A obesidade é um dos fatores de risco para hipertensão arterial, mas não é preciso estar muito acima do peso para desenvolver o problema. Um estudo com 800 mil crianças e jovens entre 3 e 17 anos descobriu que, mesmo os que estavam alguns quilos acima do considerado saudável, tinham 26% maior risco de ter pressão alta. No Brasil, a prevalência dessa condição em menores de 18 anos varia de 3% a 15%, segundo um artigo da Sociedade Brasileira de Pediatria. As consequências de um quadro não tratado são doenças cardiovasculares e renais, entre outras.
A pesquisa, divulgada ontem na revista Jama Network Open, utilizou dados da Kaiser Permanente, o maior plano de saúde sem fins lucrativos dos Estados Unidos. Os cientistas, do Departamento de Pesquisa e Avaliação da instituição, avaliaram registros eletrônicos de crianças e adolescentes atendidos no sul da Califórnia entre 2008 e 2015. Então, dividiram a amostra em 100 partes (percentil) e compararam o índice de massa corporal (IMC) e a pressão arterial dos participantes ao longo de cinco anos. O IMC é a divisão da altura pelo peso ao quadrado.
As crianças e os jovens foram categorizados, no início, como abaixo do peso, peso normal, normal médio, alto normal, sobrepeso, moderadamente obeso e gravemente obeso. Mesmo entre os dos grupos abaixo da obesidade, ao longo de cinco anos, cada unidade de IMC ganha por ano elevou o risco de hipertensão em 4%.
Aqueles com IMC dentro da normalidade, porém acima da média dessa faixa (alto normal), apresentaram risco 26% maior de desenvolver hipertensão no período de avaliação, comparados aos com os pesos mais baixos. Isso mesmo sem sequer estarem com sobrepeso, destacam os pesquisadores. "Nosso estudo sugere que um peso normal abaixo do limite para sobrepeso está associado ao aumento do risco de hipertensão em jovens e ressalta a necessidade de os pediatras reavaliarem como educamos sobre a questão dos riscos à saúde independentemente da faixa de peso", acredita Poornima Kunani, principal autora do artigo.
"O peso pode ser o fator de risco mais importante para hipertensão durante a infância", destaca Kunani. "Os pais devem conversar com os pediatras para ver se seu filho pode estar em risco de hipertensão e outras condições médicas crônicas evitáveis relacionadas ao ganho de peso. Eles podem ajudá-los com estratégias para desenvolver hábitos para manter o filho saudável até a idade adulta."
Segundo Givoanni de Simone, pesquisador da Universidade de Nápoles Federico II, na Itália, nove em cada 10 casos de hipertensão em crianças e adolescentes estão associados a excesso de peso, sedentarismo e dietas ricas em açúcar e sal. Assim como os colegas norte-americanos, Simone, que não participou do estudo publicado ontem, ressalta a importância de os pais estarem atentos a esses fatores de risco. "Eles são os agentes significativos de mudança na promoção dos comportamentos de saúde das crianças. Muitas vezes, hipertensão e/ou obesidade coexistem na mesma família. Mas mesmo quando não é o caso, é desejável que as alterações no estilo de vida envolvam todos."
O pesquisador e membro da Sociedade Europeia de Cardiologia diz que excesso de peso na infância e hipertensão são como "irmãos insidiosos" que, gradualmente, evoluem para um sério risco à saúde. De acordo com Simone, especialmente a obesidade abdominal pode alterar a pressão arterial. "Estima-se que menos de 2% das crianças com peso normal sejam hipertensas, em comparação com 5% das crianças com sobrepeso e 15% das crianças obesas. O aumento da hipertensão na infância é uma grande preocupação, pois está associado à persistência da condição e de outros problemas cardiovasculares durante a vida adulta."
Sono
O risco de hipertensão em crianças e jovens acima do peso é maior entre aqueles com padrões de sono inadequados, destaca Julio Fernandez-Mendonza, professor do Penn State College of Medicine. Ele é autor de um estudo recente divulgado pelo jornal da Associação Norte-Americana do Coração que relacionou o aumento da pressão arterial e repouso noturno em 303 adolescentes com idade média de 16 anos.
A equipe de Fernandez-Mendonza avaliou a duração e a regularidade do sono, gordura visceral e pressão arterial dos participantes. Entre aqueles que adormeceram mais tarde durante a semana, cada unidade de aumento na gordura abdominal visceral foi associada a um aumento de 5mm Hg na pressão arterial sistólica e de 2mm Hg na pressão diastólica. Para aqueles que foram dormir mais cedo, não houve essa relação.
Nos adolescentes que se descreveram como "pessoas noturnas", cada unidade de aumento na gordura abdominal visceral foi associada a uma pressão arterial diastólica cerca de 3mm Hg mais alta. Porém, entre as "pessoas matutinas", esse impacto não foi verificado. "Esses resultados sugerem que manter um padrão regular de sono pode proteger os adolescentes das consequências cardiovasculares da obesidade", afirma o pesquisador.
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