Nove em 10 fumantes começam com o hábito antes dos 18 anos, e, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a indústria desenvolve um marketing agressivo com foco nos mais jovens, usando, especialmente, os chamados vapers. Nesta terça-feira (26/09), em Genebra, o organismo das Nações Unidas lançou dois documentos com diretrizes para banir produtos à base de tabaco do ambiente escolar. No Brasil, a Lei Federal 9.294/96 proíbe o fumo em locais coletivos fechados. Além disso, legislações estaduais e do Distrito Federal são específicas quanto ao impedimento do uso de cigarro em escolas.
"Seja sentado na sala de aula, jogando ao ar livre ou esperando no ponto do ônibus escolar, devemos proteger os jovens do fumo passivo mortal e das emissões tóxicas dos cigarros eletrônicos, bem como dos anúncios que promovem esses produtos", disse, no lançamento, Ruediger Krech, diretor de Promoção da Saúde da OMS. Segundo as publicações da organização, um estudo em 50 países revelou que 10% dos estudantes de 13 a 15 anos já foram abordados por representantes da indústria do tabaco com a oferta de cigarro gratuito.
Nos documentos, a OMS demonstra preocupação com a abordagem dos futuros consumidores em potencial. Cigarros eletrônicos ou vapers são vendidos em embalagens atraentes, com estampas de personagens do mundo infantil, como ursos de pelúcia, além de conterem aromatizantes de bala e chiclete, por exemplo. O organismo da ONU destaca que um número crescente de pesquisas tem se concentrado nos efeitos maléficos do tabaco não só para estruturas como pulmões, mas no cérebro em desenvolvimento. Hoje, sabe-se que o órgão só se consolida após os 25 anos.
Um desses estudos foi divulgado no mês passado, na revista Nature Communications, e mostrou que o tabaco reduz a massa cinzenta de adolescentes. Os pesquisadores, das universidades de Cambridge e Warwick, no Reino Unido, e de Fudan, na China, descobriram que, em média, jovens que começaram a fumar com 14 anos apresentavam uma redução significativa em uma área do lobo frontal associada à tomada de decisões e à quebra de regras.
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A matéria cinzenta é o tecido cerebral que processa informações e contém todos os neurônios do órgão. O pico é atingido na adolescência, antes do desenvolvimento completo do cérebro, explica Trevor Robbins, coautor sênior do artigo e pesquisador do Departamento de Psicologia de Cambridge. Segundo o cientista, a perda da massa nessa região parece acelerar somente depois que se começa a fumar. O estudo foi realizado com 800 pessoas de 14 a 23 anos.
"O córtex pré-frontal ventromedial é uma região-chave para a produção de dopamina, a substância química do prazer do cérebro. Além de desempenhar um papel em experiências gratificantes, há muito se acredita que a dopamina afeta o autocontrole", destaca Robbins. "Menos massa cinzenta nessa região do cérebro pode limitar a função cognitiva, levando a um menor autocontrole e a uma propensão para comportamentos de risco, como fumar."
Educação
As publicações lançadas, ontem, em Genebra destacam que a Convenção-Quadro da OMS "reconhece que as evidências científicas estabeleceram, inequivocamente, que a exposição à fumaça do tabaco causa morte, doença e incapacidade". Segundo o artigo 8º do documento, "a proibição de fumar em ambientes é a única medida eficaz baseada na ciência para proteger a população dos efeitos nocivos da exposição ao fumo passivo".
As escolas também devem enfatizar intervenções de cessação do tabagismo, diz a agência da ONU. "Evidências mostram que muitos fumantes querem deixar de fumar para proteger a sua saúde. Muitos adolescentes e adultos usuários de nicotina e tabaco estão ansiosos para parar, mas têm medo de tentar por causa de tentativas anteriores malsucedidas. Eles não acreditam que podem superar os sintomas de abstinência e não se sentem apoiados", diz uma das publicações.
Um estudo canadense publicado no American Journal of Public Health constatou, entre 300 adolescentes, um paradoxo: aqueles que começam a fumar por volta de 12 anos aumentam o consumo de tabaco ao mesmo tempo em que fazem várias tentativas de parar, sem sucesso. Ao longo de dois anos de acompanhamento, mais de 70% dos participantes queriam abandonar o vício, mas só 19% conseguiram. Segundo os autores, é preciso identificar os períodos críticos que as crianças estão mais abertas às intervenções educacionais e apostar no que chamam de "pequena janela de oportunidades" antes que a dependência se instale.
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