Um dos calendários mais enigmáticos feito pela civilização maia da Mesoamérica foi decifrado por dois pesquisadores da Universidade de Cambridge. A descoberta mostrou como os maias usavam o movimento dos planetas para construir calendários de longa data.
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De acordo com os pesquisadores John H. Linden e Victoria R. Bricker, autores do estudo publicado na revista Ancient Mesoamerica nesta quarta-feira (19/4), o enigmático calendário de 819 dias, descoberto pelo arqueólogo Eric S. Thompson em 1943, foi construído a partir do movimento dos planetas no céu. A descoberta agora, indica que a análise da civilização durou por um período de 45 anos.
Diferente de outros dois calendários maias — como o Tzolk’in, de 260 dias ou Haab’ com 365 dias (vale lembrar que, diferente do calendário gregoriano, o Haab' não é o usado pela humanidade atualmente) —, o sistema de contagem de tempo de 819 dias trouxe muitas dúvidas a diversos pesquisadores ao longo das últimas décadas.
Por muito tempo, os historiadores relacionaram o tempo com um processo ritualístico em que a civilização maia posicionava a imagem do deus K'awiil em diferentes pontos do território em um período de 819 dias. No recente estudo, contudo, os pesquisadores resgataram o entendimento de outros cientistas sobre uma suposta conexão do calendário com o movimento dos planetas — já que a civilização maia era composta de astrônomos hábeis e que registraram, em diversos escritos, o trajeto dos objetos estelares a olho nu com alta precisão.
Muita matemática na ponta do lápis
Assim, os cientistas passaram a testar diversas hipóteses. A primeira foi verificar se o período que cada um dos planetas leva para retornar à mesma posição no céu ao ser visto da Terra — chamado de período sinódico — multiplicado por diferentes vezes daria 819. Ao testar o cálculo, o único planeta que chegou ao valor de 819 foi Mercúrio, cujo período sinódico de 117 dias multiplicado por sete resultou no montante.
Com uma base de cálculo, os cientistas chegaram a outra forma de ver o calendário: os maias não consideraram apenas um planeta, mas todos eles em um período de 45 anos — o chamado calendário de longa data é uma das marcas dos maias. Funciona assim: os pesquisadores passaram a pensar como aquela civilização, que tinha como base numérica o número 20 — cada posição citada no calendário representava 20 vezes o item do calendário.
Assim, os cientistas multiplicaram os 819 dias por 20 vezes — que correspondem a 20 ciclos — e chegaram ao número 16.380 dias (aproximadamente 45 anos). Depois, multiplicaram os períodos sinódicos de cada planeta diversas vezes até conseguirem um conjunto de dias que, divididos, completariam os 16.380 dias.
Saturno, por exemplo, leva 378 dias para retornar ao mesmo ponto no céu, período que, multiplicado por 13 (ciclos), resulta em 4.914 dias — montante que é exatamente seis vezes 819. Sete trajetos de Vênus coincidem com cinco contagens de 819 dias, enquanto 39 períodos sinódicos de Júpiter são iguais a 19 ciclos de 819 dias do calendário.
Ao fim dos cálculos, os pesquisadores descobriram como os maias são detalhistas com as construções dos calendários: os 16.380 dias (819 x 20) significa 20 rodadas de 819 dias, um múltiplo de 260 — número total de dias do calendário Tzolk’in.
“Em vez de limitar seu foco a qualquer planeta, os astrônomos maias que criaram a contagem de 819 dias o imaginaram como um sistema de calendário maior que poderia ser usado para previsões de todos os períodos sinódicos do planeta visível, bem como pontos de mensuração com seus ciclos. No Tzolk'in e na Rodada do Calendário”, pontuam os pesquisadores.