Gestação

Baixa ingestão de álcool na gravidez já é suficiente para alterar cérebro do bebê

Ao analisar exames de imagem fetal, cientistas identificam danos que podem resultar em atrasos na fala e em outras funções cognitivas. A maioria das mães das crianças avaliadas ingeria, durante a gravidez, menos de uma bebida alcoólica por semana

Correio Braziliense
postado em 23/11/2022 06:00
Cientistas alertam que gestantes devem ser orientadas sobre os riscos:
Cientistas alertam que gestantes devem ser orientadas sobre os riscos: "Grávidas desconhecem a influência do álcool" - (crédito: Arun Sankar/AFP - 5/7/21)

Mesmo em baixa quantidade, a ingestão de álcool durante a gestação pode alterar a estrutura cerebral de bebês e atrasar o seu desenvolvimento cognitivo. O alerta foi feito por um grupo de cientistas da Universidade de Medicina de Viena, na Áustria, que identificaram danos no cérebro de fetos por meio de exames de ressonância magnética. Diante das mudanças "significativas", o grupo é enfático na orientação às gestantes: "As mulheres grávidas devem evitar estritamente o consumo de álcool", afirma, em nota, Patric Kienast, principal autor do estudo.

Fetos expostos ao álcool estão vulneráveis a um grupo de condições chamadas transtornos do espectro alcoólico fetal, considerado uma das principais causas de atraso no neurodesenvolvimento. Crianças com essa condição podem desenvolver dificuldades de aprendizagem, problemas comportamentais ou atrasos na fala e na linguagem. "Infelizmente, muitas mulheres grávidas desconhecem a influência do álcool sobre o feto durante a gravidez", lamenta Kienast. "Portanto, é nossa responsabilidade não apenas fazer a pesquisa, mas também educar ativamente o público sobre os efeitos do álcool no feto."

Para o estudo, Kienast e colegas analisaram o resultado da ressonância magnética de 24 fetos com exposição pré-natal ao álcool. No momento da pesquisa, os fetos tinham entre 22 e 36 semanas de gestação. Autor sênior do estudo, Gregor Kasprian explica a escolha pelo exame de imagem: "É um método altamente especializado e seguro que nos permite fazer declarações precisas sobre a maturação cerebral pré-natal".

A exposição ao álcool foi determinada por meio de pesquisas anônimas com as mães das crianças. Para isso, a equipe usou os questionários específicos, como o Pregnancy Risk Assessment Monitoring System (PRAMS), um sistema de monitoramento de riscos na gravidez adotado pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças. Três mães bebiam de um a três drinques por semana. Duas mães, de quatro a seis drinques. Uma das participantes relatou ingerir 14 ou mais bebidas por semana. Seis também relataram pelo menos um evento de consumo excessivo de álcool (mais de quatro doses em uma ocasião) durante a gravidez.

As análises revelaram que, em fetos com exposição ao álcool, o escore de maturação fetal total (fTMS) foi significativamente menor do que naqueles sem contato com a substância. Além disso, o sulco temporal superior direito (STS) foi mais raso. O STS está envolvido na cognição social, integração audiovisual e percepção da linguagem.

"Dezessete das 24 mães bebiam álcool com pouca frequência, com consumo médio de álcool de menos de uma bebida alcoólica por semana. No entanto, fomos capazes de detectar mudanças significativas nesses fetos com base na ressonância magnética pré-natal", enfatiza Kienast. Não está claro para o grupo de cientistas como essas mudanças estruturais afetarão o desenvolvimento do cérebro desses bebês após o nascimento.

Cérebro fetal após exposição intrauterina ao álcool (E): menos desenvolvido que o de um bebê sem contato com a substância (D)
Cérebro fetal após exposição intrauterina ao álcool (E): menos desenvolvido que o de um bebê sem contato com a substância (D) (foto: RSNA and Patric Kienast, M.D.)

 

Segundo Kienast, para avaliar os efeitos com precisão, é preciso "esperar que as crianças que foram examinadas como fetos naquela época fiquem um pouco mais velhas para que possamos convidá-las a voltar para exames adicionais". "No entanto, podemos assumir fortemente que as mudanças que descobrimos contribuem para as dificuldades cognitivas e comportamentais que podem ocorrer durante a infância", enfatiza.

Mielina

Segundo os pesquisadores, o atraso no desenvolvimento do cérebro fetal de crianças expostas ao álcool pode estar especificamente relacionado a problemas na mielinização e na girificação nos lobos frontal e occipital. O primeiro processo é crítico para o funcionamento do cérebro e do sistema nervoso, pois a mielina protege as células nervosas, permitindo que elas transmitam informações mais rapidamente. Marcos importantes do desenvolvimento de bebês, como rolar, engatinhar e processar a linguagem, estão diretamente ligados à mielinização.

A girificação, por sua vez, se refere à formação das dobras do córtex cerebral, que aumentam a área de superfície do córtex, permitindo um aumento no desempenho cognitivo. Quando a girificação é diminuída, a funcionalidade é reduzida. "Como mostramos em nosso estudo, mesmo baixos níveis de consumo de álcool podem levar a mudanças estruturais no desenvolvimento do cérebro e atraso na maturação do cérebro", destaca Kienast. Detalhes do trabalho serão apresentados, na próxima semana, durante a reunião anual da Sociedade Radiológica da América do Norte.

 

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