Cobras, anelídeos, caramujos e lagartas são exemplos de animais que usam a flexibilidade e a capacidade de gerar impulsos pelo corpo para se locomover em diferentes ambientes, incluindo os mais adversos. Inspirados nesses seres vivos, cientistas do laboratório de robótica do Instituto Italiano de Tecnologia (IIT), em Gênova, criaram um robô com habilidades locomotoras similares às das minhocas. A expectativa é de que o protótipo abra caminho para o desenvolvimento de dispositivos capazes de fazer explorações subterrâneas, ajudar em operações de busca e salvamento e até mesmo fazer parte de missões espaciais.
Ao estudar a morfologia das minhocas, os pesquisadores do IIT encontraram uma maneira de imitar seus movimentos musculares e sua estrutura corporal usando um atuador. "Cada segmento da minhoca pode alternadamente alongar e expandir. Os movimentos de alongamento e expansão passam como ondas pelo corpo do verme, fazendo-o se mover. Nosso robô produz ondas semelhantes em seu corpo artificial", detalha Barbara Mazzolai, líder da equipe. A máquina de 45cm de comprimento e 605g foi descrita, neste mês, na revista Scientific Reports.
As contrações alternadas dos músculos usadas pelos escavadores naturais são chamadas de ondas peristálticas. Dianne Magalhães Viana, pesquisadora do Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Brasília (UnB) e integrante de um projeto com características semelhantes, explica que a minhoca tem três elementos principais que contribuem para esse tipo de locomoção: o corpo formado por segmentos separados e preenchidos com um fluido, dois sistemas musculares que se contraem e se relaxam e cerdas que evitam o deslizamento.
O robô criado pela equipe italiana simula a função dos três elementos. "Ele se locomove com base no movimento peristáltico de locomoção das minhocas, que são contrações musculares rítmicas e coordenadas. Elas também ocorrem em certos órgãos tubulares do corpo humano, como o tubo digestivo", afirma Viana. "Os pesquisadores italianos desenvolveram um atuador, ou seja, um dispositivo que produz movimentos, capaz de simular os movimentos musculares das minhocas."
Trata-se de um atuador peristáltico macio (PSA). A partir de uma posição neutra, ele se alonga quando o ar é bombeado para dentro e se comprime com a extração do gás. O corpo da máquina é formado por cinco módulos PSA conectados em série. Como as minhocas, o atuador tem uma parte central, em forma de sanfona, envolvida por uma pele macia externa.
O espaço entre esses dois componentes é preenchido por um fluido de volume constante, que funciona com um dos três elementos-chave na locomoção da minhoca. Para isso, a equipe escolheu um gel com propriedades similares às do produto para cabelo. "O robô é um sistema totalmente macio feito principalmente com borrachas de silicone", destaca Mazzolai. "Cada módulo individual é preenchido com um gel fluídico como o presente nas minhocas", completa.
De acordo com Roberto de Souza Baptista, professor de engenharia eletrônica da Faculdade do Gama da UnB, os fluidos têm um papel fundamental no dispositivo robótico: manter o mesmo volume tanto na configuração alongada, quanto na neutra e na encurtada. "A manutenção do volume é um dos princípios de funcionamento dos nossos músculos, e a emulação desse comportamento no PSA permite a movimentação peristáltica que proporciona a locomoção da minhoca-robô", afirma.
O especialista explica que essa configuração tem como vantagem a distribuição da força exercida na superfície externa. "Isso permite que o dispositivo abra espaço na terra e se movimente para frente simultaneamente, assim como as minhocas", diz.
Multiuso
Para reproduzir o terceiro componente-chave da locomoção, a equipe fixou pequenas almofadas de fricção na superfície ventral do robô, o que o impulsiona em superfícies planas, evitando que ele escorregue. "Nossos experimentos iniciais de locomoção mostraram que o atrito gerado pela superfície do elastômero com o meio de interação era insuficiente para impulsionar o robô", detalham os autores do estudo. Em teste, o dispositivo conseguiu se locomover a uma velocidade de 1,35mm/s.
Segundo os criadores, as aplicações potenciais para essa tecnologia são vastas, incluindo operações de exploração subterrânea, escavação, busca e salvamento em ambientes subterrâneos e exploração de outros planetas. A pesquisadora da UnB cogita outros campos: "Também em ações de monitoramento ambiental relacionadas à qualidade de solos e aos níveis de poluição, possivelmente em cirurgias e procedimentos médicos pouco invasivos, na pesquisa em avanços para a robótica modular, na educação e até no entretenimento".
Dianne Magalhães acredita que os avanços na pesquisa possibilitarão movimentos e comportamentos mais realistas, eficientes e capazes de realizar operações complexas. "Além de envolverem e inspirarem o aprendizado de robótica entre os estudantes", aposta. Na próxima etapa do projeto, o grupo italiano planeja tornar o robô autônomo e capaz de entender seu ambiente externo, além de interagir e realizar a locomoção da maneira mais otimizada.
*Estagiária sob a supervisão de Carmen Souza
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