Anfitrião da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP27), o Egito emitiu 2,09t de gases de efeito estufa per capita em 2020, ou 0,6% do total global daquele ano. Já os Estados Unidos foram responsáveis por sete vezes isso: 14.24t per capita, ou 15%. Os efeitos do aquecimento global, porém, afetam com mais força o país africano, extremamente vulnerável a escassez de água, seca e aumento do nível do mar.
Nações que pouco contribuíram para a crise climática, como a egípcia e as localizadas ao sul do Equador, pedem compensações para se adaptar a um planeta que ferve cada vez mais. Porém, o governo norte-americano novamente impõe restrições à chamada política de perdas e danos, que entrou oficialmente na agenda da COP27 no primeiro dia da conferência. Sob críticas de governos e da sociedade civil, o enviado especial para o clima, John Kerry, diz que os Estados Unidos aceitam essa forma de indenização. Porém, só daqui a dois anos, um prazo considerado absurdo pelos países mais afetados, pois as emissões crescentes estão intensificando os extremos climáticos.
Durante 26 conferências, os Estados Unidos se recusaram a negociar o tema perdas e danos, defendido pelo G77 mais China que, em termos numéricos, é o maior bloco da COP. Em junho, na pré-conferência climática, em Bonn (Alemanha), o país aceitou reconhecer, no documento final, a necessidade de uma política que tente minimizar os impactos negativos do aquecimento global nas nações vulneráveis. Porém, deixou claro que não há necessidade de novas fontes de recursos. Em vez disso, defendeu um aporte maior ao Fundo Verde, criado pelo Acordo de Paris e a busca por mais financiadores.
"Os Estados Unidos não forneceram o valor total prometido inicialmente ao Fundo Verde, muito menos o financiamento anual adicional que os governos reconheceram que seriam necessários", critica Rachel Rose Jackson, diretora de pesquisa climática da US Climate Action Network, o braço norte-americano da rede global. Jackson, que participou ontem de uma coletiva de imprensa na COP27, denuncia o que seria uma manobra do país, na conferência do ano passado, na Escócia. Lá, foi decidida a criação do Diálogo de Glasgow, para desenvolver a agenda de perdas e danos. Para a surpresa de muitos, os Estados Unidos foram escolhidos cofacilitadores da iniciativa, ao lado de Singapura.
A postura norte-americana vem na contramão do discurso do secretário-geral da ONU, Antonio Guterres que, na segunda-feira, insistiu na necessidade de financiar países que já enfrentam tragédias climáticas, como o líder atual do G77, o Paquistão, vítima de inundações recordes em 2022. Harjeet Singh, consultor sênior e especialista em perdas e Climate Action Network, que também esteve na coletiva, afirmou que os Estados Unidos estão sempre "bloqueando cada discussão sobre financiamento de perdas e danos, torcendo o braço e ameaçando as nações em desenvolvimento".
Saiba Mais
Emergentes
Enquanto os Estados Unidos recusam a criação de um novo fundo, um relatório divulgado ontem pela presidência da COP27 aponta que, exceto a China, os países em desenvolvimento e os emergentes (como o Brasil) precisarão de mais de US$ 2 trilhões por ano para financiar o combate às mudanças climáticas, sendo que quase metade desse valor deve vir de investimentos externos.
Os economistas Vera Songwe, Nicholas Stern e Amar Bhattacharya, autores do relatório, sugerem propostas como refundar bancos multilaterais de desenvolvimento ou aumentar empréstimos com taxas de juros reduzidas, ou mesmo zero. "Os investimentos nos mercados emergentes e países em desenvolvimento — excluindo a China — devem servir para "reduzir as emissões, reforçar a resiliência, enfrentar as perdas e danos provocadas pela mudança climática e restaurar a terra e a natureza", afirma o relatório.