O manejo do lixo plástico é um dos maiores desafios ambientais da atualidade. Além de presente em diversos produtos, esse material, quando se degrada, se transforma em partículas minúsculas que podem ser inaladas e ingeridas. Pesquisadores da Universidade da Finlândia Oriental (UEF) buscam rastrear essa ameaça invisível. Em um experimento, eles mostram como os nanoplásticos podem entrar indiretamente no organismo de seres vivos por meio da cadeia alimentar. Detalhes da pesquisa foram publicados recentemente na revista Nano Today.
Com tamanho entre um e 1 mil nanômetros — um nanômetro equivale a um bilionésimo de um metro —, os nanoplásticos podem ser transportados no ar e romper barreiras fisiológicas. Estudos indicam que os solos agrícolas podem estar recebendo altas quantidades desse despojo proveniente da atmosfera, da irrigação com águas residuais e do uso de plástico na cobertura de plantio, entre outras fontes. Descobrir até que ponto esses fragmentos podem atingir culturas comestíveis e, consequentemente, a cadeia alimentar desafia cientistas.
Para detectar e medir a quantidade de nanoplásticos em seres vivos, a equipe da UEF simulou um ciclo alimentar em três níveis trófricos (alimentares): a alface, que é comida por larvas da mosca-soldado negro, que alimentam peixes da espécie Rutilus rutilus. No plantio do vegetal, o solo foi contaminado com resíduos de plásticos do tipo poliestireno (PS) e cloreto de polivinila (PVC). Esses materiais são usados como matéria-prima em diversos produtos, desde isopor a canos para a construção civil.
Jussi Kukkonen, um dos autores do artigo e professor de ecotoxicologia da UEF, contou os critérios de seleção: "Queríamos utilizar dois tipos diferentes de polímeros que são normalmente utilizados em diferentes destinações e, desse modo, têm elevado potencial para acabar no ambiente".
Durante os testes, os pesquisadores mantiveram as plantas de alface no solo por duas semanas, até colhê-las para alimentar as larvas da mosca por cinco dias. Em seguida, os insetos crescidos foram usados para alimentar os peixes pelo mesmo período de tempo. A alface, as larvas e os peixes foram dissecados, e o material analisado em um microscópio eletrônico de varredura.
O resultado mostrou que os nanoplásticos subiram das raízes das alfaces em direção às folhas. Mesmo depois de 24 horas com o intestino vazio, notou-se a presença das partículas de PS e PVC nas cavidades bucais e no intestino das moscas alimentadas pelo vegetal. O número de resíduos de cloreto de polivinila nos insetos foi maior, quando comparado à concentração de poliestireno — os mesmos resultados percebidos nas alfaces. Ao examinar os peixes, os pesquisadores detectaram resíduos de plástico nas brânquias, no fígado e nos tecidos intestinais dos animais.
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O trabalho chamou a atenção de Alessandra Augusto, docente do Departamento de Ciências Biológicas e Ambientais da Universidade Estadual Paulista (Unesp), no câmpus Litoral Paulista. Segundo a professora, que, há três anos, pesquisa os micro e nanoplásticos no meio ambiente, já se sabia que as plantas podem absorver esse material do solo e transportá-lo para os brotos. "O estudo finflandês inova ao mostrar que os nanoplásticos podem ser transferidos para as teias alimentares", avalia.
Alessandra Augusto explica que, embora estejam crescendo as pesquisas acerca da toxicidade desses resíduos, são necessárias mais investigações para avaliar o impacto dessas partículas na saúde dos seres vivos. A opinião é compartilhada por Kukkonen. "A questão geral é obter informações mais fiáveis sobre potenciais efeitos a longo prazo dos nanoplásticos nos organismos, bem como nos seres humanos", justifica.