Um grupo de pesquisa internacional publicou um estudo recente na revista científica Nature Communicatios que mostra que mães de gêmeos não são mais férteis do que outras mulheres.
O nascimento de gêmeos não é exatamente algo comum. Em humanos, ocorre entre 1% e 3% de todas as gestações. Estudos anteriores do fenômeno concluíram que mães de gêmeos são mais férteis do que outras mulheres. Isso ocorre porque, em média, elas dão à luz com mais frequência do que outras mães. Elas foram chamadas de "supermães" e consideradas mais robustas e com melhor saúde.
Agora, esse novo estudo vai na contramão e sinaliza que mães gêmeas não são realmente mais férteis do que outras mulheres. "Pelo contrário, quando uma mulher dá à luz várias vezes, aumentam as chances de que pelo menos um desses partos seja de gêmeos. Mães gêmeas não são supermães, mas tiveram mais chances", diz Gine Roll Skjærvø, engenheira sênior e bióloga comportamental humana do Departamento de Biologia da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia (NTNU).
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100.000 nascimentos examinados
O grupo de pesquisa analisou 100.000 nascimentos europeus da era pré-industrial, de modo que o conjunto de dados é grande.
Na era pré-industrial, “tivemos fertilidade natural com famílias de grande porte. A contracepção ou outros métodos para controlar o número de crianças não estavam disponíveis e a tecnologia de reprodução assistida não existia”, explica Skjærvø.
Gine e Eivin Røskaft, professor do mesmo departamento, foram responsáveis pelas contribuições norueguesas ao grupo de pesquisa internacional. Skjærvø contribuiu com dados de história de vida coletados de registros paroquiais em Soknedal e Smøla, no centro da Noruega. Ela também usou esses dados enquanto trabalhava em seu doutorado.
Se existem maiores riscos para a saúde, então por que gêmeos existem?
Os nascimentos de gêmeos ocorrem entre pessoas de todo o mundo, apesar de estarem associados a um risco muito maior para a saúde da mãe e da criança antes, durante e após o nascimento.
"Devido a esse custo aumentado, parece que a seleção natural e a evolução foram contra nascimentos de gêmeos", disse a equipe de pesquisa. Mas, eles se perguntavam, por que esses mesmos mecanismos não os extinguiram completamente?
Uma explicação comum é que o risco de morte associado ao parto de gêmeos é parcialmente compensado pela maior fertilidade. Quando as coisas vão bem, você tem o dobro de descendentes para transmitir seus genes.
A ideia é que as mulheres que são mais férteis do que a média liberam com mais frequência dois óvulos durante a ovulação. Nesse caso, dar à luz gêmeos é um sinal de que você está mais fértil. Muitos estudos têm apoiado esta teoria.
Análise defeituosa usada por vários anos
Mas o novo estudo encontra erros nos métodos e análises anteriores e levanta a questão do que realmente vem primeiro.
"Estudos anteriores são problemáticos porque não podem nos dizer se mães com gêmeos dão à luz com mais frequência porque são especialmente férteis ou porque dar à luz com mais frequência aumenta a chance de um desses nascimentos ser de gêmeos", explica o autor principal, Alexandre Courtiol, do Instituto Leibniz de Pesquisa em Zoológicos e Vida Selvagem na Alemanha.
Os novos resultados mostram que as mulheres que dão à luz gêmeos não são excepcionalmente férteis. A pesquisa anterior misturou causa e efeito. "Se uma mãe dá à luz com mais frequência, é mais provável que um desses partos seja de gêmeos — assim como é mais provável que você ganhe se comprar mais bilhetes de loteria ou se envolva em um acidente de carro se dirigir muito", diz Ian Rickard, autor principal da Universidade de Durham, no Reino Unido.
Ao levar em conta esse efeito de loteria, os pesquisadores descobriram que mães de gêmeos, na verdade, dão à luz com menos frequência do que outras, não com mais frequência. Esta nova descoberta contrasta fortemente com as anteriores.
Novos métodos produziram novos resultados
Os 14 pesquisadores usaram dados pré-industriais da Noruega, Suécia, Finlândia, Alemanha e Suíça.
"Todos esses dados são de registros paroquiais antigos que foram digitalizados", diz o coautor Virpi Lummaa, da Universidade de Turku, na Finlândia.
"Para evitar a armadilha estatística em que outros estudos caíram, também tivemos que usar procedimentos estatísticos avançados", acrescentou o coautor François Rousset, do Instituto de Ciências Evolutivas em Montpellier, na França. A armadilha é tão comum que tem até nome: Paradoxo de Simpson.
Informações importantes para o sistema de saúde
A relação entre nascimentos de gêmeos e fertilidade não é apenas uma questão acadêmica. Também é de interesse para os serviços de saúde.
Estudos que tentam entender como aumentar a fertilidade das mulheres compararam mães com e sem gêmeos. Mas Erik Postma, coautor da Universidade de Exeter, no Reino Unido, aponta que tais desenhos de estudo ignoram os fatores que podem explicar por que uma mulher é fértil e, portanto, nos impedem de entender mais sobre as diferenças na fisiologia entre as mulheres que dão nascimento de gêmeos e aqueles que não o fazem.
Em suma, comparar grupos de mulheres com e sem gêmeos de forma acrítica pode nos levar a acreditar no oposto do que é realmente verdade. Esses agrupamentos podem ocultar os efeitos dos genes de geminação e fertilidade onde eles existem, ou vice-versa, criando a ilusão deles mesmo se eles não existirem.
Muita coisa que ainda não sabemos
"Ainda há muito que não entendemos sobre gêmeos. Mas nosso estudo sugere que a geminação não foi eliminada pela seleção natural por duas razões", diz Courtiol.
A primeira é que os nascimentos de gêmeos podem ser uma consequência da liberação de dois óvulos durante a ovulação. Isso compensa o aumento da chance de aborto com o aumento da idade e beneficia todas as mães, exceto as mais jovens.
Em segundo lugar, se o risco de mortalidade precoce não for muito alto, ter gêmeos está associado a famílias maiores, embora as mulheres com gêmeos deem à luz com menos frequência. Isso ocorre, é claro, porque os gêmeos adicionam dois filhos em vez de um a uma família.