Oitenta e cinco por cento do Universo é completamente invisível, e nem mesmo instrumentos poderosos, como o supertelescópio espacial James Webb, são capazes de obter uma imagem da chamada matéria escura. Sem interagir com a luz ou com outras formas de radiação eletromagnética, ela só é detectada devido à gravidade. Agora, cientistas do projeto Telescópio Cosmológico do Atacama (TCA) criaram o mais detalhado mapa desse componente essencial para a compreensão da expansão do Cosmos. O levantamento cobre um quarto dos céus e, além de ajudar a desvendar a origem de estrelas, galáxias e planetas, confirma, novamente, que Albert Einstein estava certo.
No início do século 20, o cientista alemão previu a existência das lentes gravitacionais, um efeito que acontece quando a radiação eletromagnética passa perto de um objeto massivo, incluindo a matéria escura. O campo gravitacional gerado faz com que a luz se dobre, distorcendo a imagem para o observador. Com o TCA, os astrônomos conseguiram mapear o fenômeno no Universo invisível com centenas de milhões de anos-luz de diâmetro.
Segundo Blake Sherwin, professor de cosmologia na Universidade de Cambridge e um dos líderes do TCA, as observações mostram com clareza a deformação no tecido do Cosmos. "Parece exatamente como nossas teorias preveem", disse Sherwin, que apresentou o resultado da pesquisa ontem, na conferência astronômica Future Science with CMB x LSS, na Universidade de Quioto, no Japão.
A equipe de 160 cientistas utilizou dados do telescópio localizado no deserto chileno do Atacama, que observa a luz emanente do início do Universo, apenas 380 mil anos após o Big Bang. Trata-se da radiação cósmica de fundo em micro-ondas (RCFM), um fenômeno informalmente conhecido como "a imagem do Universo bebê". Com os dados do instrumento chileno, os cientistas rastreiam como essa fonte luminosa, ao passar por objetos massivos — incluindo os formados pela matéria escura —, deformam a RCFM.
"Fizemos um novo mapa de massa usando distorções de luz que sobraram do Big Bang", explicou Mathew Madhavacheril, professor-assistente do Departamento de Física e Astronomia da Universidade da Pensilvânia e coautor do trabalho. "Surpreendentemente, ele fornece medições que mostram que tanto o 'nódulo' do Universo quanto a taxa em que ele está aumentando após 14 bilhões de anos de evolução são exatamente o que você esperaria de nosso modelo padrão de cosmologia baseado na teoria da gravidade de Einstein."
"Crise"
De acordo com Blake Sherwin, alguns astrofísicos defendem que a matéria escura não é irregular o suficiente sob o modelo padrão, levantando dúvidas sobre a sua validade. Trata-se da "crise na cosmologia", que vem se arrastando há algum tempo. O cientista afirma que a confusão se dá porque as medições que colocam a teoria na berlinda utilizaram outra luz de fundo, emitida por estrelas, no lugar da radiação cósmica de fundo em micro-ondas.
No entanto, os resultados mais recentes da equipe do TCA avaliaram que as grandes distorções observadas são exatamente como o esperado. "Quando as vi pela primeira vez, nossas medições estavam tão de acordo com a teoria subjacente que levei um momento para processar os resultados", disse Frank Qu, pesquisador de Cambridge que integra o projeto.
Em nota, Suzanne Staggs, diretora do TCA e professora de física na Universidade de Princeton, afirmou que "os dados das lentes da radiação cósmica de fundo em micro-ondas rivalizam com pesquisas mais convencionais da luz visível das galáxias em sua capacidade de rastrear a soma do que está lá fora". "Juntos, as lentes RCFM e os melhores levantamentos ópticos estão esclarecendo a evolução de toda a massa do Universo." O telescópio no Atacama operou por 15 anos e foi desativado em setembro de 2022. Porém, há muitos trabalhos feitos com dados do instrumento que ainda serão apresentados. No próximo ano, o Observatório Simons, construído no mesmo local, terá um telescópio com capacidade de mapeamento celeste 10 vezes mais rápida que o TCA.
Segundo Stephen Bough, astrônomo da Universidade de Harvard que não participa do projeto, as observações que levam em conta a radiação cósmica de fundo em micro-ondas permitirão chegar a parâmetros cosmológicos mais precisos. "E nos informar sobre como a massa — tanto a matéria visível quanto a escura — está distribuída no Universo."
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Sonda parte rumo às luas de Júpiter
Quatro séculos depois de o astrônomo italiano Galileo Galilei observar, pela primeira vez, o planeta Júpiter e suas maiores luas, a missão Juice (acrônimo de Jupiter ICy moons Explorer) será lançada, amanhã, rumo ao gigante gasoso. Ao custo de US$ 1,75 bilhão, a empreitada, liderada pela Agência Espacial Europeia, é a primeira a explorar a região externa do Sistema Solar e pretende responder a uma pergunta que o homem não se cansa de fazer: será possível a vida como se conhece fora da Terra?
A missão não é tripulada, e a Juice não leva instrumentos capazes de detectar extraterrestres. Porém, as 6,2t de aparelhos científicos da sonda vão farejar a possibilidade de as luas geladas de Júpiter abrigarem vida. Farão isso examinando as condições necessárias para tanto: água, elementos básicos biológicos, energia e estabilidade. "Isso não significa que vamos encontrar vida, mas que queremos saber se é possível", disse, à agência France-Press de notícias (AFP), Francis Rocard, planetólogo do Centro Nacional de Estudos Espaciais (Cnes) da França.
A Juice será lançada ao espaço a bordo de um foguete Ariane 5, da Guiana Francesa. Após subir a 1,5 mil quilômetro, será impulsionada a jornada a Júpiter. Sua chegada à órbita do planeta está prevista para 2031, a uma distância de 628 milhões de quilômetros da Terra.
A viagem será longa e sinuosa, à medida que a sonda não tem energia suficiente para chegar a Júpiter em uma trajetória direta. A sonda passará de planeta em planeta, usando suas respectivas forças de gravidade para se impulsionar para frente, como uma catapulta.
O primeiro destino é a Lua, depois Vênus (2025), posteriormente a Terra novamente (2029), que a ajudará a dar o empurrão final para Júpiter e seus satélites naturais. "Ao passar por Vênus, a sonda enfrentará temperaturas de 250ºC e quando chegar a Júpiter, de -230ºC, uma diferença enorme", alerta Carole Larigauderie, do Cnes. Para suportar essa diferença de temperaturas, o objeto espacial é coberto de várias camadas de material isolante.
Após uma parada perigosa, a sonda entrará na órbita de Júpiter para começar sua missão científica: inspecionar o planeta gigante e seus principais satélites, Io, Europa, Ganímedes e Calisto. "É um sistema solar em miniatura cujo estudo nos permitirá entender melhor como o nosso Sistema Solar foi formado", explica Olivier Witasse, gerente do projeto na Agência Espacial Europeia. A Juice utilizará dados meteorológicos, estudará campos magnéticos e examinará a conexão entre as diferentes luas para detectar ambientes favoráveis ao surgimento de outras formas de vida.
A atenção maior será sobre Ganímedes, a maior lua do Sistema Solar, a única que tem um campo magnético que a protege da radiação e uma forte candidata, junto com Europa, à busca por condições ideais de vida. Ambos os satélites estão cobertos por uma espessa camada de gelo, e, embaixo deles, existem vastos oceanos de água líquida, a principal condição para o surgimento da vida.
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