DNA

Genética e alta escolaridade aumentam risco de miopia, aponta estudo

Descobertas variantes que, associadas a muitos anos de estudo e pouco tempo ao ar livre, elevam vulnerabilidade para o distúrbio visual

Uma das principais causas de deficiência irreversível na visão, a miopia tem forte componente genético. Mas só o DNA não explica o distúrbio: pela primeira vez, pesquisadores encontraram cinco variantes que, associadas a muitos anos de escolaridade e a pouco tempo ao ar livre, elevam o risco do problema em adultos. O artigo, publicado na revista Plos Genetics, foi feito com dados de mais de 340 mil pessoas que vivem no Reino Unido.

Conduzido pela Universidade de Cardiff, o estudo mostrou que essas variantes genéticas aumentam progressivamente o risco de miopia quanto mais anos de estudo a pessoa tem, especialmente aquelas com nível universitário. Três genes nunca haviam sido identificados; os outros dois apareceram em levantamentos epidemiológicos do leste asiático onde, segundo os autores, cerca de 80% das crianças se tornam míopes (contra 30% no Ocidente).

"China, Taiwan, Singapura e Hong Kong têm sistemas educativos extremamente intensivos", disse, ao Correio, o principal autor, Jeremy Guggenheim. "Especulamos que a genética determina a susceptibilidade de uma pessoa à miopia, mas que a exposição a um fator de risco no estilo de vida é necessária para desencadear o seu desenvolvimento. O nosso objetivo era descobrir como os efeitos da educação e genética estavam interrelacionados", conta.

Segundo Guggenheim, pesquisas anteriores descobriram 450 genes associados à miopia. Na atual, os autores utilizaram um grande banco de dados genético e de saúde do Reino Unido que contém não apenas as informações médicas, mas também sobre, entre outras coisas, a escolaridade dos participantes. Com base nesse parâmetro, os cientistas buscaram, no genoma total, variantes que, combinadas a um alto nível de escolaridade, poderiam tornar as pessoas mais suscetíveis ao distúrbio oftalmológico.

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Guggenheim adverte que ainda são necessárias mais pesquisas para entender como essas características genéticas interagem com hábitos de vida para causar a condição. "Os genes que identificamos oferecem um ponto de partida para abordar essa questão", afirma. Tiago Ribeiro, oftalmologista pediátrico do Visão Hospital de Olhos, em Brasília, diz que fazer correlações de causa e efeito são sempre um desafio. Porém, ele aponta que a pesquisa é interessante porque conseguiu identificar genes que, quando associados a um determinado estilo de vida, podem levar ao desenvolvimento de miopia.

O médico destaca que longos períodos de exposição às telas — como tablets, monitores e smartphones — e pouco tempo de exposição em ambientes abertos são fatores potencialmente prejudiciais à visão. "Se o indivíduo, tendo essa genética, tem um estilo de vida no qual nunca está ao ar livre, está sempre recluso, vive no quarto, fica horas e horas no celular ou no computador, isso é um fator de predisposição para miopias de alta grau", alerta.

O oftalmologista Renato Braz Dias, especialista em retina e vítreo do Hospital de Olhos Inob, em Brasília, explica que, para o olho humano conseguir enxergar de perto, há pequenas estruturas dentro do cristalino, com a função de regular o foco dos objetos. "Quando se olha para longe, por exemplo, em uma paisagem, sentimos um conforto visual porque essa musculatura dentro dos olhos é relaxada." Ao diminuir a distância de visão, a musculatura precisa contrair para focar os objetos próximos, e a consequência de repetir essas tarefas continuamente é o cansaço ocular. "A longo prazo, esse esforço constante em pessoas com a predisposição genética pode facilitar o aparecimento ou progressão da miopia", diz.

Segundo Tiago Ribeiro, estudos estimam que 50% da população poderá ser míope até 2050, acarretando gastos à saúde pública, especialmente se a condição estiver acompanhada por complicações associadas, como glaucoma, baixa visão e descolamento da retina. O oftalmologista acredita que pesquisas que identificam variantes genéticas podem ajudar, por exemplo, a identificar regiões onde há um maior risco da população. "Por exemplo, crianças com a predisposição teriam de ser estimuladas a fazer mais atividades ao ar livre para reduzir a incidência da miopia."

*Estagiária sob a supervisão de Carmen Souza

Análise com limitações

"O que é diferente nessa pesquisa é que os investigadores estudaram como os padrões de exercício se relacionam com a saúde futura do participante, tenha ele ou não a intenção de fazer o exercícios. Os pesquisadores descobriram que a associação entre sessões curtas de atividade vigorosa e melhores perspectivas de saúde na vida adulta é a mesma, quer o exercício tenha sido feito intencionalmente, como parte de um programa, ou apenas porque você fez a atividade como parte de sua outra atividade diária, por exemplo, correndo para pegar um ônibus. A principal limitação é que esses dados são observacionais"

Paul Leeson, professor de medicina cardiovascular da Universidade de Oxford