A infância e a adolescência são períodos estratégicos para a aquisição e a manutenção de hábitos. Também são etapas da vida em que se tem aumentado a incidência de complicações ligadas à saúde mental, como depressão e ansiedade. Os dois fenômenos inspiram cientistas e outros profissionais da área a buscarem formas "alternativas" e mais estratégicas de preservar o bem-estar psicológico dos jovens. Pesquisas recentes indicam que a prática regular de exercícios físicos, um maior contato com a natureza e o uso de música são recursos que podem ajudar nesse sentido.
Pesquisadores da Universidade de Hong Kong avaliaram 21 estudos com dados de 2.441 participantes — sendo 47% do sexo masculino e 53%, do feminino — com idade média de 14 anos. Concluíram que uma rotina não sedentária está associada a reduções significativas dos sintomas de depressão. Ainda segundo a meta-análise, a regularidade das atividades — três vezes por semana — pode influenciar positivamente o efeito geral do tratamento.
Para o grupo, os resultados, divulgados, neste mês, na revista Jama Pediatrics, sinalizam que as atividades físicas são promissoras como uma abordagem alternativa ou adjuvante ao tratamento clínico para a doença. Os autores enfatizam, ainda, que há uma necessidade "urgente" de explorar novas formas de enfrentamento com opções que sejam seguras, viáveis e amplas na rotina diária de crianças e adolescentes, considerando as limitações dos tratamentos tradicionais, como a psicoterapia e a farmacoterapia.
"A falta de tempo, o medo da estigmatização, a desconfiança dos pais nos terapeutas e a falta de percepção da necessidade de tratamento podem ser fortes barreiras à psicoterapia infantil. Enquanto isso, efeitos adversos, incluindo distúrbios do sono, desconforto gastrointestinal e até suicídio, foram associados ao uso de antidepressivos em pacientes pediátricos", destacam os autores.
No texto, o grupo também sugere que as escolas entrem na empreitada em prol da saúde mental dos mais jovens. "A atividade física, principalmente o exercício aeróbico, é adequada para crianças, pois é um componente importante da maioria das atividades esportivas e pode ser facilmente implementada nas aulas de educação física", indicam, ressaltando, em seguida, que o hábito também reduz o risco de doença cardiovascular, que "é a principal causa de morte em indivíduos com depressão", e melhora a função executiva, "muito prejudicada em jovens com a doença".
Psiquiatra da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Roberto Santoro concorda com os resultados. Ele lembra que, além de melhorar a condição física dos jovens, a prática de exercícios provoca uma série de modificações cerebrais que beneficiam a forma como eles se sentem. "Também proporcionam contato com a natureza, com outras pessoas e uma socialização positiva. Assim, o efeito do exercício físico é multifatorial", afirma.
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Perto das árvores
Estar mais próximo de áreas verdes é, inclusive, segundo cientistas da Espanha, uma condição ligada à melhora na saúde mental, à redução do uso de medicamentos e de visitas a psicólogos. A equipe do Instituto de Saúde Global de Barcelona (ISGlobal) chegou à conclusão em uma análise baseada no método 3-30-300. Por ele, todos devem, de casa, poder ver pelo menos três árvores, ter 30% de cobertura de copa da árvore em sua vizinhança e não morar a mais de 300 metros de um parque ou de um espaço verde.
Os cientistas analisaram um grupo de 3.145 moradores de Barcelona e apenas 4,7% atenderam a todos os três critérios. Dos participantes, 18% relataram problemas de saúde mental, 8,3%, ter visitado um psicólogo no ano anterior, 9,4% ingeriram tranquilizantes ou sedativos e 8,1%, antidepressivos nos dois dias anteriores à entrevista. Autor da pesquisa, Mark Nieuwenhuijsen, diretor de Planejamento Urbano, Iniciativa de Meio Ambiente e Saúde da ISGlobal, afirma que a mensagem principal do estudo é que "precisamos de mais esverdeamento e mais rápido".
"Há uma necessidade urgente de proporcionar aos cidadãos mais espaços verdes. Pode ser necessário remover o asfalto e plantar mais árvores, o que não apenas melhoraria a saúde, mas também reduziria os efeitos das ilhas de calor e contribuiria para a captura de carbono", sugere.
