alimentação

Suplementação de vitamina D pode estar ligada a menor risco de demência

Estudo com mais de 12 mil pessoas sugere que suplemento nutricional pode ser uma estratégia de prevenção da demência. Especialistas querem mais dados antes de recomendar o uso com essa indicação

Paloma Oliveto
postado em 03/03/2023 06:00
 (crédito: Reprodução/Freepik)
(crédito: Reprodução/Freepik)

A suplementação de vitamina D pode estar associada a um risco 40% menor de demência, segundo um estudo de pesquisadores do Canadá e do Reino Unido. O artigo, publicado na revista Alzheimer's & Dementia: Diagnosis, Assessment & Disease Monitoring, baseia-se em dados de 12.388 pessoas com idade média de 71 anos, registradas no Centro Nacional de Alzheimer dos Estados Unidos. No início do levantamento, nenhum participante havia sido diagnosticado com problemas neurodegenerativos.

Os indivíduos foram avaliados periodicamente ao longo de 10 anos. No fim, aqueles que faziam uso frequente da suplementação apresentaram probabilidade menor de ter o diagnóstico de demência, comparado aos que nunca foram expostos à vitamina D ou só a utilizaram por um curto período, sugerindo um efeito protetor da substância.

Nem todas as pessoas que tomaram o suplemento ficaram livres de Alzheimer e outras demências, mas, nesses casos, demorou mais tempo para serem diagnosticadas. Em cinco anos, enquanto 68,4% do grupo não exposto à vitamina D permanecia saudável, esse percentual foi de 83,6% entre os que usavam a substância. Em todos os cenários, as mulheres foram mais beneficiadas do que os homens, o que, segundo os pesquisadores, é mais um indicativo de que o sexo é um fator de risco de declínio neurocognitivo.

Deficiência

"Atualmente, mais de 50 milhões de pessoas em todo o mundo vivem com demência, e esse número quase triplicará até 2050. Há escassez de medicamentos altamente eficazes para demência que possam interromper ou reverter a progressão da doença", afirma o neuropsiquiatra Zahinoor Ismail, professor da Universidade de Calgary e da Universidade de Exeter, que liderou a pesquisa. "A deficiência de vitamina D pode ser um fator de risco modificável e tem sido reconhecida como um problema de saúde generalizado, com prevalência mundial de até 1 bilhão", afirma. De acordo com Ismail, a substância ajuda a limpar, no cérebro, as placas de proteína beta-amiloide, uma das principais características do Alzheimer.

Além disso, a vitamina D pode combater um processo também conhecido por caracterizar a demência, chamado hiperfosforilação da proteína tau. Quando isso ocorre, são criados emaranhados de fibras no cérebro, o que contribui para a neurodegeneração. "No entanto, o papel da suplementação de vitamina D como uma intervenção potencial tem sido objeto de debate e permanece em equilíbrio", afirma Ismail.

Enquanto alguns estudos sugerem que o suplemento melhora a função cognitiva, outros não observaram o efeito. Uma revisão recente de nove ensaios clínicos sobre o papel preventivo da substância também não detectou benefícios significativos. "A variabilidade da dosagem, pequenos tamanhos de amostra, curta duração da exposição ou curtos tempos de acompanhamento em alguns desses estudos podem ter contribuído para as inconsistências observadas", destaca Byron Creese, neurocientista da Universidade de Exeter e coautor da pesquisa atual.

Variante

Os cientistas notaram que pessoas sem uma variante genética chamada APOEe4, que aumenta o risco de Alzheimer, foram mais beneficiadas pela suplementação. Eles acreditam que o gene faz com que a substância seja mais absorvida no intestino, reduzindo os efeitos da vitamina D, mas notam que a hipótese não foi testada clinicamente.

Para Rosa Sancho, pesquisadora da organização não governamental Alzheimer´s Research UK, no Reino Unido, são necessários mais estudos para compreender melhor a associação entre a vitamina D e o risco reduzido de demência. "O estudo não coletou dados sobre o estilo de vida e o histórico de saúde dos participantes nos anos anteriores ao início da pesquisa. Essa é uma omissão importante. Pesquisas extensas mostram que hábitos e comportamentos na meia-idade, como manter um coração saudável ou não fumar, podem reduzir nosso risco de demência mais tarde na vida. Os pesquisadores especulam sobre como a vitamina D pode estar ligada ao risco de demência, mas essas alegações precisam de investigações adicionais para serem confirmadas", diz.

A neurocientista destaca que, para manter o cérebro saudável à medida que se envelhece, há hábitos comprovadamente benéficos. "Coisas como não fumar, manter-se mental e fisicamente ativo, beber com moderação e manter pressão arterial e colesterol sob controle têm um efeito positivo", diz. "Ainda não há evidências suficientes para adicionar suplementos de vitamina D a essa lista. Precisamos esperar mais para preencher as lacunas, incluindo pesquisas que medem a dosagem e o papel de outros fatores, como dieta e exercícios."

Os autores reconhecem as limitações do estudo, que é observacional e, portanto, não estabelece uma relação de causa e efeito. "Precisamos de ensaios clínicos para confirmar se a suplementação de vitamina D tem um efeito protetor contra demências. Por isso, estamos conduzindo uma pesquisa que vai dividir os participantes em grupos aleatórios para tomar vitamina D ou placebo e observar as mudanças nos testes de memória e cognição ao longo do tempo", conta Byron Creese.

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Hormônio produzido na pele

Segundo a Sociedade de Endocrinologia da Inglaterra, a vitamina D é, na verdade, um hormônio e não uma vitamina. A substância é produzida principalmente na pele, em resposta à luz solar, e também absorvida dos alimentos ingeridos. O fígado e os rins convertem a vitamina D (produzida na pele e absorvida na dieta) no hormônio ativo, chamado calcitriol (1,25-diidroxivitamina D). A vitamina D ativa ajuda a aumentar a quantidade de cálcio que o intestino pode absorver e também evita a perda do elemento nos rins. A deficiência pode ocorrer em pessoas pouco expostas ao Sol ou com doenças que afetam a capacidade de ser absorvida. Apenas um médico pode indicar se os níveis são deficientes e, assim, indicar a suplementação. Em excesso, o hormônio pode causar um efeito chamado hipercalcemia.

Ensaio clínico

Martin Hewison, professor de endocrinologia molecular da Universidade de Birmingham
Martin Hewison, professor de endocrinologia molecular da Universidade de Birmingham (foto: Arquivo pessoal )

"O artigo é importante porque sugere que tomar suplementos de vitamina D pode ter alguns benefícios gerais na prevenção ou no retardo da demência. Dessa forma, indica uma plataforma para trabalhos futuros que podem fornecer evidências mais sólidas sobre o benefício. Os autores estão, atualmente, envolvidos no estudo de suplementação VitaMIND, que irá explorar se a suplementação de vitamina D afeta a cognição ao longo do tempo. No entanto, uma palavra de cautela é necessária aqui. Muitos estudos anteriores de suplementação de vitamina D foram ineficazes, muitas vezes devido às dificuldades em projetar esses ensaios. Por exemplo, a suplementação pode ser necessária ao longo de muitos anos para ser eficaz, e só pode ser eficaz em pessoas com deficiência da substância no início. Eticamente, qualquer pessoa conhecida por ser deficiente em vitamina D deve receber um suplemento, e não o placebo. Apesar de todas essas dificuldades, será interessante ver o que o estudo VitaMIND mostra."

Martin Hewison, professor de endocrinologia molecular da Universidade de Birmingham, na Inglaterra, e pesquisador dos efeitos da vitamina D no sistema imunológico

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