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Pele com cicatriz é totalmente recuperada em experimento

Três voluntários submetidos a transplante de folículos pilosos, além de perderem as marcas, tiveram todas as funções do tecido regeneradas. Resultado abre novos caminhos para o tratamento de lesões extensas

Paloma Oliveto
postado em 07/01/2023 06:00
 (crédito: Michael Rodger/Divulgação)
(crédito: Michael Rodger/Divulgação)

Todos os anos, mais de 100 milhões de pessoas sofrem cicatrizes, apenas em países de alta renda. Embora seja quase impossível não exibir ao menos uma delas, em casos mais graves, além da questão estética, há uma preocupação médica. Afinal, naquele pedaço da pele, morrem células, pelos, vasos sanguíneos, nervos e glândulas sudoríparas, todos importantes para regular a temperatura do corpo, detectar sensações como dor e permitir a movimentação normal. Agora, um experimento com três pacientes traz esperança de tratamentos que não apenas apagam as marcas, mas regeneram a pele por completo.

No estudo, do Imperial College de Londres, três voluntários recuperaram a pele — com todas as suas funções — quando tratados com transplante de folículos pilosos. Além de ficar livre da cicatriz, o tecido ganhou novas células e vasos sanguíneos, remodelou as camadas de colágeno e chegou a expressar genes que só existem em partes saudáveis do órgão. Segundo os pesquisadores, que publicaram o resultado na revista Nature Regenerative Medicine, a descoberta poderá ser a base de novas terapias para lesões extensas. "Até agora, todos os esforços para remodelar as cicatrizes produziram resultados ruins. Nossas descobertas estabelecem as bases para tratamentos que podem rejuvenescer até mesmo cicatrizes antigas e restaurar a função da pele saudável", conta a especialista em bioengenharia Claire Higgins, principal autora do estudo.

Quando a pele sofre um corte ou é aberta, há sangramento e, para estancar o fluxo, as plaquetas se agregam, formando um coágulo. Células imunológicas são acionadas para combater micro-organismos externos, enquanto os queratinócitos trabalham para fechar as bordas da ferida. Depois, os fibroblastos passam a preencher o ferimento. O problema é que, na pressa de proteger o tecido, essas células depositam fibras de colágeno paralelas umas às outras em vez de cruzadas, como deveria. Assim, nascem as indesejáveis marcas.

Higgins explica que a pele saudável é constantemente renovada por folículos pilosos, que dão origem aos pelos e ao cabelo. Isso pode ser observado em transplantes capilares, que, segundo ela, ajudam na cicatrização de feridas. Com esse conhecimento, os cientistas do Imperial College se aliaram a Francisco Jiménez, cirurgião e professor da Universidade Fernando Pessoa, na Espanha. Ele é um especialista em cirurgias do tipo.

Juntos, os cientistas transplantaram folículos pilosos para as cicatrizes antigas no couro cabeludo de três voluntários. Os pesquisadores selecionaram o tipo de tecido cicatricial mais comum, o normotrófico, que, geralmente, se forma após a cirurgia. Antes do procedimento, os pesquisadores retiraram um pequeno pedaço da lesão, o que se repetiu dois, quatro e seis meses depois. Esse material foi submetido a biópsias.

Os exames mostraram que os folículos desencadearam mudanças arquitetônicas e genéticas nas cicatrizes, tal como ocorre na pele saudável. Além da produção de cabelo, houve restauração das camadas, que adquiriram uma espessura normal. Depois de seis meses, o número de células na derme dobrou, e o de vasos sanguíneos normalizou em 160 dias. A densidade das fibras de colágeno foi reduzida, diminuindo a rigidez do tecido.

Experimento no início, dois meses, quatro e seis meses depois. Folículo piloso ajudou a acabar com a cicatriz
Experimento no início, dois meses, quatro e seis meses depois. Folículo piloso ajudou a acabar com a cicatriz (foto: Nature Regenerative Medicine/Reprodução )

Órgãos internos

Agora, os pesquisadores querem descobrir os mecanismos que permitiram a regeneração da pele após o transplante dos folículos pilosos. Assim, poderão desenvolver terapias para partes do corpo que não têm pelo e mesmo para órgãos, como coração e fígado, que sofrem cicatrizes após ataques cardíacos e doenças hepáticas, respectivamente. "Esse trabalho tem aplicações óbvias para restaurar a confiança das pessoas, mas nossa abordagem vai além da cosmética, pois o tecido cicatricial pode causar problemas em todos os nossos órgãos", diz Higgs.

"Embora possa não parecer, muita coisa acontece sob a superfície da pele: folículos para o crescimento do cabelo, glândulas para secretar suor e óleo, nervos para sentir dor e pressão. O tecido cicatricial não tem nenhuma dessas coisas", destaca Radika Atik, bióloga especialista em pele da Case Western Reserve, nos Estados Unidos, que não participou do estudo. "As cicatrizes são mais do que apenas desfigurantes. Você perde glândulas sudoríparas, nervos e outras formas críticas de sentir e responder ao mundo ao seu redor. Poder dar às pessoas a capacidade de regenerar a própria pele é algo realmente muito emocionante", opina.

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FDA aprova droga contra Alzheimer

A agência regulatória de medicamentos norte-americana aprovou a droga lecanemab, dos grupos farmacêuticos Eisais e Biogen, indicada para o tratamento de Alzheimer. Estudos sobre a droga demonstraram que houve redução de 27% no comprometimento cognitivo de pacientes que usaram o remédio e estavam na fase inicial da doença neurodegenerativa. O artigo mais recente, publicado na revista New England Journal of Medicine, também apontou efeitos colaterais: 17,3% dos pacientes do ensaio clínico sofreram hemorragias cerebrais, em comparação com 9% do grupo placebo. Edema cerebral foi outra intercorrência. A Food and Drug Administration (FDA), porém, entendeu que os benefícios superam os riscos e, ontem, deu o aval para a comercialização da droga. Outro medicamento contra o Alzheimer da Biogen e da Eisai, chamado Aduhelm (aducanumab), já havia despertado esperanças em 2021, mas houve polêmica quando a FDA o aprovou, apesar da opinião contrária de um painel de especialistas que considerou o remédio ineficaz. Ainda não foi definido o preço do lecanemab, mas se estima que um ano de tratamento custe, nos EUA, US$ 20 mil.

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