Férias
O período das férias escolares pode ser estratégico para dar início a esse esverdeamento, avalia Rodrigo Bueno, professor de educação física do Colégio Objetivo DF. Ele indica a prática de atividades prazerosas que possam ser feitas em grupo, como andar de bicicleta, de patins, andar ou correr em um parque ou fazer trilhas. "A primeira coisa é saber o que pode ser mais prazeroso, uma vez que uma pessoa sedentária, ainda mais de férias, está em sua zona de conforto", lembra. Para dentro das casas, a recomendação de Bueno é montar um canto atrativo para praticar atividades como polichinelos, corrida estacionária, agachamentos ou pular corda.
Durante o ano letivo, Bueno sugere atividades que façam sentido para a criança ou para o adolescente. "Não é impor, é mostrar a eles a importância da atividade física e apresentar opções que possam gerar a sensação de prazer. Práticas de esportes coletivos são interessantes porque desenvolvem a interação", sugere.
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Sons para desestressar
Acessório muito usado pelos adolescentes, os fones de ouvido podem ser uma ferramenta que ajude a preservar a saúde mental. Isso porque pesquisadores têm observado que a música é um recurso terapêutico para esse público. As canções têm o potencial de mudar estados emocionais e podem distrair os ouvintes de pensamentos negativos e dor, além de melhorar a memória e o humor, indicam estudos.
Pesquisadores da Universidade de Viena observaram esses efeitos durante a pandemia (Leia Para saber mais). De acordo com a pesquisa, publicada na Jama Network Open, as pessoas que experimentam estresse momentâneo ou crônico devido às sequelas emocionais da crise sanitária, podem considerar a música como uma ferramenta facilmente acessível para o gerenciamento do estresse e do humor.
Para chegar à conclusão, eles analisaram 711 voluntários (70% mulheres e 30% homens) com idade média de 27 anos. Ouvir música foi associado a níveis mais baixos de estresse momentâneo e melhorias na variação de humor, especialmente se as canções fossem percebidas como alegres. Indivíduos com níveis mais altos de estresse crônico relataram melhor valência de humor — variação entre emoções negativas e positivas — após a experiência.
"A música tem a capacidade de modular processos cognitivos, afetivos e neurobiológicos. Além disso, evidências históricas sugerem que, principalmente em tempos de crise e desastres, indivíduos de todas as culturas recorrem a ela para melhorar o humor e aumentar os sentimentos de conexão social", argumentam os autores.
Apostando nesse tipo de benefício, Man Hei Law, da Universidade de Ciência e Tecnologia de Hong Kong, criou um aplicativo que forma listas de reprodução personalizadas de músicas para ajudar os ouvintes a cuidarem de suas emoções. O usuário responde a questionários — incluindo uma triagem de transtorno de ansiedade geral — para medir seu estado emocional, e a playlist cria um repertório a partir da identificação das emoções em termos de nível de energia e humor.
"Como linguagem universal da humanidade, a música pode impactar significativamente o estado físico e emocional de uma pessoa. Por exemplo, pode ajudar as pessoas a controlarem a dor. Desenvolvemos esse aplicativo como uma estratégia acessível de primeiros socorros para equilibrar as emoções", enfatiza Law. (GC)
Casos dobraram na pandemia
Os momentos de confinamento devido à pandemia de covid-19 tiveram forte impacto na saúde mental dos jovens. Uma pesquisa divulgada, em agosto, na Jama Pediatrics mostrou que 25% dos adolescentes em todo o mundo estão "experimentando sintomas de depressão clinicamente elevados", enquanto 20% enfrentam " sintomas de ansiedade clinicamente elevados." As taxas equivalem ao dobro do período anterior à crise sanitária.
Para chegar a esses resultados, a equipe analisou dados clínicos empíricos sobre depressão e ansiedade de diversas localidades: Leste Asiático, Europa, Oriente Médio e Américas do Norte, Sul e Central. Foram considerados 29 estudos, somando 80 mil participantes, com idade entre 4 e 17 anos. Segundo o estudo, os resultados indicam a "necessidade urgente de esforços de intervenção e recuperação destinados a melhorar o bem-estar de crianças e adolescentes".