Tabagismo, hipertensão e colesterol alto são conhecidos desencadeadores de doenças cardiovasculares. Porém, independentemente dessas variáveis, o baixo desempenho em tarefas que exigem habilidades físicas é fator de risco para ataque cardíaco, insuficiência cardíaca e acidente vascular cerebral em idosos. Um novo estudo descobriu que pessoas com mais de 65 anos que foram mal em um teste combinando velocidade de caminhada, equilíbrio e força ao se sentar e se levantar têm probabilidade maior de sofrer destes problemas. Isso, mesmo se não fumarem, controlarem a pressão e adotarem uma alimentação saudável.
Publicado no Journal of the American Heart Association, o estudo foi realizado com mais de 5,5 mil pessoas com 75 anos, em média. O interesse dos pesquisadores era avaliar a relação da saúde cardiovascular com a função física, que não é o mesmo que aptidão. Enquanto essa última se refere ao desempenho em atividades esportivas, a primeira tem relação com a capacidade de executar ações do dia a dia, como se levantar sozinho, não ter problemas de equilíbrio e caminhar sem dificuldade.
Para tanto, os pesquisadores da Escola de Saúde Pública Johns Hopkins Bloomberg, nos Estados Unidos, utilizaram uma bateria de testes que avaliou essas três variáveis. "Descobrimos que a função física em adultos mais velhos prevê doenças cardiovasculares futuras, além dos fatores de risco tradicionais de doenças cardíacas, independentemente de um indivíduo ter histórico de doença cardiovascular", conta o autor sênior do estudo, Kunihiro Matsushita, professor associado do departamento de epidemiologia da instituição.
O teste aplicado entre os participantes mediu a função física para produzir um escore de acordo com a velocidade de caminhada, velocidade de levantar de uma cadeira sem usar as mãos e o equilíbrio em pé. Os participantes foram categorizados de acordo com o desempenho: baixo, intermediário e alto. Entre todos os voluntários, 13% se encaixaram no primeiro grupo; 30% no segundo, e 57% no último.
Todos os participantes foram acompanhados por oito anos, período durante o qual 930 foram diagnosticados com um ou mais eventos cardiovasculares — 86 sofreram ataque cardíaco, 251 tiveram um acidente vascular cerebral (AVC) e 529 desenvolveram insuficiência cardíaca. Os pesquisadores, então, examinaram a associação dos escores do teste com essas ocorrências. Para checar a participação específica da função física, eles ajustaram os principais fatores de risco das doenças que afetam o coração e o sistema vascular, como pressão alta, tabagismo, colesterol alto, diabetes e histórico familiar.
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Escores
Os resultados mostraram que, em comparação com adultos com altos escores de função física, os com pior pontuação foram 47% mais propensos a sofrer pelo menos um tipo de doença cardiovascular. Já aqueles enquadrados na categoria intermediária apresentaram um risco 25% maior. "A associação entre função física e doença cardiovascular permaneceu após o controle de fatores de risco tradicionais de doenças cardiovasculares", disse, em nota, o principal autor do estudo, o epidemiologista Xiao Hu. "Nossas descobertas destacam o valor de avaliar o nível de função física de idosos na prática clínica. Além da saúde do coração, os idosos correm maior risco de quedas e incapacidades. A avaliação da função física também pode informar o risco dessas condições em idosos."
O cardiologista Carlos Rassi, professor da Universidade de Brasília (UnB) e chefe do pronto-atendimento do Hospital Sírio-Libanês de Brasília, diz que, devido às evidências de que a prática de atividade física — essencial para a manutenção das funções cotidianas — reduz a mortalidade, muitos médicos já fazem essa avaliação. "O teste ergométrico não mede o equilíbrio e a força do tronco (sentar e levantar sem ajuda), mas mostra a velocidade ao caminhar. No caso dos idosos mais frágeis, podemos fazer um teste de caminhada de seis minutos", observa.
De acordo com Kunihiro Matsushita, da Johns Hopkins, é preciso, agora, investigar quais as intervenções mais adequadas para melhorar a função física e reduzir o risco de doenças cardiovasculares, inclusive com pessoas que apresentam limitações. Carlos Rassi lembra que estudos anteriores demonstraram que mesmo atividades físicas mais leves, como caminhar 10 minutos por dia, aumentam a longevidade, potencialmente reduzindo riscos de diversas enfermidades. "Pode-se começar com cinco minutos de caminhada diária e três meses depois aumentar para 10, por exemplo. O importante é não ficar parado", ensina.