Jornal Correio Braziliense

três perguntas para

Celso Augusto Lemos Júnior, professor da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP) e membro da diretoria da Sociedade Brasileira de Pesquisa Odontológica (SBPqO)

As manifestações orais durante a infecção pelo Sars-Cov foram bem documentadas. É possível que, após a cura, pacientes possam desenvolver sintomas orais associados ao vírus?

Sim, é possível, e a cada dia mais trabalhos de pesquisa são publicados sobre esse assunto. Manifestações orais da covid-19 foram observadas durante o período agudo da doença, relacionadas à própria infecção ou às medidas terapêuticas adotadas, como alteração de paladar, ulcerações orais inespecíficas, descamação da gengiva, petéquias na mucosa oral e infecções oportunistas, como a candidíase. Hoje em dia, a preocupação dos profissionais de saúde tem se voltado para as consequências dos sintomas pós-covid-19. Os estudos têm demonstrado uma maior prevalência de determinados sintomas, tais como xerostomia (sensação de boca seca), sialoadenites (inflamação das glândulas salivares), lesões na superfície da língua, dores crônicas e doenças periodontais, além de infecções fúngicas oportunistas. Ainda há um considerável grau de incerteza se esses sintomas estão necessariamente associados à consequência da covid ou mesmo aos tratamentos utilizados nos sobreviventes. Portanto, ainda vamos precisar de algum tempo de estudos e pesquisas que possam caracterizar com maior exatidão quais seriam as manifestações orais na pós-covid.

A infecção pode alterar, de forma crônica, a microbiota da região?

Não há dados publicados até o momento que consigam provar alteração relevante na microbiota oral. Pode-se supor que, se existirem essas alterações, elas deverão ocorrer em pacientes que tiveram manifestação grave da covid, incluindo, aí, fatores como longo tempo de internação e uso de múltiplas drogas por muito tempo.

Do ponto de vista clínico, como deve ser o acompanhamento dos pacientes que tiveram covid?

O atendimento de rotina na odontologia parece ser suficiente até o momento, segundo os dados publicados. Porém, os cuidados necessários de higiene devem ser mantidos com atenção e ajustados a cada paciente. Caso o paciente venha a se queixar de sintomas que não apresentava antes da covid, o cirurgião dentista deverá ser procurado para que se possa investigar de maneira minuciosa a possível relação. Por exemplo, em casos de xerostomia (queixa de boca seca), sensibilidade alterada das mucosas orais e gengivites que não cedam aos cuidados normais de escovação e fio dental.