fosse o caso.
"No Brasil, o governo optou por assumir comunicação de baixa severidade de risco e também um desacordo com o consenso científico internacional, que orientava pelo princípio da precaução. Minha hipótese é de que a opção do Estado de não fazer política também é interpretada pela população como um sinal de alerta, e isso se expressou nas muitas manifestações de solidariedade, especialmente em espaços sociais de fragilidade econômica", comenta Rubia Carla Giordani, professora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPR e um das autoras do artigo, em entrevista ao Correio.
O povo brasileiro é empático?
A empatia depende de fatores internos ao indivíduo, como a sobrevivência da espécie, e externos, tais quais cultura e senso de pertencimento ao grupo.
Fábio Aurélio Leite, psiquiatra do Hospital Santa Lúcia Norte, em Brasília, explica que o meio social é essencial para o sentimento empático. "A empatia é como se fosse uma extensão do indivíduo, que faz para o outro o que gostaria que fosse feito para si mesmo. Algumas pessoas possuem prazer maior em fazer bem para os outros, mas normalmente elas estão inseridas em contextos que as pessoas são estimuladas a se ajudar", expõe.
Para Fábio e Rúbia, os brasileiros são, sim, um povo empático — ou pelo menos foram durante a pandemia. "Em populações vulnerabilizadas, a empatia e a solidariedade são fortalecidas em tempos de crise e adversidades, como foi na pandemia. É um recurso intrínseco humano que traz a agregação social para a sobrevivência e a manutenção da espécie, como diz Milene Zanoni, especialista em saúde mental que também participou da pesquisa", afirma Rúbia.
"O que o estudo mostra é que, apesar das dificuldades, o Brasil é um país naturalmente empático, independente do governo. É uma descoberta interessante", complementa o psiquiatra Fábio Aurélio Leite.
Resultados
Confira a seguir as nações que se destacaram em cada uma das variantes psicológicas analisadas pelo estudo.
Empatia (preocupação social empática)- entre 1 (baixa influência) e 7 (alta influência)
- Brasil = 6;
- Filipinas = 6;
- Portugal = 5,98;
- México = 5,81;
- Chipre = 5,77.
Apoio às medidas de contenção contra a covid - entre 1 (baixa influência) e 5 (alta influência)
- Índia = 4,53;
- Filipinas = 4,46;
- Portugal = 4,35;
- Peru = 4,32;
- Bangladesh, Brasil e México = 4,3.
Medo da covid - entre 1 (baixa influência) e 5 (alta influência)
- Filipinas = 3,31;
- Bangladesh = 3,21;
- Índia e Vietnã = 3,04;
- Peru = 3,03;
- Brasil = 2,97.
Confiança individual no governo - entre 1 (baixa influência) e 5 (alta influência)
- Vietnã = 3,6;
- Singapura = 3,49;
- Índia = 3,42;
- Nova Zelândia = 3,14;
- Paquistão = 3,12.