Câncer

Ter mais condicionamento físico é associado a menor risco de câncer

Relação é observada por cientistas suecos ao analisar dados de 1 milhão de jovens ao longo de 33 anos. A queda na vulnerabilidade varia de 5% a 42%, sendo a maior proteção contra o câncer de pulmão

Atividades como corrida e ciclismo estão entre as ligadas à proteção contra cânceres  -  (crédito: WILLIAM WEST)
Atividades como corrida e ciclismo estão entre as ligadas à proteção contra cânceres - (crédito: WILLIAM WEST)
Isabella Almeida
postado em 16/08/2023 06:00

Manter em dia o condicionamento físico ajuda a combater e prevenir diversas doenças, como hipertensão e obesidade. Agora, cientistas da Universidade de Gotemburgo, na Suécia, descobriram que o hábito pode ter mais uma vantagem: auxiliar na prevenção contra cânceres. Conforme o estudo — publicado, nesta terça-feira (15/08), na revista British Journal of Sports Medicine —, ter uma boa aptidão cardiorrespiratória quando se é jovem está associada a um risco até 42% menor de desenvolver nove tipos de tumores malignos mais tarde na vida. Entre eles, de intestino e de pulmão.

Segundo o artigo, a aptidão cardiorrespiratória está relacionada à capacidade de uma pessoa de fazer exercícios aeróbicos, como correr, nadar e andar de bicicleta, e até mesmo atividades cotidianas mais intensas, subir escadas, por exemplo, por períodos mais longos. Apesar de se saber que essa característica está associada a riscos menores de certos tipos de câncer, poucos estudos grandes e de longo prazo foram publicados antes do ensaio descrito no British Journal.

Para o trabalho, os cientistas utilizaram dados de suecos disponibilizados até o fim de 2019. O material cobria informações médicas de recrutas que iniciaram o serviço militar no país, entre 1968 e 2005. Ao ingressarem na força quando tinham entre 16 e 25 anos, os militares foram submetidos a uma bateria padrão de avaliações. Altura, peso, índice de massa corpórea (IMC), pressão arterial, força muscular e aptidão cardiorrespiratória fizeram parte dos dados colhidos.

A análise incluiu mais de 1 milhão de homens, dos quais 84.117 (7%) desenvolveram câncer em pelo menos uma parte do corpo durante um período médio de monitoramento de 33 anos. Dos participantes, 365.874 participantes mostravam baixo nível de aptidão cardiorrespiratória, 519.652 tinham nível moderado, e 340.952, alto.

Considerando o baixo nível de condicionamento físico no recrutamento, uma maior aptidão cardiorrespiratória foi associada a menor vulnerabilidade de surgimento de tipos específicos de tumor maligno: câncer de pulmão (42%), de fígado (40%), no esôfago (39%), no estômago (21%), renal (20%), de cabeça e pescoço (19%), no intestino (18%), no pâncreas (12%) e no reto (5%).

"Esse estudo mostra que uma maior aptidão em homens jovens saudáveis está associada a um menor risco de desenvolver nove de 18 cânceres específicos, com as taxas de risco clinicamente mais relevantes no trato gastrointestinal", enfatizam os autores do artigo. "Esses resultados podem ser usados na formulação de políticas de saúde pública, fortalecendo o incentivo para a promoção de intervenções voltadas para o aumento da aptidão cardiorrespiratória na juventude", indicam.

Renata Costa Cangussú, oncologista e membro da Sociedade Brasileira de Oncologia (SBO), sublinha que a capacidade cardiorrespiratória reduz o risco de câncer de várias maneiras. "Primeiro, exercícios regulares e um bom condicionamento físico podem ajudar a controlar o peso corporal, que é importante, pois o excesso de peso está relacionado ao maior risco de pelo menos 18 tipos de câncer. Além disso, a atividade física frequente ajuda a reduzir a inflamação crônica no corpo, fatores contribuintes para o desenvolvimento da doença."

Ainda conforme a especialista, a aptidão física também melhora a circulação sanguínea e a oxigenação dos tecidos, que auxiliam no reparo celular e no funcionamento adequado do sistema imunológico, responsável por identificar e destruir células cancerígenas em estágios iniciais. "Então, a capacidade cardiorrespiratória obtida mediante atividade física regular contribui para um ambiente corporal menos propício ao desenvolvimento das células cancerígenas e também ajuda a fortalecer as defesas naturais do organismo contra o câncer", enfatiza.

Rastreamento

No entanto, os pesquisadores relatam que uma maior aptidão cardiorrespiratória também foi associada a um risco aumentado de 7% de câncer de próstata, e chances elevadas em 31% de ocorrência de tumor na pele. A forma de rastreamento das duas doenças pode explicar esses fenômenos, sugerem.

Gisah Guilgen, oncologista e associada da SBO, fortalece a hipótese para o risco de câncer de pele. "Esses pacientes, provavelmente, estiveram mais expostos à luz solar, fizeram atividades físicas externas, corrida, bicicleta, remo", lista. "Muitas vezes, as pessoas, principalmente os homens, não se protegem adequadamente. Então, é sempre bom lembrar que, ao fazer atividade física externa, tem que se proteger do Sol, que é um fator cancerígeno."

Em relação aos índices aumentados de câncer de próstata, uma das causas pode estar ligada à quantidade de consultas médicas. "Talvez, os pacientes que tenham mais aptidão cardiorrespiratória iam ao médico com mais frequência. Essa poderia ser uma hipótese. Não vejo como o fato de fazer mais atividade física possa levar a um câncer de próstata", cogita Guilgen.

Apesar dos resultados encontrados, os especialistas sublinham que se trata de uma observação de associação entre aptidão física e cânceres, não de causa e efeito. Outro limitador é a falta de dados sobre mais fatores de risco, como dieta, consumo de álcool e tabagismo. Além disso, a equipe não pôde acompanhar as mudanças na aptidão cardiorrespiratória ao longo do tempo ou coletar informações genéticas dos participantes.

Todavia, o grupo sublinha que os resultados estão alinhados com as diretrizes da Sociedade Americana de Oncologia Clínica sobre exercícios durante o tratamento do câncer. "Os exercícios são tão importantes que hoje fazem parte de recomendações das principais instituições de combate ao câncer, a americana, a europeia e, claro, a brasileira. Inclusive, dentro da SBOC, estamos criando guidelines específicos sobre o assunto", completa Guilgen, que não participou do estudo.

 


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