Partos prematuros são a principal causa de mortalidade entre crianças menores de 5 anos no mundo. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) estimam que 10% dos bebês nascem antes dos nove meses de gestação e, a cada ano, pelo menos 1 milhão de crianças morrem devido a complicações ligadas a esse procedimento. Uma nova tecnologia de imagem não invasiva desenvolvida por pesquisadores da Washington University School of Medicine, nos Estados Unidos, gera, em tempo real, mapas 3D das contrações do útero durante o trabalho de parto, podendo ajudar a prever nascimentos com risco de ocorrerem antes do recomendado.
Yong Wang, professor de obstetrícia e ginecologista e responsável pelo estudo, conta que a necessidade do projeto surgiu da insuficiência dos métodos clínicos atuais em medir atividades uterinas: "Devido à limitação da imagem das funções uterinas em alta resolução espacial e temporal, temos conhecimento limitado de como funciona a contração uterina durante o trabalho de parto e os ciclos menstruais. Isso nos motivou a conduzir a pesquisa e desenvolver a tecnologia", relata.
A solução, apresentada, neste mês, na revista Nature Communications, tem como base métodos de imagem usados, há muito tempo, em exames do coração. Com ela, afirma a equipe, será possível detalhar as contrações uterinas, diferentemente dos recursos de hoje, que indicam apenas a presença ou a ausência desses movimentos musculares. Chamada electromyometrial imaging (EMMI) — imagem eletro-miometrial, em tradução livre —, a tecnologia projeta uma sequência de mapas ao longo do trabalho de parto.
Essas informações permitem visualizar onde as contrações começam e como se espalham. A partir disso, pode-se identificar a ocorrência de risco de um nascimento antes do indicado. "A contração de trabalho de parto precoce mostrará diferentes assinaturas de imagem, em comparação com contrações normais", afirma Wang. A equipe também projeta o uso da tecnologia para, a partir do monitoramento dos movimentos do útero, evitar a ocorrência de hemorragia depois do nascimento da criança.
Sensores
Em um primeiro momento, a solução foi avaliada em ovelhas. Na atual fase do projeto, os testes foram conduzidos com 10 mulheres em trabalho de parto de perfis distintos: na primeira, segunda ou terceira gravidez. As participantes foram submetidas a dois processos de escaneamento não invasivo. Inicialmente, uma ressonância magnética anatômica, que obteve imagens do útero. Em seguida, 192 sensores colocados no abdômen das gestantes para coletar informações sobre as contrações de todo o útero.
Os dados obtidos foram processados pelo EMMI, dando origem a mapas tridimensionais uterinos que podem ser analisados a partir das cores exibidas. As quentes mostram áreas do útero ativadas anteriormente em uma contração, enquanto as frias indicam aquelas que se contraem posteriormente. As cores cinzas, por sua vez, revelam regiões inativas.
Segundo os autores, além das diferenças de contrações entre trabalho de parto prematuro e normal, os resultados mostraram que as mulheres que faziam o primeiro parto tinham contrações mais longas, em comparação às que haviam dado à luz anteriormente. O grupo cogita que essa diferença pode ocorrer devido a uma espécie de memória uterina.
Em nota, a geneticista Diana W. Bianchi avalia que a nova tecnologia é um importante instrumento para a comunidade obstétrica. "O EMMI tem o potencial de responder a perguntas críticas sobre contrações uterinas e nos ajudará a entender melhor o que ocorre durante a gravidez e o trabalho de parto", diz a também diretora do National Institute of Child Health and Human Development, que apoiou o projeto.
Na opinião da especialista, há a possibilidade de a tecnologia ser aprimorada. "Com pesquisas adicionais, a ferramenta pode, potencialmente, prever quem está em risco de dar à luz prematuramente ou que padrão de trabalho resultará na necessidade de uma cesariana", indica. "Ela também ajudará os profissionais de saúde a avaliar se um tratamento ou uma intervenção está funcionando."
Os criadores da solução tecnológica cogitam usá-la também no desenvolvimento de um possível tratamento não farmacêutico durante gravidez de risco, como intervenções elétricas leves para normalizar os padrões de contração, e na investigação de condições relacionadas ao útero fora da gestação — em casos de menstruação dolorosa e endometriose, por exemplo.
No momento, o grupo trabalha para baratear a tecnologia de imagem não invasiva. Segundo Wang, a equipe de pesquisadores se dedica ao desenvolvimento de aparelhos eletrônicos com esse formato. "Estamos tentando tornar a abordagem muito mais barata usando eletrodos impressos e descartáveis e um transmissor sem fio", conta. Mais acessível, enfatiza o pesquisador, a tecnologia poderá ser levada a áreas com poucos recursos, como as distantes dos grandes centros urbanos.
Sinais promissores
Detalhados, em março de 2019, na revista Science Translational Medicine, os experimentos com as ovelhas mostraram que o EMMI pode gerar imagens tridimensionais da ativação elétrica uterina durante as contrações "de forma não invasiva, segura, precisa, robusta e viável". Os resultados, segundo a equipe, sugeriram que efeitos semelhantes poderiam ser obtidos em ambiente clínico.