Passada a fase de promessas e discursos de líderes mundiais e a menos de uma semana para o encerramento dos debates, os negociadores se debruçaram sobre o mais espinhoso tema da 28º Conferência do Clima (COP28), em Dubai, nos Emirados Árabes. No início, foi publicado o primeiro rascunho dos trabalhos sobre o balanço global de carbono, processo que discute o progresso coletivo em direção à meta do Acordo de Paris, de limitar o aquecimento global a 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais.
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O texto de 24 páginas, um dos blocos construtores da declaração final, traz três opções sobre combustíveis fósseis: uma "eliminação ordenada e justa" de petróleo, gás natural e carvão; "esforços acelerados para a eliminação progressiva", com emissões líquidas zero em 2050; ou simplesmente não tocar no assunto. A segunda opção é a mais alinhada com as evidências científicas, que vinculam a meta de Paris ao fim da dependência energética de hidrocarbonetos. Porém, enfrenta forte resistência dos principais produtores e emissores de gases de efeito estufa.
Países como China, Estados Unidos, Índia, Rússia e Arábia Saudita não simpatizam com o termo eliminação (phase out), preferindo redução gradual (phase down), e é sobre esse verbo que os negociadores trabalharão nos próximos dias. Na sexta-feira, os diplomatas saem das mesas e dão lugar aos ministros. A declaração final da COP28 é esperada para o dia 12, mas pode se estender um pouco mais.
O ministro saudita da Energia, Abdulaziz bin Salman, disse que é contra a redução do uso de petróleo. "Gostaria de apresentar o desafio a que saem publicamente dizendo que temos que acabar com o uso dos combustíveis (fósseis). Eu apresento os nomes e números dos telefones, liguem para eles e perguntem como vão fazer isso", afirmou, em uma entrevista.
Polêmica
Já o anfitrião da COP28, sétimo maior produtor de petróleo, praticamente se viu forçado a defender a substituição dos combustíveis fósseis. O presidente da conferência e também CEO da petrolífera nacional dos Emirados Árabes, sultão Al Jaber, teve um vídeo vazado pelo jornal The Guardian, no qual negava a existência de evidências científicas associando a redução dos hidrocarbonetos e a meta de Paris, e acabou convocando uma coletiva de imprensa para afirmar que houve um "mal entendido". Ele afirmou que já disse "várias vezes que a redução e a eliminação dos combustíveis fósseis é inevitável. De fato, é essencial".
Os dois verbos — reduzir e eliminar — entraram em cena no Acordo de Paris, de 2015. Enquanto a Arábia Saudita é contra ambas as expressões, a União Europeia tem um posicionamento considerado fraco por cientistas climáticos — é favorável ao abandono de combustíveis fósseis "inabaláveis", ou seja, petróleo, carvão e gás queimados sem tecnologias de captura das emissões. Em uma declaração conjunta recente, Estados Unidos e China sugerem um novo texto: "Acelerar a substituição de carvão, petróleo e gás". Os dois países são os maiores produtores de gases de efeito estufa.
Enquanto os negociadores costuram os termos do rascunho, cientistas alertam para a urgência na tomada de decisões ambiciosas. Segundo os climatologistas do Project Global Carbon, as emissões de combustíveis fósseis aumentaram 1,1% em 2022, contribuindo para que, já em 2030, o mundo esteja 1,5ºC mais quente que no século 19.
A Climate Action Tracker, iniciativa que monitora o cumprimento das metas de Paris, destacou em um relatório que o ritmo atual das medidas dos signatários coloca a Terra na trajetória de um aquecimento de 2,1ºC até o fim do século. Mesmo no cenário mais otimista, em que todos os países cumpririam 100% das promessas apresentadas à ONU, o cálculo ultrapassa o do acordo firmando na França: 1,8ºC em 2100.
"Dois anos depois da COP de Glasgow (Escócia), nosso relatório é praticamente o mesmo. Você pensaria que os eventos extremos em todo o mundo estariam desencadeando ações, mas os governos parecem alheios", comentou, em uma coletiva de imprensa on-line, Clarie Stockwell, analista de políticas da Climatic Analytics e principal autora do relatório.
Niklas Höhne, professor do NewClimate Institute, na Alemanha, criticou países que defendem tecnologias de captura de carbono, em vez de investirem na eliminação dos combustíveis fósseis. "Os governos devem parar de tentar adotar soluções falsas como captura e armazenamento de carbono — isso é simplesmente a indústria de combustíveis fósseis tentando estender sua vida, quando precisa enfrentar a realidade da eliminação progressiva dos combustíveis fósseis."
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