Três perguntas para...

Helena Lage Ferreira, professora associada na Universidade de São Paulo (USP) e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia

Paloma Oliveto
postado em 19/02/2023 06:00

Helena Lage Ferreira, presidente da Sociedade Brasileira de Virologia
Helena Lage Ferreira, presidente da Sociedade Brasileira de Virologia (foto: FZEA-USP/Divulgação )

Na Europa, nos Estados Unidos e no Peru, foram detectados casos em mamíferos. Uma mutação nesses animais poderia facilitar o salto do vírus para humanos?

O vírus da influenza aviária apresenta mecanismos de evolução complexos. Um conjunto de mutações em alguns segmentos do material genético viral é necessário para ocorrer a transmissão sustentável entre mamíferos. Por isso, o monitoramento de animais domésticos e silvestres, assim como a investigação de mortalidade incomum em animais silvestres, devem ser realizados. Todos os profissionais devem utilizar equipamentos de proteção individual (EPI) para a manipulação de animais doentes, e a população não deve mexer nesses animais e, sim, informar aos serviços veterinários oficiais.

O H5N1 circula na América Latina e, recentemente, Argentina e Uruguai confirmaram que ele foi detectado em aves. É questão de tempo até chegar ao Brasil?

O vírus tem as aves aquáticas silvestres como reservatório natural. Nos Estados Unidos, foi identificado em mais de 160 espécies de aves silvestres, e algumas dessas espécies migram para o Hemisfério Sul, entre outubro e março, em busca de alimentos e de condições climáticas favoráveis à reprodução. Desde o início da migração das aves, no segundo semestre de 2022, o vírus foi identificado em oito países da América do Sul. É esperado que seja identificado em aves silvestres no território brasileiro, uma vez que é um país com uma enorme biodiversidade e já identificamos que temos a transmissão entre as aves no continente americano. A detecção em aves silvestres é uma preocupação para a biodiversidade e ambiental, mas vale salientar que ela não impacta as atividades comerciais avícolas brasileiras.

Um artigo publicado na revista Eurosurveillance afirma que o vírus sofreu oito mutações, sendo uma delas encontrada, também, no H1N1, na pandemia de 2009. Isso levanta preocupação?

Muita. O caso ocorreu na Espanha em outubro de 2022, e o estudo sugere que houve transmissão do vírus entre os animais. O vírus identificado apresentava mutações em diferentes segmentos gênicos, incluindo uma já conhecida para adaptação em mamíferos. A lição desse evento é que o vírus foi identificado devido a um sistema de monitoramento de doenças muito criterioso. Como esses animais também são altamente suscetíveis ao Sars-CoV-2, todos os trabalhadores usavam EPI para evitar transmissão entre as espécies. Havia também um sistema para identificar o aumento da mortalidade e realizar a testagem dos animais para Sars-CoV-2. O teste foi negativo, e a mortalidade continuou aumentando. Testes de diagnósticos foram preconizados para identificar o agente infeccioso responsável, com a suspeita de H5N1, porque algumas semanas antes do início das mortes, ele havia sido identificado em aves silvestres na região. As medidas sanitárias foram implementadas rapidamente após o diagnóstico de influenza aviária para o controle do vírus na localidade. Todos os trabalhadores que tiveram contato com os animais foram testados e nenhum deles se infectou porque usavam EPI. 

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